Depois de quatro quebras de barreiras psicológicas, a cotação do real ante o dólar ameaça derrubar a quinta (neste início de tarde, está em R$ 5,694). Desde o início do ano, acumula a quinta maior desvalorização entre 118 países, de 20,3%.
A queda só é menor do que a sofrida por quatro moedas de países africanos. Uma característica comum entre os quatro países que superam o Brasil em desvalorização é o fato de estarem envolvidos em conflitos, direta ou indiretamente.
O levantamento da Austin Rating foi atualizado, a pedido da coluna, com a cotação Ptax, registrada pelo Banco Central, até as 10h30min desta terça-feira (2). Conforme o economista-chefe da empresa, Alex Agostini, a média de desvalorização da lista completa, que tem 118 moedas, é de 5%.
O dólar estava abaixo de R$ 5 até abril, quando começou a escalar, sem sinais de que pudesse retomar o patamar abaixo desse grande divisor de expectativas.
O que começou com uma forte pressão do Exterior, especialmente do adiamento do corte de juro nos Estados Unidos, ganhou componentes nacionais a partir da mudança da meta fiscal de 2025, que era de superávit de 0,5% do PIB e foi igualada à deste ano, de déficit zero.
A partir do patamar de R$ 5,30, boa parte do combustível da alta a até quase R$ 5,70 foi fornecido por declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como a da manhã desta terça-feira (3).
O plano era amenizar as críticas à autonomia do Banco Central, mas acabou servindo um prato perfeito aos especuladores, ao acenar com uma medida - "o governo tem de fazer alguma coisa" que não poderia ser antecipada para não alertar "os meus adversários". Acendeu um estopim que acionou até rumores absurdos de controle de capitais (restrições a saída de dólares), estapafúrdios em um país com reservas cambiais de US$ 357,83 bilhões (dado mais recente, de 28 de junho).
Os fatores de pressão no mercado
Falta de perspectiva do início de cortes de juro nos EUA: a taxa alta lá e mais baixa aqui diminui a atratividade de investimentos no mercado financeiro no Brasil, e investidores resgatam aplicações aqui para migrar para mercados mais lucrativos.
Ajuste fiscal: a decisão do governo Lula de reduzir o déficit primário (despesas maiores que receitas antes do pagamento da dívida) só com aumento de arrecadação, sem corte de gastos, é considerada frágil e difícil de manter ao longo dos quatro anos de mandato. A recente ajuda ao Rio Grande do Sul, que eleva os gastos, contribui com essa percepção. Sinalizações de cortes de gastos nos últimos dias chegaram a proporcionar algum alívio, mas não duradouro.
Conflitos e eleições pelo mundo: conflitos entre Rússia e Ucrânia e entre Israel e Hammas elevam incertezas, assim como eleições. Na França, a extrema -direita "antieuropeísta" venceu o primeiro turno e acentuou a dúvida sobre a posição do país que é "sócio-fundador" da União Europeia, com risco potencial para a existência do bloco. Desde o mais recente debate entre os candidatos à presidência dos EUA, o "risco Trump" também tem aparecido no radar do mercado.