Não se sabe o que vai ocorrer nas ruas da Argentina no domingo à noite, quando for proclamado o resultado do segundo turno da eleição presidencial. Mas na economia, a "tensa calma" com que os mercados fecharam nesta sexta-feira (17) vai se estender até a terça-feira (22).
"Tensa calma" foi o oxímoro (figura de linguagem que une palavras de sentido oposto) usado pelo jornal Ámbito Financiero para se referir ao último dia pré-eleitoral de negociações na bolsa e com o dólar blue, que encerrou o dia, surpreendentemente, abaixo dos mil pesos que havia alcançado pouco antes do primeiro turno.
A surpresa fica por conta da confirmação do candidato de oposição, Javier Milei, de que pretende, de fato, dolarizar a economia argentina. Em tese, essa sinalização levaria à alta no câmbio paralelo, o que não ocorreu. Também, o banco central que tem como chefe o ministro da Economia que vem a ser o outro candidato, injetou US$ 280 milhões. E o mercado só vai voltar a operar na terça porque segunda-feira é feriado nacional na Argentina - ironicamente, o Día de la Soberanía Nacional.
Se Milei vencer e dolarizar, lá se vai a "soberanía" - talvez ele queira exterminar também os feriados. A "tensa calma" incluiu um vídeo do candidato que perdeu o debate mas se aproximou da Casa Rosada em que tenta reagir ao que chama da "propaganda de medo" do adversário, Sergio Massa. Nega que haverá mudanças nas regras de doação de órgãos - deu várias declarações dizendo que era a favor de as pessoas vendessem os seus, com "liberdade".
Para desafiar parte da "tensa calma", partidários de Milei chegaram a falar em fraude eleitoral (lembra alguma coisa?). Convocados a apresentar provas, recuaram. Conforme um dos líderes de La Libertad Avanza, Santiago Viola, não foram apresentadas provas porque não se tratava de uma denúncia, "somente queremos externar precauções". É, lembra de alguma coisa...
Quando custaria a dolarização na Argentina
Conforme estudo do O Instituto Internacional de Finanças (IIF), a dolarização exigiria entre US$ 30 bilhões e US$ 40 bilhões. A entidade, que se apresenta como "associação global da indústria financeira", ou seja, representa os bancos, avalia que o BC argentino "não tem mais reservas disponíveis" e que a alternativa, "captar dólares no mercado", "parece impraticável diante do pouco apetite de investidores estrangeiros por dívida".
Para manter a promessa de campanha reafirmada ontem, o país teria de passar por uma "dolorosa recessão" - com queda no PIB estimada em 3,5% - e uma redução de 15% nas importações, para obter US$ 20 bilhões para as reservas. Nesse caso, sobra para o Brasil: no ano passado, vieram daqui 19,6% das compras da Argentina, atrás apenas da China, com 21,5%, ou seja, em partes quase iguais. E a decisão impactaria diretamente o Rio Grande do Sul que, pela proximidade geográfica e cultural, vende muito ao país vizinho.