Faltou a vacina da responsabilização, e a doença da violência antidemocrática teve novo surto neste domingo (8). O que o Brasil vê, dois anos e dois dias depois, é uma versão nacional da invasão do Capitólio, nos Estados Unidos, em 6 de janeiro de 2021.
Vai ser difícil, agora, driblar a ligação direta do ato ao entorno do ex-presidente, como aliados tentaram fazer no quebra-quebra em Brasília em 12 de dezembro, e na tentativa de ataque terrorista descoberta na véspera do Natal. Estão lá as cores, as frases e as ideias inspiradas pelo líder.
Os ataques atingiram não só o Congresso, mas o Planalto e o Supremo Tribunal Federal (STF). Para complicar, a polícia militar do Distrito Federal enfrentou uma invasão como se fosse um protesto pacífico, diante do qual fosse necessário apenas conter os mais exaltados. Caravanas de ônibus se acumularam em Brasília nos últimos dias sem que a "inteligência" (nesse caso, só pode ser usada entre aspas) da força responsável pela segurança da Capital Federal detectasse anomalias. Mais ainda, escoltou a "manifestação" até o alvo do ataque, a Praça dos Três Poderes.
As cenas internas do Congresso mostram ataque ao patrimônio público: vidros e equipamentos quebrados deliberadamente. Agora, será necessário mobilizar recursos para desmobilizar essa ala radical, furiosa e antidemocrática. E mais ainda para recuperar os danos provocados. Dói ainda mais que pessoas em tal desatino usem as cores nacionais para destruir e se autoproclamem "patriotas".
A coluna não costuma usar citações, mas é impossível, diante das imagens assustadoras da tarde deste domingo, não lembrar do filósofo contemporâneo Karl Popper e de seu "paradoxo da tolerância". Em seu livro A Sociedade Aberta e seus Inimigos, de 1945, escreveu: "Se estendermos a tolerância ilimitada mesmo aos intolerantes, e se não estivermos preparados para defender a sociedade tolerante do assalto da intolerância, então, os tolerantes serão destruídos e a tolerância também".
Há poucos meses, começaram as condenações dos envolvidos no ataque ao Capitólio. É verdade que, nos EUA, ocorreram mortes que a coluna espera ardentemente que não se repitam nessa versão que só não é farsa por já ter provocado prejuízos. Passou da hora de rever a tolerância com os intolerantes. Aos que agiram e dos que, por silêncios e meias palavras, incentivaram.