A necessidade de garantir recursos para manter o benefício social de R$ 600, seja com o nome de Auxílio Brasil ou Bolsa Família – conforme quem vença a eleição –, será apenas um item na conta espetada das "bombas fiscais" que espera Planalto e Congresso em 2023.
Um artigo dos economistas Bráulio Borges e Manuel Pires, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV) levantou os riscos de gastos para o próximo ano que estão fora do orçamento e chegou a gigantescos R$ 435 bilhões, o equivalente a 4,3% do Produto Interno Bruto (PIB). A soma é quase sete vezes maior do que o déficit primário (sem contar despesas com dívida) previsto de R$ 63,7 bilhões.
Publicado no início de setembro, o texto técnico virou argumento no debate econômico que cerca a campanha eleitoral. Os dois economistas se propuseram fazer um mapeamento de riscos fiscais e descobriram que muitos ficaram fora do orçamento, portanto concluem que a incorporação das despesas não incluídas deverá levar a "grande revisão do cenário fiscal de 2023".
Havia um cálculo anterior, que chegava a "bombas fiscais" de R$ 308 bilhões, ou 3% do PIB, em 2023. Depois, os autores adicionaram "fatores que tendem a se materializar" no próximo ano, como queda de cerca de 0,6% da arrecadação bruta federal associada ao setor extrativo mineral, por descompressão dos preços das commodities, pressões por reajuste de servidores federais e recomposição de certas despesas discricionárias.
O estudo aponta ainda um risco para o Rio Grande do Sul. A conta, detalham Borges e Pires, inclui apenas R$ 57 bilhões dos R$ 100 bilhões que estimam em perdas decorrentes da redução do ICMS sobre combustíveis, energia, telecom e transporte coletivo e das reduções do IPI implementadas neste ano (encolhe o total dos repasses federais via Fundo de Participação dos Estados e dos Municípios (FPE e FPM). A incerteza sobre quanto será recebido fez o governo gaúcho enviar à Assembleia um orçamento para 2023 sem qualquer compensação, com déficit de R$ 3,7 bilhões.
As bombas espetadas para 2023
Medidas | Valor (em R$ bi)
Com impacto no teto de gastos
Auxílio Brasil de R$ 600 | 64
Reajuste do funcionalismo | 20
Revisão das discricionárias | 45
Total extra-teto | 129
Com renúncias fiscais
Desonerações de IPI* | 14
Reajuste da tabela do IRPF*| 10,2
PIS/Cofins etanol e gasolina | 33
PIS/Cofins diesel |19,9
Total renúncias 77,1
1. Total na despesa primária (extra-teto + renúncias) | 206,1
Com impacto financeiro
Suspensão de dívida de Estados | 25
Outras despesas financeiras | 52
2. Total financeiro | 77
Outros impactos
Normalização da arrecadação de petróleo |62
Precatórios | 57,6
Compensação aos Estados | 32
3. Total outros | 151,6
Total primário + financeiro + outros | 434,7
(*) Só a parte do governo federal
Para entender
As "outras despesas financeiras" de R$ 52 bilhões, explicam os autores, vem do aumento do pagamento de juro sobre a dívida que resulta da diferença entre as projeções de consenso para os juros nominais em meados de 2022 (menores) e a taxa atual (13,75%). Os precatórios de R$ 57,6 bilhões são decorrentes de " eventual decisão política e/ou judicial para quitar o saldo acumulado que está sendo postergado desde a mudança no teto de gastos aprovada no final de 2021". A "normalização da arrecadação de petróleo" diz respeito à expectativa de que os preços não fiquem tão altos em 2023 e reduzam receitas de imposto de renda, dividendos da Petrobras e royalties. As rubricas "suspensão da dívida dos Estados" e "compensação aos Estados" dizem respeito à compensação da União pelo corte nas alíquotas de ICMS sobre gasolina, energia, telecomunicações e transporte público. As duas somam os R$ 57 bilhões dos R$ 100 bilhões que seriam devidos, conforme os autores.