É a crônica da consequência anunciada: o Banco Central (BC) vai elevar a taxa Selic em ao menos 1,5 ponto percentual na próxima quarta-feira (2). A taxa deve alcançar 10,75% e voltar a dois dígitos pela primeira vez desde julho de 2017.
A grande dúvida sobre o peso no custo do crédito é quanto tempo o juro básico ficará em dois dígitos, especialmente depois que a primeira prévia do ano do IPCA provocou alta nas projeções da inflação para o ano, mesmo desacelerada.
Em um país com viva e dramática memória inflacionária, restos de indexação e a chamada "inércia" — quando a alta do passado alimenta a do futuro — tendem a criar resistências ao combate a alta de preços, especialmente quando boa parte da causa não é afetada pela elevação do juro, como agora. A mais recente convivência dos brasileiros com juro básico de dois dígitos durou quase quatro anos, de novembro de 2013 a julho de 2017. Será que só nos livraremos dessa marca no mesmo prazo?
Tudo indica que não, mas o horizonte se afastou. No mercado, a perspectiva é de que o Comitê de Política Monetária (Copom) encerre o chamado "ciclo de alta" em março, elevando a Selic em mais um ponto percentual e deixando o juro básico anual em 11,75%. Apesar do susto com o IPCA-15 na semana passada, essa projeção seguiu inalterada no Boletim Focus liberado nesta segunda-feira (31).
No entanto, a publicação que concentra estimativas mais frequentes de uma centena de instituições financeiras e consultorias econômicas registrou alta na expectativa de inflação para 2022 de 5,15% para 5,38%, ainda mais fora do teto da meta, de 5%.
Mas entre o Copom parar de aumentar e começar a cortar há um intervalo considerável. A máxima imediatamente anterior da Selic, de 14,25% ao ano, vigorou por 15 meses, de julho de 2015 a outubro de 2016. E só caiu do patamar de dois dígitos 10 meses depois.
E agora? No final do ano passado, havia esperança de que cortes na Selic pudessem começar ainda no final deste ano. No entanto, a persistência da inflação alta empurrou essa expectativa para a frente. Será preciso esperar pelo início de 2023 para que o BC inicie desbastes discretos na Selic, ainda mais diante da maior probabilidade de novo estouro da meta de inflação neste ano. Isso, se não ocorrer repique forte no câmbio por estresse eleitoral, cenário que não é improvável. A Ativa Investimentos estima Selic de 8% no final de 2023.
Os principais índices de inflação
IGPs: Índices Gerais de Preços, calculados pela Fundação Getulio Vargas. Têm três variações, IGP-M, IGP-DI e IGP-10, com diferença apenas no período de apuração. Cada um é composto por três componentes: Índice de Preços no Atacado (IPA), com peso de 60%, Índice de Preços ao Consumidor (IPC), com peso de 30%, e Índice Nacional do Custo da Construção (INCC), com peso de 10%.
IPCA: Índice de Preços ao Consumidor Ampliado, calculado pelo IBGE, é considerado oficial porque serve de referência para o Banco Central calibrar o juro básico. Mede variação de preços de produtos e serviços consumidos por famílias com renda entre um e 40 salários mínimos.
INPC: Índice Nacional de Preços ao Consumidor, também do IBGE, mede avariação nos preços de produtos e serviços consumidos por famílias com renda entre um e oito salários mínimos. É a referência para negociações de reajustes salariais.
IPCs: Índices de Preços ao Consumidor calculados pela FGV, tem quatro variações, entre as quais a mais conhecida é o IPC-S.