O movimento começou com declarações de Jair Bolsonaro, Paulo Guedes e Arthur Lira, em clara reação às pressões decorrentes da disparada dos preços dos combustíveis. Parecia só uma ameaça, do tipo "não perturbem, senão a gente vende a vaca leiteira".
No entanto, ainda que seja apenas para dar robustez a essa estratégia, o plano ganhou forma no Ministério da Economia, inclusive porque sempre foi um sonho de Guedes: a privatização da Petrobras, pela via da capitalização da companhia.
A venda da maior estatal do país era a cereja do bolo de uma das contas de R$ 1 trilhão que o ministro gostava de citar – havia outras duas, a da reforma da Previdência e a da venda de imóveis da União. A resistência de Bolsonaro e do Congresso fez Guedes arquivar quase todo o plano, a ponto de perder seu "secretário estrela" de Desestatização, Salim Mattar.
No entanto, está em preparação um projeto de lei que prepara uma venda de ações da Petrobras. A confirmação veio do líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE) em entrevista à agência de notícias Reuters na segunda-feira (26). Com essa informação, as ações da estatal subiram 6%. Como não houve apresentação formal, a Petrobras foi obrigada a publicar uma nota informando que não sabe de nada e pediu informações ao seu acionista controlador, no caso o governo federal.
Na mesma segunda-feira (25), Bolsonaro voltou a dizer que a privatização da Petrobras "entrou no radar", e o Guedes afirmou que, com a tendência de descarbonizar a economia, a gigante "vai valer zero daqui a 30 anos". Conforme a versão que saiu da equipe econômica, a privatização seria feita por meio de capitalização, como foi aprovado no caso da Eletrobras – com jabutis que murcharam o entusiasmo dos privatistas.
Elena Landau, que comandou as privatizações no BNDES na década de 1990, já observou no Twitter: "estão de novo fazendo o erro que fizeram em Eletrobrás. Fazer uma modelagem de venda circunstancial sem o devido cuidado de escolher a melhor forma de venda".
Na prática, a da Petrobras começaria com a migração de todas as ações da estatal para o Novo Mercado, segmento da bolsa de valores que exige normas rígidas de gestão e só aceita empresas que tenham apenas ações ordinárias.
O que dá o controle à União é exatamente a posse de 50,5% desse tipo de ações. O outro tipo são as preferencias, que são chamadas assim por ter prioridade na distribuição de dividendos. A mera conversão de ações preferenciais em ordinárias faria o governo perder o poder de decisão final na estatal, porque se for considerado o total de papéis existentes, ficaria com apenas 36,75% do total. Seria a insinuação de Lira convertida em projeto.
Com Lira e Bezerra envolvidos, o ensaio de privatização pode ser qualquer coisa, de manobra diversionista às vésperas da leitura do relatório da CPI da Propina, assunto no qual o senador deveria estar concentrado, de mudança de assunto em dia de aumentos de 7% na gasolina e inacreditáveis 9% no diesel, até manipulação de preços de mercado. Parece venda de terreno na lua, ou, em vez de tirar o bode da sala, seria mais de demolir a sala e deixar o bode ao ar livre. Até Bolsonaro sabe disso. Ao admitir que a privatização "entrou no radar", observou:
– Privatizar qualquer empresa não é como alguns pensam, que é pegar a empresa, botar na prateleira e, amanhã, quem der mais leva embora. É uma complicação enorme. Ainda mais quando se fala em combustível. Se você tirar do monopólio do Estado, que existe, e botar no monopólio de uma pessoa particular, fica a mesma coisa, ou talvez até pior.
Neste ponto, Bolsonaro está certo.
A política da Petrobras
Para reajustar o preço nas refinarias, a Petrobras adota um cálculo chamado Paridade de Preços de Importação, adotado em 2016, no governo Temer. A intenção é evitar que a estatal acumule prejuízo com por não repassar aumentos de produtos que compra do Exterior, tanto petróleo cru quanto derivados, como a gasolina. A fórmula inclui quatro elementos: variação internacional do barril do petróleo — com base no tipo brent, que tem preço definido na bolsa de Londres —, cotação do dólar em reais, custos de transporte e uma margem definida pela companhia, que funciona como um seguro contra perdas.