Com grande parte dos profissionais trabalhando de casa, o Ministério Público do Trabalho (MPT) avisou que pretende aumentar a fiscalização nas condições de trabalho de quem permanecer nesse regime.
Para orientação, publicou um nota técnica em que "insta" (do verbo instar, pedir com insistência) as empresas a seguir 17 diretrizes, provocando polêmica entre especialistas em direito trabalhista. Ponderam que o MPT não é órgão que defina regras, mas fiscaliza o cumprimento das existentes.
Conforme o procurador-geral do MPT, Alberto Balazeiro, a etiqueta digital precisa ser uma prioridade para empregadores e empregados na nova realidade das relações de trabalho.Flávio Sirangelo, consultor sênior na Souto Corrêa Advogados e ex-presidente do Tribunal Regional do Trabalho (TRT), vê "ativismo" do MPT:
– É uma atitude inconveniente. Muito antes da pandemia, na reforma trabalhista, a CLT (Consolidação Geral das Leis do Trabalho) ganhou um capítulo inteiro para teletrabalho. Muitas das coisas da nota técnica estão lá. Se não está, é porque não foi aprovado. Ninguém discorda de que é preciso cuidado para criar um modelo adequado. O texto denota uma premissa de que o teletrabalho vai gerar dano moral, é uma espécie de aviso do MPT de que vai adotar medidas contra empresas.
Na avaliação de Sirangelo, isso pode desestimular as empresa a manter os trabalhadores em casa por sugerira antipatia em relação ao home office e cria enorme insegurança jurídica, o que é indesejável nesse momento.
Peterson Vilela, especialista em direito do trabalho do L.O. Baptista Advogados, diz que as 17 diretrizes são "um roteiro institucional que deve ser seguido pelos procuradores de como se comportar" e não equivalem a uma nova legislação.
– Quando o MPT divulga a nota, as empresas acabam tendo ciência de como o MPT vai se comportar nos assuntos relacionados à norma técnica, mas como não é lei, as empresas não têm novas obrigações, porque o MPT não tem competência para promulgar lei.
Segundo Vilela, se alguma medida punitiva for tomada só com base na nota técnica, será possível discutir no Judiciário. Como a disposição une fiscalização e home office, a coluna ficou curiosa para saber se o MPT pode bater à porta da casa de quem está em teletrabalho para conferir as condições.
– Antes da pandemia, a fiscalização já era feita com base em documentos digitais. No local de trabalho, já não ocorrem com frequência, a não ser quando há situação de trabalho escravo.
O especialista adverte, porém, que todas as empresas são obrigadas, por lei, a ter um programa de prevenção de riscos ambientais que se estende para as condições que oferecem aos empregados, o que inclui o cumprimento de tarefas em casa. São as questões ligada à ergonomia que envolvem equipamento, mesa, iluminação, ventilação.
– Hoje ninguém tem um relatório de prevenção de riscos ambientais para o home office porque houve uma adequação da noite para o dia. Se o período em teletrabalho se estender, com a pandemia ou para além, será preciso providenciar essa documentação.
Algumas das medidas recomendadas pelo MPT
(Leia a nota técnica completa aqui)
Ética digital: preservar intimidade, privacidade e segurança pessoal e familiar na residência do trabalhador.
Contrato: regular teletrabalho por contrato aditivo por escrito.
Ergonomia: garantir que o trabalho seja desenvolvido em postura adequada, garantida por equipamentos e até formato de reuniões.
Pausa: garantir períodos capacitação e adaptação, além de pausas e intervalos para descanso e alimentação.
Tecnologia: oferecer apoio tecnológico, orientação técnica e capacitação em plataformas virtuais.
Prevenção: comunicar de forma expressa, clara e objetiva medidas para evitar doenças, físicas, mentais e acidentes de trabalho.
Jornada: observar o horário contratado.
Etiqueta digital: observar horários para atender demandas, assegurando repouso legal e direito à desconexão.
Liberdade de expressão: garantir esse direito, desde que não haja calúnia ou injúria.
Autocuidado: estabelecer política de identificação de sinais e sintomas de covid-19.