O jornalista Leonardo Vieceli colabora com a colunista Marta Sfredo, titular deste espaço.
O economista Roberto Dumas Damas avalia que o combate aos prejuízos causados pelo coronavírus é abalado pelas tensões políticas que envolvem o governo Jair Bolsonaro. Segundo o professor do Insper, a retomada não será rápida e exigirá foco nas reformas. Ele também critica eventuais medidas de estímulo fiscal após a pandemia, o que elevaria os gastos públicos.
Como avalia o cenário para a economia internacional?
A retomada de algumas economias pode ser no formato da letra V. Ou seja, caem e voltam em seguida. Pode ser assim com os Estados Unidos. Não parece ser o caso dos europeus. No Brasil, tem algumas questões que pioram o cenário.
Quais?
Há muita gente no Congresso querendo que o expansionismo fiscal seja perene. Isso não está correto. Tem de ser temporário. Estamos em estado de emergência. O expansionismo deve acabar assim que a pandemia terminar.
Sem investimentos públicos, qual é o caminho para atrair aportes privados?
Com a pandemia, o Brasil ficou mais perigoso. Além disso, o Banco Central baixou o juro para 3% ao ano. Ou seja, o país ficou mais arriscado e, ao mesmo tempo, paga menos juro. Então, o investidor gringo pensa e vai embora. Baixar a taxa de juro agora não adianta nada. Não mata o vírus, nem elimina o isolamento. Os bancos sobem o juro agora, porque sabem que empresas podem falir, aí querem cobrir o risco. Em outros países, a prioridade total é a pandemia. No governo federal, houve nos últimos dias rusgas com o (ex-ministro, Sergio) Moro, briga da Regina Duarte (secretária especial de Cultura). Gastar energia com isso agora? E o vírus? Aí o investidor fica meio assim.
A atração de investimentos privados passaria, então, pela redução dos atritos políticos?
Para crescer fortemente no ano que vem, é preciso aprovar todas as reformas, PEC do Pacto Federativo, PEC Emergencial, reforma administrativa, tributária. Em 2019, somente uma foi aprovada (previdenciária). Aí, fica a pergunta: com as rusgas entre Executivo e Legislativo, qual será a vontade do Congresso de aprovar todas as reformas e colocar uma azeitona na empada do Bolsonaro? Nenhuma. O cenário político piorou.
Isso significa que a reação do país deve ser lenta?
Não vejo a retomada em V. O trajeto seria parecido com o símbolo da Nike. Ou seja, cai e recupera aos poucos a partir do ano que vem. Não é hora de arrumar picuinhas. É preciso focar no combate à doença. Os Estados Unidos vêm falando que o vírus veio de um laboratório da China, mas não se sabe isso. Cogitam colocar sanções sobre os chineses, que poderiam retaliar. Seria péssimo para a economia global. Porém, poderia ser positivo para o agronegócio brasileiro. Na fase um do acordo entre americanos e chineses (em janeiro), os Estados Unidos praticamente obrigaram a China a comprar US$ 32 bilhões em produtos agrícolas. Uma retaliação dos chineses seria comprar mais do Brasil. Seria um problema para a economia global, o Brasil como um todo não se beneficiaria, mas o agronegócio, sim.