Diante da crise provocada pelo coronavírus, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) acelerou o corte na taxa básica de juro da economia brasileira. Em reunião encerrada nesta quarta-feira (6), o colegiado reduziu a Selic em 0,75 ponto percentual, para 3% ao ano, renovando a mínima histórica. Confirmado em decisão unânime, o recuo é o sétimo consecutivo.
O anúncio surpreendeu parte do mercado financeiro, que esperava baixa inferior, de 0,5 ponto percentual. Quando o comitê corta a taxa básica, tenta estimular a economia, já que a Selic serve como referência para as linhas de crédito oferecidas por bancos a empresas e consumidores. Contudo, há incertezas sobre a magnitude do impacto final para negócios e famílias.
As avaliações levam em conta o fato de que o coronavírus trouxe uma enxurrada de prejuízos para o país, como aumento da inadimplência e do desemprego. Com mais riscos no horizonte, bancos privados tendem a incrementar exigências na hora de conceder crédito, inclusive elevando taxas de empréstimos. Ou seja, os efeitos da Selic na mínima histórica podem ser sentidos com mais força em período posterior ao pior estágio da covid-19.
— O juro é reduzido com a economia paralisada e a inflação em nível baixo. Vai ter efeito? Sempre tem algum, mas não vai salvar a economia agora. Passado o pânico causado pela crise, espera-se que a roda volte a girar — sublinha Valter Bianchi Filho, sócio-fundador da Fundamenta Investimentos.
Em comunicado divulgado após a reunião desta quarta-feira, o Copom afirmou que "a conjuntura econômica prescreve estímulo monetário extraordinariamente elevado, mas reforça que há potenciais limitações para o grau de ajuste adicional". O colegiado ainda sinalizou nova baixa na próxima reunião, em junho. "O Comitê considera um último ajuste, não maior do que o atual", ponderou.
Em março, mesmo com o juro básico na mínima histórica, taxas de financiamentos voltaram a subir no país depois de dois anos em queda, conforme pesquisa da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac). A alta reflete o impacto inicial provocado pelo coronavírus na economia, sugere o estudo.
— Em uma situação de normalidade, a Selic é reduzida, e as demais taxas caem também. Mas, em um momento como este, o risco de crédito é muito elevado. Empresas podem quebrar. Assim, existe o risco de os bancos aumentarem as taxas de juro — observa Miguel José Ribeiro de Oliveira, diretor-executivo de estudos e pesquisas econômicas da Anefac.
Produção industrial desabou 9,1%
Um dos primeiros reflexos da pandemia sobre os negócios foi a queda da produção industrial no país. Em março, o indicador desabou 9,1%, retornando ao patamar de 2003, informou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O gerente-executivo de pesquisa e competitividade da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Renato da Fonseca, menciona que as fábricas de menor porte apresentam mais dificuldades de acesso a crédito. Ele elogia a postura do Banco Central durante a crise, mas entende que a queda da Selic tem de vir acompanhada por novas ações do governo federal para chegar até as empresas.
— A demanda por crédito cresceu muito mais do que a oferta. As ações adotadas até agora pelo Banco Central têm efeito, mas, para o juro baixo chegar até as empresas, o Tesouro Nacional precisa assumir os riscos de empréstimos — frisa Fonseca.
Até o final do ano, o Copom terá mais cinco reuniões – a próxima está marcada para 16 e 17 de junho. Analistas do mercado financeiro consultados pelo Banco Central esperam que a Selic feche 2020 em 2,75%.
Impacto nos investimentos pessoais
A Selic em nível baixo não traz animação para quem mantém aplicações financeiras de renda fixa, como caderneta de poupança e Certificados de Depósito Bancário (CDBs). Como a taxa básica é referência para essas opções, o juro básico menor diminui os ganhos dos investimentos.
O quadro pode estimular a procura por aplicações de renda variável, como ações na Bolsa de Valores de São Paulo (B3). Nesse caso, há possibilidade de rendimentos maiores, mas especialistas recomendam cautela, já que as operações envolvem riscos. Procurar apoio de gestores do mercado financeiro tende a ser útil para evitar prejuízos.
Desde o início da pandemia de coronavírus, a bolsa tem vivido dias de tensão. A turbulência foi agravada nas últimas semanas pela crise política no governo federal.
O especialista em investimentos Adriano Severo, da Severo Educação Financeira, destaca que uma carteira de aplicações deve conter opções variadas. Assim, a chance de prejuízos fica menor, conclui.
— Uma carteira bem diversificada diminui riscos e aumenta a possibilidade de ganhos — pontua Severo.
Dentro da renda fixa, a poupança tende a apresentar resultados mais satisfatórios do que parte dos fundos de investimento, especialmente aqueles com taxas de administração de 1% ou mais ao ano (veja simulações abaixo), indica a Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac). Isso ocorre porque a caderneta tem seu ganho garantido por lei e não sofre tributação do imposto de renda, aponta a entidade.
Como ficaria aplicação financeira de R$ 10 mil em 12 meses na renda fixa
Com a Selic de 3% ao ano
Poupança antiga
Rendimento: R$ 617 (6,17% ao ano)
Total aplicado: R$ 10.617
Na poupança nova
Rendimento: R$ 210 (2,10% ao ano)
Total aplicado: R$ 10.210
Fundo de investimento com taxa de administração de 0,5% ao ano
Rendimento: R$ 206 (2,06% ao ano)
Total aplicado: R$ 10.206
Fundo de investimento com taxa de administração de 1% ao ano
Rendimento: R$ 181 (1,81% ao ano)
Total aplicado: R$ 10.181
Fundo de investimento com taxa de administração de 1,5% ao ano
Rendimento: R$ 157 (1,57% ao ano)
Total aplicado: R$ 10.157
Fundo de investimento com taxa de administração de 2% ao ano
Rendimento: R$ 145 (1,45% ao ano)
Total aplicado: R$ 10.145
Fundo de investimento com taxa de administração de 2,5% ao ano
Rendimento: R$ 133 (1,33% ao ano)
Total aplicado: R$ 10.133
Fundo de investimento com taxa de administração de 3% ao ano
Rendimento: R$ 109 (1,09% ao ano)
Total aplicado: R$ 10.109
Fonte: Anefac