Se havia uma certeza antes da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) era de que, qualquer que fosse o corte, não chegaria à ponta. O aumento do risco de inadimplência decorrente da crise provocou alta nas taxas de mercado em março. Nesta quarta-feira (6), a decisão foi reduzir em 0,75 ponto a taxa, movimento antecipado pelo mercado de câmbio. A cotação do dólar subiu 2,03%, para o novo recorde nominal de R$ 5,704, sob pressão da expectativa de uma poda maior, hipótese que cresceu depois do tombo na produção industrial da véspera.
Mas se a taxa de referência agora em 3%, não vai baratear o crédito, para que cortar a Selic agora? O BC tem de fazer um cuidadoso equilíbrio, porque um corte muito drástico colocaria em órbita a cotação do dólar em relação ao real. Mas há um efeito que interessa a todo o Brasil neste momento. Ao baixar a Selic, o BC também reduz o custo da rolagem da dívida pública, porque a grande maioria dos títulos brasileiros está atrelada à variação da Selic.
Conforme estimativa do Tesouro Nacional, o corte de um ponto percentual do juro básico, corresponde redução de 1,6 ponto percentual na dívida pública. No final do ano passado, quando a taxa Selic estava em 4,5%, o Tesouro projetava que deixaria de pagar R$ 418 bilhões de juros da dívida pública entre 2019 e 2022. Com o corte para 3% – e mais uma tesourada no próximo mês, como o Copom contratou no comunicado –, a economia pode ser ainda maior. Ao final de 2019, dívida pública federal, que inclui os compromissos do governo dentro e fora do Brasil estava em R$ 4,248 trilhões. O acumulado havia subido 9,5%, em parte por conta da emissão de novos papéis para bancar o déficit orçamentário.
Esse efeito colateral é ainda mais benéfico quando, entre a queda projetada para o PIB e o aumento dos gastos do governo federal no combate ao impacto da covid-19, a dívida pública deve encostar em 90% do PIB. A piora na situação fiscal foi um dos motivos para a agência de classificação de risco Fitch ter revisado a perspectiva da nota do Brasil de estável para negativa na terça-feira. A outra foi a existência de "fricções periódicas reduziram a previsibilidade dos resultados econômicos e políticos e nublaram as perspectivas de reforma após a pandemia".
Mas se um corte tão profundo é tão benéfico, no momento em que alta da inflação é improvável, por que não radicalizar? Porque há outro efeito colateral, esse nada benéfico, a essa altura: a alta do dólar. Quando mais o juro cai, mais investidores no mercado financeiro deixam o Brasil. Como sinalizou o mercado financeiro nesta quarta-feira.