Sou ciclista e, como muitos porto-alegrenses, usuária das ciclovias da Capital, então vou logo avisando: escrevo com conhecimento de causa. Antes que algum motorista aí do outro lado “torça o nariz”, informo que também tenho carro e carteira de habilitação, portanto, dirijo na cidade. Estou dos “dois lados”, que, no fundo, deveriam ser um só (sem esquecer dos pedestres!).
Porto Alegre tem uma das mais belas pistas destinadas às “magrelas” do país, na Orla. E também conta com um novo trecho em construção, na Zona Sul, o que é ótimo. Mas ainda há muito por melhorar, a começar pela ciclovia da Avenida Ipiranga, uma das mais importantes da cidade, com 10 quilômetros de extensão, que há meses está danificada por desmoronamentos do talude junto ao Arroio Dilúvio.
Apesar dos esforços do poder público para reabrir o trecho interditado, não posso acreditar que a solução (ainda que provisória) para o problema seja mesmo desviar o trajeto das bikes para a faixa dos veículos.
É um “puxadinho” na avenida, um remendo potencialmente perigoso para quem está pedalando e ruim para os demais condutores, porque tende a complicar o trânsito (já infernal).
Nesta semana, em razão da chuva, a liberação do trecho foi postergada pela impossibilidade de concluir a sinalização do enjambre. Sim, perdoem-me os técnicos, mas é uma saída enjambrada. Depois, a prefeitura voltou atrás e desistiu da ideia, alvo de críticas tanto de ciclistas quanto de motoristas.
Eu sei (todos nós sabemos) que não há recursos suficientes para tudo e que, diante das demandas, em especial depois da maior catástrofe climática da história do Rio Grande do Sul, ciclovias não são prioridade.
Sabemos, também, que, muitas vezes, se faz o que é possível. Reconheço a boa intenção por trás da medida abortada, já que, de outra forma, a liberação demoraria ainda mais, com a necessidade de aguardar um edital de licitação do Demae, sem prazo definido. A justificativa da prefeitura era justamente esta: dar uma resposta momentânea para algo que já se arrasta desde 2023 por questões estruturais complexas, de difícil resolução.
Não pretendo aqui fazer “terra arrasada”. Meu ponto é que não podemos continuar aceitando como “normal” que não se discuta o tema de forma mais ampla e melhor planejada, mirando no médio e longo prazos.
Precisamos de soluções duradouras e capazes de fazer de Porto Alegre, de fato, uma cidade mais “amiga” das bicicletas. Mesmo para quem não pedala, a discussão é importante, porque beneficia a mobilidade urbana como um todo. É um ganho coletivo. Ninguém perde por viver em um lugar onde há mais bicicletas em circulação.
Pense no desafogo que isso representa para o tráfego e na melhoria da qualidade do ar que respiramos, sem falar na redução dos ruídos e dos gases do efeito estufa.
Até hoje, a execução do Plano Diretor Cicloviário (lei municipal de 2009) não passa de 20%. São 15 anos e quatro gestões municipais desde que a norma foi sancionada pelo então prefeito José Fogaça. É pouco para tanto tempo, ainda mais quando se discute o avanço das mudanças climáticas e o futuro do planeta.
A maior parte das obras novas têm sido executada a partir de contrapartidas de construtoras, para compensar o impacto de empreendimentos, mas nem sempre esses trajetos são interligados. Temos trechos que ligam nada a lugar nenhum.
Vai aqui, então, o meu apelo: que o tema, apesar de tudo, seja alvo de propostas e de debates construtivos na campanha eleitoral deste ano. Que seja, ao menos, lembrado.