Falta de manutenção, impacto de dragagens e as chuvas excessivas são apontados como possíveis motivos para o colapso parcial da via de 9,4 quilômetros de extensão que, desde o início, sofreu com falhas de planejamento e atrasos de execução. Autoridades, usuários e especialistas em engenharia agora debatem qual o melhor caminho a seguir: recuperar a ciclovia ou desativá-la de vez e começar um novo projeto.
Fernando Fan, professor do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) da UFRGS:
— Os degraus ao longo do Dilúvio servem para dissipar a energia do escoamento. Assim, o leito do arroio não é escavado pela água, não se aprofunda. As margens sofrem menos alterações na sua base e ficam mais estáveis com o tempo. Um projeto que modificou esse equilíbrio dos sedimentos no leito do Dilúvio foi a recente dragagem — avalia Fan.
O especialista do IPH sustenta que seria importante conferir os projetos de retirada de material do fundo do arroio e as "verificações das estabilidades dos taludes que foram calculadas para proceder a dragagem". Outra medida adequada seria comparar as batimetrias (mapeamento do leito) anterior e posterior para confirmar se o trabalho foi calculado e executado de maneira adequada.
Bernardo Tutikian, especialista em Patologia das Construções e professor da Unisinos
— É difícil ser 100% afirmativo no momento, mas, muito provavelmente, ocorreu uma dragagem em excesso que fez com que se perdesse um pouco da base, do esforço horizontal que segura o talude. Isso, aliado às chuvas fora do comum, justificaria esses pequenos rompimentos de talude.
Para Tutikian, a melhor solução seria recompor os taludes e recuperar o pavimento da ciclovia.
— Tecnicamente falando, são pequenos rompimentos que afetam pouco a ciclovia. Tem de recompor os taludes, ter uma obra de contenção contra esses pequenos deslizamentos e recompor a ciclovia. Não tem muita complexidade técnica — acredita Tutikian, lembrando que apenas a divulgação das análises técnicas poderá confirmar ou não qualquer avaliação preliminar.
Luís Fernando Schuler, sócio da Brasmac Engenharia, responsável pelo trabalho de dragagem
Assegura que a retirada de material não afetou a sustentação dos taludes e diz que infiltrações de água da chuva a partir do topo seriam a explicação mais razoável.
— Não vejo que rachaduras ou qualquer outro problema envolvendo a pista de rolagem da ciclovia sejam importantes. Poderíamos até fazer ciclovias permeáveis, como se faz em alguns lugares, para a água realmente penetrar no solo.
No momento, por solicitação da prefeitura, a Brasmac trabalha na recomposição de dois pontos de desmoronamento próximos da PUCRS.
— Realizamos a recomposição dos taludes, e agora estamos refazendo o ressalto (espécie de degrau que reduz a velocidade da água) — afirma Schuler.
A prefeitura não confirmou como ou quando será feita a recuperação dos demais pontos. Procurada, a diretoria da construtora Procon, que implantou os mais recentes trechos da ciclovia, não deu retorno até o fechamento da reportagem.
A acidentada trajetória da ciclovia
- A estrutura começou a ser construída em 2011. Seu primeiro trecho, de pouco mais de 400 metros, foi inaugurado no ano seguinte.
- A expectativa era de concluir os 9,4 quilômetros de pista, entre a Beira-Rio e a Avenida Antônio de Carvalho, até o final de 2012. O prazo não se confirmou.
- A promessa de conclusão é adiada para o final de 2014. A obra avança até 2,8 quilômetros, mas, com a retomada condicionada à liberação de empreendimentos comerciais, emperra no mês de fevereiro.
- Após mais de um ano parada, a obra recomeça no primeiro semestre de 2015 com nova promessa de término até o final do ano - prazo também descumprido.
- Quase três anos após a entrega do último trecho, um novo pedaço de 400 metros entre as vias Silva Só e João Guimarães é iniciado.
- Em 2019, é iniciada a implantação do último trecho de 1,7 quilômetro da ciclovia. A extensão total é finalizada em 2020.
- No começo de setembro deste ano, após desmoronamentos em seis pontos, a pista exclusiva é totalmente interditada pela prefeitura.
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