Comovida com a tragédia climática no Rio Grande do Sul, a psicóloga Sabrina Führ, de Dois Irmãos, no Vale do Sinos, encontrou um jeito diferente de socorrer famílias que precisam de apoio. Acostumada a lidar com crianças, ela criou um livro infantil para ajudar os pequenos a entenderem catástrofe que se abateu sobre o Estado.
Com distribuição gratuita, o livro "E a chuva..." viralizou na internet e na vida real. Gráficas de diferentes cantos do Brasil estão imprimindo cópias e enviando, de graça, aos abrigos no Rio Grande do Sul. E o que Sabrina ganhou com isso? Um sentimento de dever cumprido e a certeza de que a solidariedade supera qualquer obstáculo. Ela é um exemplo disso.
Pelo WhatsApp, a psicóloga me contou que a ideia surgiu na segunda-feira passada, dia 6 de maio. Ela estava em casa, sentindo-se impotente e angustiada com o sofrimento das pessoas que perderam tudo.
— Faço parte de um grupo de psicólogas que têm se revezado para atender as pessoas nos abrigos e fiquei pensando como poderia ajudar as colegas e as crianças afetadas, que acabaram de passar por uma situação traumática. Nem sempre elas conseguem compreender o que está acontecendo. Me coloquei no lugar dos pais e das mães, que precisam explicar tudo isso — disse Sabrina, que tem dois filhos e faz trabalho voluntário em uma escola local.
Na maioria das vezes, a garotada acaba ouvindo as conversas dos adultos. Ainda que as falas não sejam direcionadas a eles, meninos e meninas são atentos, escutam tudo e nem sempre conseguem processar a informação.
— As pesquisas sobre trauma indicam que, quando uma criança consegue dar um sentido à situação que está vivendo e não se sente sozinha, o prognóstico é melhor. As chances de desenvolver algum tipo de transtorno pós-traumático diminuem — explica Sabrina.
Pensando nisso, ela se sentou diante do computador e, durante uma tarde, concluiu o trabalho: escreveu o texto, criou desenhos e montou as páginas do livrinho em PDF.
A obra começa falando dos primeiros pingos de chuva e de como, normalmente, eles são bons. Em seguida, ela explica que, dessa vez, a água não parou e "encheu os rios todinhos". O texto retrata, então, as consequências disso, de uma forma bastante singela:
"Algumas casas mergulharam. Algumas pessoas precisaram ser buscadas de barco. Algumas famílias foram participar de uma grande festa do pijama em locais grandes cheios de colchões no chão, lanchinhos e muita gente pra lá e pra cá. Alguns animaizinhos também chegaram por lá."
Na sequência, chega o momento de tratar das emoções que "vieram nos visitar": "muita gente sentiu medo", destaca um trecho, perguntando para a criança como ela se sentiu. Há figurinhas de rostos com diferentes expressões para colorir, uma forma de fazer com que os pequenos consigam externar os sentimentos.
Depois, vem a parte dos resgates, das doações, do cuidado e da esperança. "Saiba que vamos juntos esperar a chuva passar", conclui o livrinho, para então garantir: "Ela sempre passa!"
Ao final, há uma nota da psicóloga a familiares e cuidadores, orientando sobre como agir nesse momento difícil e como ler o livro para a garotada. É importante que a história seja contada com cuidado e atenção, se preciso for, com o apoio profissional.
Em questão de horas, o arquivo em PDF se difundiu pelas redes sociais.
— Terminei o livro às 16h daquela segunda-feira e enviei a grupos de psicólogos da região como sugestão de auxílio. A pedido de algumas colegas, disponibilizei também no Instagram. Nunca imaginei que pudesse chegar a tantas pessoas. Consegui apoio de muitas gráficas, não só do Rio Grande do Sul, mas do Brasil inteiro, com milhares de cópias. Já não sei quantas são, mas estão chegando — diz Sabrina, que sempre teve o hábito de criar materiais para o usar no consultório, mas nunca tinha escrito um livro.
A psicóloga que comoveu os brasileiros também ficou comovida.
— Pessoas estão ligando e mandando mensagens de todos os lugares, perguntando: "O que tu precisas?" A gente vê tanta coisa ruim, mas cheguei à conclusão de que ainda tem muita gente boa no mundo — diz Sabrina.
Tem sim, para a nossa sorte.
Para quem quiser baixar o PDF do livro e usar gratuitamente ou mesmo imprimir, basta clicar neste link aqui. Para fazer contato com a Sabrina, é só mandar mensagem pelo Instagram (@sabrina.fuhr).