Ela deixou no passado um tempo marcado por longas, conturbadas e duvidosas contagens de votos em papel. Antes da era das fake news, figurava no hall de conquistas da nação. Neste domingo, com 26 anos de história e nenhuma fraude comprovada, a urna eletrônica chega a mais uma eleição, em meio a novos ataques.
Desde os tempos do Brasil Império, a adulteração de resultados foi uma constante nas disputas por cargos eletivos no país. O problema só começou a ser combatido de forma estruturada a partir de 1932, com a criação da Justiça Eleitoral. Desde então, o processo evoluiu, e a informatização foi fundamental para reduzir a intervenção humana - principal causa de erros, involuntários ou não.
Os questionamentos em torno do equipamento digital, usado pela primeira vez em 1996 e genuinamente brasileiro (criado por um gaúcho, inclusive), não são novos, sabemos disso. Mas lançar suspeitas ao vento sem evidências sólidas é, no mínimo, desconsiderar o fato de que todo o processo, do início ao fim, é fiscalizado de perto por um batalhão de gente: mesários, representantes de partidos, organismos nacionais e internacionais, especialistas. Isso sem contar as mais de 30 barreiras de segurança do sistema, os testes públicos, as auditorias.
Antes de compartilhar qualquer conteúdo nas redes neste fim de semana, pare e pense: o que há por trás de mensagens que tentam desqualificar o processo sem provas? A quem interessa tumultuar a votação? Se presenciar qualquer suspeita de violação no próximo domingo, leve às autoridades. Faça a sua parte. Mas dê um voto de confiança às urnas.
Para reforçar
- A urna não está conectada à internet, é protegida por mais de 30 barreiras de segurança e é aberta a testes públicos, inclusive com hackers, para aprimoramento
- Ao final da votação, boletins são impressos com os votos de cada seção, para auditoria e conferência física
- Hoje, ao menos 46 países, segundo o Instituto para Democracia e Assistência Eleitoral Internacional (Idea), usam a votação eletrônica em algum tipo de eleição
Para não esquecer
Até 1996, a apuração de votos no Brasil consumia horas, dias e até semanas. Quem viveu isso, lembra. Fraudes e erros eram comuns. As principais irregularidades incluíam o preenchimento de cédulas com votos em branco em favor de um candidato e votos nulos interpretados ao gosto de quem fazia a leitura. A subtração e inclusão de cédulas era corriqueira.
Tinha também o "voto formiguinha": o eleitor recebia a cédula do mesário, entrava na cabine e colocava um papel qualquer na urna. Depois, a cédula oficial, em branco, era entregue ao organizador da fraude, que preenchia e a repassava a outro eleitor. Este depositava a cédula fraudada na urna, pegava outra em branco e levava ao líder do esquema, e assim por diante.
O que mudou
O sistema de voto eletrônico, que permanece em constante aprimoramento, deu agilidade à contagem e à divulgação dos resultados, acabando com os longos e cansativos dias de apuração. Hoje, a contagem termina no dia do pleito.
A urna eletrônica surgiu para reduzir ao máximo a possibilidade de intervenção humana no processo – e, consequentemente, o risco de maracutaias e equívocos. Ela foi desenvolvida justamente porque havia grande descrédito em relação ao sistema anterior, baseado em cédulas de papel.
Tire suas dúvidas
Se hackers conseguem invadir até o sistema da Nasa, por que não conseguiriam entrar na urna eletrônica?
A urna não está conectada à internet nem em nenhum dispositivo de comunicação. A única forma de um hacker invadir o equipamento, segundo o TSE, seria rompendo os lacres físicos e quebrando as mais de 30 barreiras de segurança do sistema, mas, ainda assim, seria impossível violar um aparelho sem deixar rastros.
A tecnologia da urna é da Justiça Eleitoral ou da empresa que fabrica o equipamento?
O projeto é 100% nacional e pertence ao TSE. A fabricação das urnas, cujo contrato é da empresa que vence o processo licitatório, é acompanhada por técnicos do tribunal.
É verdade que Brasil, Cuba e Venezuela são os únicos países a usar urnas eletrônicas?
Não. Esse é um boato que circula no WhatsApp. Para começar, Cuba não utiliza urnas eletrônicas. Lá, a votação ainda é feita em papel. Além disso, de acordo com o Instituto para Democracia e Assistência Eleitoral Internacional (Idea) - organização intergovernamental que apoia democracias sustentáveis em todo o mundo e que conta com 34 países-membros, como Suíça, Portugal, Noruega, Austrália e Canadá, além do Brasil -, o voto eletrônico é adotado por pelo menos 46 nações. Sete agências de checagem confirmaram que essa informação é confiável.
Se o voto eletrônico é tão confiável, por que os EUA não adotam no país inteiro?
Cada um dos 50 Estados do país tem autonomia sobre a forma de votação. Parte adota o voto eletrônico, sendo que sete usam urnas semelhantes às brasileiras (sem impressão de voto). Estados que não adotam o sistema consideram os custos envolvidos altos e confiam no sistema tradicional. O equipamento utilizado no Brasil não é visto em uso em outros países por se tratar de um projeto nacional, de propriedade do TSE, que não pode ser comercializado.
Quais são os principais mecanismos de segurança?
São três principais mecanismos: assinatura digital e resumo digital, que são técnicas criptográficas, e segurança em camadas. A assinatura digital é usada para garantir que o conteúdo (ou arquivo digital) tenha a integridade verificada. Se for violada, a assinatura fica inválida. Já o resumo digital, uma espécie de síntese de cada arquivo de dados e programas, é publicado automaticamente no portal do TSE. Se alguém tentar violar a urna, o resumo é alterado. A segurança em camadas é o encadeamento de barreiras à ação de hackers. Qualquer ataque ao sistema causa um efeito dominó e a urna trava.