Gaúcho nascido em Canoas, na Região Metropolitana, Giuseppe Dutra Janino carrega no currículo um feito do qual nutre grande orgulho: é um dos criadores da urna eletrônica no Brasil, cuja estreia ocorreu nas eleições de 1996.
Durante 25 anos, Janino foi servidor do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em Brasília, onde, por 15 anos, liderou o departamento de Tecnologia da Informação. Deixou a Corte em 2021, após se aposentar.
No mesmo ano, lançou o livro O Quinto Ninja, no qual relata a experiência vivida na Justiça Eleitoral e o processo de criação e implementação do sistema eletrônico no país. Em um dos capítulos, o especialista - que hoje é consultor em eleições digitais - discorre sobre os mitos e as verdades a respeito da urna, esclarecendo o turbilhão de fake news que insiste em voltar à tona.
Por telefone, conversei com Janino na manhã desta quarta-feira (20) sobre a nova controvérsia em torno do voto digital. A seguir, leia os principais trechos da entrevista.
Como o senhor vê toda essa polêmica em torno da urna, às vésperas das eleições?
Vejo como uma tentativa de desqualificar um feito do Brasil, que foi a transformação do processo convencional para o digital de votação, que já tem 26 anos de aplicação. É muito triste, porque desvaloriza inclusive uma conquista do Brasil e o fato de sermos referência no mundo.
Como um dos criadores da urna, o que tem a dizer sobre a segurança do sistema? É, de fato, seguro?
Sim. Não é nem uma questão de fé, é uma questão de constatação. Basta verificar a história. Temos uma trajetória de 26 anos de utilização da urna eletrônica e não há sequer um caso de fraude evidenciado. Todas as suspeições devidamente formalizadas são investigadas por instituições independentes e competentes, como Ministério Público e Polícia Federal. E o fato, a realidade, a história demonstram que o processo eleitoral é seguro desde o momento em que foi transformado para o paradigma digital.
Deixando de lado o mar de fake news e todas as teorias conspiratórias, é possível aprimorar a urna?
Sim. Isso é um trabalho constante. É um processo de evolução contínuo, e existem vários mecanismos para que isso aconteça, como os testes públicos de segurança, que eu tive a oportunidade de introduzir no processo eleitoral. Eles permitem que qualquer brasileiro se inscreva para testar os dispositivos de segurança. Já foram realizadas seis edições. Ali, o hacker recebe acesso aos códigos-fonte e aos algoritmos e várias barreiras de segurança - são mais de 30 - são desativadas para que ele possa entrar no sistema. À medida que ele consegue, isso é registrado pela equipe técnica, e a urna volta para o laboratório, onde se faz as devidas correções. Chama-se novamente o hacker para outro teste. Estando tudo ok, aí sim o software vai para a eleição. Nesse momento, do qual a população, os especialistas, as autoridades e os acadêmicos participam, as fragilidades identificadas são sempre corrigidas e aí se consegue uma evolução do processo. Essa é apenas uma forma de evolução, entre vários outros tipos de ação.
O que pensa sobre a possibilidade de impressão de comprovante do voto, muito defendida por alguns setores?
Isso já foi vencido. Já houve decisão do STF sobre a inconstitucionalidade da impressão do voto. Houve ainda uma tentativa de alteração por meio de uma PEC, que também não foi aceita pelo Congresso Nacional. E existe um aspecto técnico muito importante aí. A mudança do paradigma convencional para o digital veio justamente para eliminar a mão do homem do processo. Retomar o papel seria regredir 30 anos e voltar para as mesas apuradoras, onde havia a mão do homem manipulando a informação, com possibilidade de erros e principalmente de fraudes, muitas delas muito bem conhecidas. Esse mecanismo traz prejuízos. Isso não se concilia com o cenário que temos hoje. Há, sim, vários mecanismos para auditar no meio digital. Não há motivos para retroagir a um método que aposentamos há 30 anos.
Para quem tem dúvidas honestas sobre a confiabilidade do equipamento, qual é o seu recado?
Costumo dizer que a saída para se tornar imune à contaminação dessa onda de desinformação é se atualizar. Na medida em que busca a informação correta, você se protege contra qualquer interferência dessas notícias falsas e tendenciosas. Existem vários mecanismos para se aprofundar e entender como o processo funciona e como evoluiu. Eu mesmo lancei um livro, chamado O Quinto Ninja, contando a trajetória desses 25 anos da minha participação no processo, que se confundem com a história da urna eletrônica. É uma alternativa para as pessoas que realmente pretendem ter uma fonte confiável para entender melhor o processo, além de outros meios, como o site do TSE.