O encaminhamento de um paciente para um colega de outra especialidade é uma prática frequente na medicina moderna, cada vez mais multidisciplinar, muito especialmente em se tratando do paciente oncológico, mas também em outras áreas em que o concurso de um profissional especializado se torne indispensável.
O reconhecimento dos limites de atuação de cada especialista representa uma exigência ética inegociável em favor do paciente. Definido o colega mais qualificado para esta prestação de socorro assistencial, um relatório completo com todas as informações pertinentes deve ser entregue ao paciente para o agendamento da primeira consulta com o profissional indicado.
Neste relatório, confidencialidade e transparência são considerados preceitos éticos inquestionáveis. A necessidade da participação de outro colega, vista como rotina pelo encaminhador (é sempre oportuno lembrar que a rotina entorpece a sensibilidade de um em relação ao sentimento do outro), exigirá um mínimo de empatia para perceber o inevitável aumento da ansiedade do paciente. Porque se houve a necessidade da participação de outro profissional para resolver o mesmo problema, não deve ter sido por ter se tornado mais simples.
Um vínculo afetivo, não importa o quanto pareça frágil, faz toda a diferença na relação médico e paciente.
Um aspecto importante, e raramente discutido, é a experiência vivenciada pelo paciente que, objetivamente, está deixando um médico de que aprendera a gostar para encontrar um estranho de quem não sabe se gostará. Geralmente se ignora que este hiato pode significar vários dias e noites de orfandade afetiva, que seria atenuada com um cuidado muito simples: um telefonema, uma breve comunicação virtual, na frente do paciente, antecipando a consulta futura estabelecerá um vínculo afetivo, tênue, é verdade, mas que fará com que o próximo médico deixe de ser encarado como um completo desconhecido.
Lembro de uma jovem que operei de um tumor de mediastino e tinha necessidade de quimioterapia pós-operatória. Quando anunciei essa indicação, ela desatou num choro convulsivo, se negando a aceitar a recomendação. Liguei então ao oncologista dizendo que "estava encaminhando uma jovem chorona, que tinha um olho verde impressionante, e que ficava ainda mais lindo quando chorava, e que esperava que ele cuidasse dela com o mesmo carinho que dedicava a todos os pacientes", e ela parou de chorar imediatamente e, ao sair, depois de um abraço demorado, me agradeceu dizendo: "Que bom que Deus te deu esses braços tão compridos!".
Foi quando mais me convenci do significado de um vínculo afetivo, que em condições de máxima vulnerabilidade emocional, não importa o quanto pareça frágil, fará toda a diferença.
Após o encaminhamento, o médico deve acompanhar a sequência do tratamento, mantendo-se informado sobre a evolução e estando disponível para esclarecer dúvidas ou fornecer orientações adicionais, se necessário.
Com esses cuidados, a figura do médico ficará arquivada na memória emocional daquela família com um apêndice de gratidão. Doce e definitiva.