O escritor Abdulrazak Gurnah, da Tanzânia, radicado no Reino Unido, ganhou na semana passada o Nobel de Literatura. Completo desconhecido do público brasileiro, Gurnah é o sexto africano a obter o prêmio, depois do argelino Albert Camus (1957), do nigeriano Wole Soyinka (1986), do egípcio Naguib Mahfouz (1988) e dos sul-africanos Nadine Gordimer (1991) e J. M. Coetzee (2003).
Surpreendendo as casas de apostas, onde figuravam nomes como os da escritora francesa Annie Ernaux, do queniano Ngugi wa Thiong'o ou do japonês Haruki Murakami, Gurnah venceu a premiação com uma obra que analisa os efeitos da colonização, o processo das grandes migrações e a experiência do exílio num contexto pós-colonial. A escolha de Gurnah atende também a uma reconfiguração política da academia sueca, que vinha sofrendo com as acusações de estupro e corrupção e com críticas contundentes ao premiar o escritor Peter Handke, acusado de racismo e de apoiar o genocídio na Bósnia.
Com a promessa de conceder o prêmio a menos homens brancos europeus, o Nobel de Literatura ainda passa longe dos autores brasileiros. Na história das indicações ao prêmio, tivemos nomes quase desconhecidos, como os de Coelho Neto e Alceu Amoroso Lima, até nomes mais famigerados, como Jorge Amado e Carlos Drummond de Andrade.
Os critérios de escolha dessa premiação ainda atendem a uma visão eurocêntrica e que enxerga a Europa como a medida do mundo. Além disso, a barreira imposta pela língua inglesa diminui as possibilidades de um brasileiro ser laureado.
Claro que não se pode ignorar a importância de uma premiação como essa. Aliás, temos uma lista enorme de autores e autoras que mereciam o Nobel: Raduan Nassar, Chico Buarque, Conceição Evaristo, Milton Hatoum, Lygia Fagundes e Luiz Ruffato, só para citar alguns. Mas talvez o Nobel nunca venha, talvez seja preciso criar uma outra premiação, um "Nobel" mais latino-americano, mais africano e menos eurocêntrico.
De qualquer modo, celebremos a escolha de Abdulrazak Gurnah.