Peter Handke recebe o prêmio Nobel de Literatura nesta terça-feira (11) em Estocolmo, onde estavam previstas manifestações para denunciar as posições pró-Sérvia do escritor austríaco durante as guerras da ex-Iugoslávia nos anos 1990.
— O Prêmio Nobel de Literatura? Era preciso suprimi-lo de vez. É uma falsa canonização que não contribui em nada para o leitor — comentou o escritor de 77 anos de idade, que, no mundo editorial, não era visto como um autor que um dia receberia essa distinção.
Ao anunciar o prêmio ao romancista austríaco de origem eslovena em outubro, a Academia Sueca provocou indignação nos Bálcãs e em vários países pelo apoio de Handke ao falecido homem forte de Belgrado, Slobodan Milosevic.
A polêmica quase ofuscou o anúncio da vencedora de 2018, a polonesa Olga Tokarczuk, psicóloga de formação e ativista de esquerda, ecologista e vegetariana, que se tornou a quinta mulher a receber o prêmio desde sua criação, em 1901.
A controvérsia acabou ocultando o trabalho de Peter Handke na mídia por algum tempo. O Nobel parece não ter mudado o escritor: desde o anúncio da recompensa, ele ficou chateado, até zangado, com jornalistas que reivindicaram dele, em vão, explicações ou sinais de arrependimento.
Aos 77 anos, Peter Handke receberá o prêmio das mãos do rei Carl XVI Gustaf durante uma cerimônia formal com os vencedores das outras categorias, exceto o Nobel da Paz, que é entregue em Oslo. As celebrações terminam com um banquete para 1.200 pessoas.
A Academia Sueca decidiu premiar Handke por sua obra que, com "engenho linguístico, explorou a periferia e a singularidade da experiência humana", elogiado como "um dos escritores mais influentes da Europa desde a Segunda Guerra Mundial". "Handke não é um escritor político", insistiu o presidente do comitê Nobel de Literatura, Anders Olsson.
A instituição que sempre defendeu que trabalha para que a política não influencie sua atividade, atuou para tentar reconstituir sua credibilidade nos últimos dois anos, após o escândalo de agressões sexuais contra o escritor francês Jean-Claude Aranult, provocando o cancelamento da cerimônia. O caso provocou o adiamento do anúncio do prêmio de 2018, que finalmente foi atribuído a Olga Tokarczuk.
Mas a escolha de Peter Handke não parece ter acalmado a situação, muito pelo contrário. Uma integrante do comitê Nobel de Literatura anunciou sua renúncia no início do mês de dezembro por causa da vitória do austríaco. E na sexta-feira (6), horas antes de Peter Handke conceder uma entrevista coletiva, o eminente acadêmico Peter Englund anunciou que não compareceria à cerimônia de entrega do prêmio.
— Não participarei na semana do Nobel este ano. Celebrar o prêmio Nobel de Peter Handke seria pura hipocrisia da minha parte — anunciou Englund, historiador e escritor, no jornal Dagens Nyheter.
Secretário perpétuo da Academia Sueca entre 2009 e 2015, Englund cobriu os conflitos dos anos 1990 nos Bálcãs para jornais suecos. Os embaixadores do Kosovo, Albânia, Turquia e Croácia também anunciaram um boicote à cerimônia.
Em 1996, um ano após o fim dos conflitos na Bósnia e na Croácia, Peter Handke publicou um panfleto, Justiça para a Sérvia, que gerou muita polêmica. Em 2006, ele compareceu ao funeral de Milosevic, que faleceu antes de ouvir a sentença por crimes de guerra no Tribunal Penal Internacional.
Peter Handke
O escritor Peter Handke nasceu em Griffen, no Sul da Áustria. Seu romance de estreia foi Die Hornissen, (As Vespas, em tradução livre), publicado em 1966. A obra e a peça Ofendendo o Público, de 1969, são citadas pela academia como responsáveis por deixar a marca do escritor no cenário literário.
"Mais de cinquenta anos depois do lançamento de seu primeiro livro, tendo produzido um grande número de obras em diferentes gêneros, o laureado de 2019, Peter Handke, estabeleceu-se como um dos escritores mais influentes da Europa após a Segunda Guerra Mundial", ressaltou o comitê do Nobel.
Ele também é autor de teatro, romances, poesia e roteirista de cinema.