Toda semana, um jornalista do Grupo RBS irá compartilhar na seção O que Estou Lendo a sua paixão por livros por meio de dicas do que estão lendo no momento.
Há quase um século, na primavera de 1928, o jovem desempregado Eric Arthur Blair instalou-se num hotel simples no Quartier Latin, em Paris, com a determinação de se tornar escritor. Teve êxito e produziu dois romances e um punhado de contos. Porém, tudo foi rejeitado pelas editoras, inclusive a narrativa de Na Pior em Paris e Londres. Curiosamente, foi com esta obra que surgiu George Orwell, pseudônimo do aspirante ao mundo das letras.
O livro conta suas próprias desventuras misturando narrativa documental, jornalismo e técnicas literárias da ficção. Antes de ser escritor e ficar famoso com a publicação de A Revolução dos Bichos e 1984, o autor ficou sem dinheiro na capital francesa, passou fome e foi obrigado a trabalhar em hotéis e restaurantes. Teve contato com todo tipo de gente e situações. Sem perspectiva, partiu para Londres, onde chegou a viver como mendigo até conseguir algo melhor.
Em uma passagem de Na Pior em Paris e Londres, Orwell compartilha sua experiência de não ter dinheiro ou o que comer: "Você descobre o que é sentir fome. Com pão e margarina no estômago, sai e olha as vitrines. Por toda parte, há comida te insultando em pilhas imensas, perdulárias: leitões inteiros, cestas de pães quentes, grandes blocos amarelos de manteiga, fieiras de salsichas, montanhas de batatas, vastos queijos Gruyère do tamanho de rebolos. Diante de tanta comida, uma lamurienta autocomiseração o invade. Você planeja pegar um pão, sair correndo e engoli-lo antes que o alcancem; e só não o faz por pura covardia".
Sabe aquela pergunta que costumávamos fazer na infância para os amigos: quais livros você levaria para uma ilha deserta onde fosse ficar sozinho por um longo tempo? Na Pior em Paris e Londres seria o número 1 de minha lista.
A cena de abertura já nos fisga com sua narrativa envolvente. Em seguida, começa a descrição do ambiente e dos personagens que conheceu, cada qual mais exótico do que o anterior. As histórias envolvendo o autor e o russo Boris são saborosas. Os dois amigos faziam peripécias juntos para conseguir algo para comer ou obter alguns trocados.
Após começar a leitura, é impossível largar o livro. Orwell nos leva de mãos dadas por uma grande aventura ao mundo dos miseráveis e famintos do final dos anos 1920.
"Na Pior em Paris e Londres", de George Orwell
- Companhia das Letras, 256 páginas, R$ 64,90
- Também há versões disponíveis em outras editoras