Quais as chances de virar milionário após uma temporada na prisão? Pouquíssimas, você e eu sabemos. O goiano Murillo Carizzio conseguiu. Não com recaídas no crime, assegura ele. Ainda no cumprimento da pena, investiu as escassas economias na venda de semijoias, com auxílio de uma ex-namorada. Deu a volta por cima e o resultado é narrado no livro Da Prisão ao Milhão (169 páginas, à venda pela Amazon, apenas em formato kindle, por R$ 5,99).
Carizzio era um jovem de classe média do interior de Goiás quando, no início da idade adulta, se rendeu à tríade da vida mansa, drogas e más companhias. Deu a lógica. Se envolveu em uma série de assaltos que acabou na morte de um dos seus comparsas, em confronto com PMs. Foi preso.
As memórias do cárcere são uma aula de como funcionam as leis no submundo. Como se portar, como não se comportar, valores e desprezos. Carizzio descreve tudo em pormenores, sem metáforas. O estilo lembra o João Estrella do aclamado Meu Nome Não é Johnny (best-seller que foi parar no cinema estrelado por Selton Mello).
Carizzio relata sua luta para voltar a ver o sol nascer redondo e retomar a trajetória rumo a uma faculdade, vida regrada. Tentar a volta por cima, enfim. Começa devagar, com ajuda de uma garota que o introduz no mundo das vendas pela internet. Algo necessário, já que logo se deparou com o drama de 10 entre 10 presidiários: portas que se fecham aos pedidos insistentes de emprego.
Por duas vezes, quando já estava fora das grades, policiais vieram buscá-lo novamente (detalhes, no livro). Em meio a tudo isso, uma gravidez, a relação com os pais, o distanciamento de amigos não tão amigos assim...A ideia de virar advogado, impulsionada pelas injustiças que viu na cadeia. A luta para permanecer íntegro.
A medida em que avança a leitura, se percebe que Carizzio conseguiu retomar sua vida. Fundou a El Patrón Pratas (cujo nome tem uma história por trás) A que preço? Qual seu destino? Aquele que se dispuser a mergulhar nessa história vai se inteirar de uma história de superação e uma aula de direitos humanos na prática, não apenas teórica. É uma obra que vale a pena.
TRECHO
"Ao parar o carro, todas as viaturas o cercaram, quando os policiais se aproximaram de Murillo e dos outros que saíram dos bancos de carona e passageiro, chutes, socos e pontapés, começaram a cortar o vento em direção a eles. A arma ficou dentro do carro, junto com o rapaz baleado, que não tinha forças para conseguir se mover, mas foi retirado puxado pelo calcanhar por um dos policiais. Mesmo com a camisa ensanguentada, e totalmente debilitado, ele não deixou de receber uns dois socos na costela.
Enquanto se defendia da violência e de uma possível contusão no crânio, preocupado com o rapaz atingido, Murillo olhou para ele, enquanto era arremessado do banco de trás do G4 da sua mãe. Naquele momento, o olhar do rapaz cruzou com os seus e ele não se lembra de já ter visto alguém tão assustado em desespero quanto o olhar daquele jovem".