Se o preço da carne bovina chama a atenção do consumidor, saiba que o movimento de alta nesta época do ano no Rio Grande do Sul surpreende também produtores e indústria. O motivo é simples: entre agosto e novembro, o Estado tem o período de safra, quando normalmente a oferta cresce, e os preços caem. Não é o que se vê em 2020.
— É totalmente atípico. Estamos no meio da safra, e o preço continua aumentando — confirma Ronei Luxen, presidente do Sindicato das Indústrias de Carnes e Derivados do RS (Sicadergs).
Em um mês, o valor médio pago por carcaça nos frigoríficos chega a ter variação entre 21% e 28%. E a perspectiva é de que o quadro não tenha grandes alterações no curto prazo. Em razão da continuidade dos fatores que hoje sustentam a valorização — e o possível acréscimo de outros.
O ingrediente mais recente é o da elevada demanda que chega de outras partes do país — habitualmente, é o Rio Grande do Sul que precisa trazer produto para dar conta da demanda. Afetadas por situações como seca e queimadas, essas regiões enfrentam escassez de oferta da matéria-prima. A compra é tanto de carne quanto de animais vivos.
— Em outros anos, no período de safra, já vendemos carne para fora do Estado, mas hoje o leque está bem maior. Isso também elevou os preços aqui, porque lá está mais caro — pondera Lauxen.
Essas áreas têm grande fatia das exportações brasileiras. Ainda que em outubro tenha sido registrado recuo na quantidade e no valor embarcado, no acumulado do ano se mantém o cenário de aumento de 9% na quantidade e 16% na receita, conforme a Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo), com base em dados do Ministério da Economia.
Fatores locais também pesam na equação. Com uma estiagem acumulada no último verão, pecuaristas voltam a ter a atividade afetada pela falta de chuva neste momento. Pastagens de verão, usadas na alimentação do rebanho, sequer tem sido semeadas por conta da falta de umidade. As consequências são de curto, médio e longo prazo, uma vez que interferem no ciclo reprodutivo.
— O pessoal está esperando a chuva, e deixou o gado um pouco mais na pastagem. Isso pulverizou a oferta — explica Pedro Piffero, coordenador da Comissão de Pecuária da Federação da Agricultura do Estado (Farsul).
A valorização exponencial da soja também fez com que em algumas áreas se deixasse de colocar gado para engordar no inverno, reduzindo a oferta. Essa combinação de ingredientes mantém firmes os preços.
Nesse cenário, com efeitos da estiagem podendo se agravar e a perspectiva de manutenção da demanda externa, a projeção é de que não haja alterações significativas no quadro.
— No Brasil, levará um tempo para oferta voltar à normalidade — entende o presidente do Sicadergs.
As indústrias manifestam preocupação ainda com a falta futura de matéria-prima por conta dos terneiros e do gado magro agora vendidos a outras partes do país e do mundo — estimativa do Sicadergs, aponta um total de 300 mil cabeças em 2020.