Empresa gaúcha bem conhecida por suas atrações turísticas, como o Snowland, e pelos seus empreendimentos imobiliários, muitos deles no formato de multipropriedade, a Gramado Parks conseguiu na Justiça a suspensão da cobrança de suas dívidas pelo prazo de 60 dias. Assim, todas as anteriores a 13 de março ficam suspensas.
O ação foi para tutela cautelar antecipatória, o que costuma ser usado pelas companhias para ganhar fôlego enquanto estruturam um pedido de recuperação judicial. No caso da Gramado Parks, até há essa possibilidade, mas não é o objetivo, diz o advogado Laurence Medeiros, do escritório gaúcho MSC Advogados, que está representando a Gramado Parks. Segundo ele, a ideia é ganhar tempo enquanto aguarda mediação na Justiça para negociar com uma das principais credoras, a securitizadora Fortesec, responsável pela emissão de certificados de recebíveis imobiliários (CRI) da companhia.
Os CRIs são uma forma de o setor imobiliário conseguir capital. Quando uma construtora vende por financiamento, ela receberá o pagamento total ao longo de alguns anos. Se ela precisa de dinheiro antes para tocar o negócio, ela procura uma securitizadora, que transforma o valor a ser pago a prazo em títulos. A construtora recebe o dinheiro antes, enquanto o investidor se remunera pelo juro.
Na relação entre a Gramado Parks e a Fortesec, todos os recebíveis (as parcelas dos financiamentos dos clientes) que a empresa gaúcha ganha por mês caem em uma conta controlada pela securitizadora, que recolhe os valores necessários para pagar os investidores e devolve, à companhia gaúcha, os excedentes. A questão é que, com queda de receita e aumento das taxas de juros atreladas aos CRIs, o valor que volta para a Gramado Parks tem sido insuficiente para pagar todas as despesas.
"Estimou que, mensalmente, sejam drenados para as contas centralizadoras da Fortesec recebíveis que somam quase 20 milhões de reais, os quais, se liberados em favor do Grupo Gramado Parks, permitiriam fazer frente às despesas operacionais, evitando o agravamento das atividades empresariais e, quiçá, o colapso das operações", diz parte do despacho da Justiça ao qual a coluna teve acesso.
Com isso, a Gramado Parks entrou com pedido na Justiça que culminou na suspensão por 60 dias do pagamento da dívida a credores e na concessão de moratória pelo prazo inicial de 30 dias (que pode ser estendido por outros 30) dos créditos para Fortesec. Nesse caso, em específico, foi determinado que haja comprovação que os recursos que iriam para esses créditos sejam destinados aos motivos que levaram a Gramado Parks a entrar com tutela cautelar, como garantir fluxo de caixa, pagamento de folha e, até mesmo, estruturação do pedido de recuperação judicial.
A mediação empresarial está marcada para dia 4 de abril. A Gramado Parks tentará uma renegociação com a Fortesec para evitar a recuperação judicial.
— Ao final do período de mediação e a depender do desfecho, o grupo encaminhará as medidas eventualmente necessárias para seguir preservando sua atividade e colaboradores — diz Ivo Waisberg, sócio da TWK Advogados, outro escritório envolvido no processo.
Além de ser dona do Snowland e do Acquamotion e de ter uma atuação forte em Gramado, a empresa também tem empreendimentos em Foz do Iguaçu (PR), Rio de Janeiro (RJ) e no nordeste do país. A alegação dos problemas financeiros passa pela crise da pandemia de covid-19, que provocou o fechamento de suas atividades turísticas, de entretenimento e hotelaria por um período. A companhia também cita que o grau de endividamento cresceu pelo aumento desordenado dos insumos da construção civil e "a elevação expressiva dos juros e encargos financeiros".
"Nossos hotéis e parques continuam operando sem qualquer alteração. Buscamos essa medida justamente para garantir a continuidade do negócio, preservando mais de 2.000 empregos diretos – sem contar os indiretos – e uma importante fonte de renda e arrecadação, principalmente para o município de Gramado e toda a região da Serra Gaúcha", disse Anderson Caliari, diretor-presidente da Gramado Parks, em nota.
Também em nota, a Fortesec falou que "mais do que emitir e controlar suas operações mensalmente, faz constantemente diligências para proteger não só os investidores, mas também acompanhar a saúde financeira das empresas emissoras dos CRIs. A securitizadora reforça que sempre tomará todas as medidas cabíveis para defender os interesses dos crizistas. E reitera que já está pacificado no judiciário que garantias pessoais dos sócios e garantias fiduciárias vinculadas aos ativos estão preservadas em benefício dos investidores".
Problema com prestadores de serviços
A coluna também recebeu o relatos de uma construtora prestadora de serviços da Gramado Parks que está sem receber da empresa, entre outros fornecedores. A TWM Construtora alega atrasos desde o final de 2022. Representante da empresa, Barbara de Souza explica que trabalharam cerca de dois anos na construção do hotel Bonna Vitta.
— Enquanto estávamos trabalhando, os pagamentos eram feitos normalmente. Chegando no final da obra, não pagaram as últimas notas. Como fomos a única empresa que expôs a situação na internet, eles começaram a pagar por parcelas. Agora, falta uma última nota e mais a retenção, fora os metros lineares de porcelanato que não foram pagos - diz ela, calculando o débito em R$ 300 mil.
Procurada, a Gramado Parks falou que a empresa busca tratar seus fornecedores "de forma igualitária", e que "todos os fornecedores foram atendidos e sempre estivemos abertos a diálogo, buscando trazer propostas viáveis e tratativas saudáveis em negociação". Também disse que está trabalhando "arduamente, com apoio de consultorias financeiras e jurídicas, pela manutenção e futuro da empresa, para garantir a continuidade de toda nossa cadeia de fornecedores, parceiros, colaboradores e suas famílias, para que, no menor prazo possível, possamos voltar à normalidade".
Coluna Giane Guerra (giane.guerra@rdgaucha.com.br)
Com Daniel Giussani (daniel.giussani@zerohora.com.br) e Guilherme Gonçalves (guilherme.goncalves@zerohora.com.br)
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