Crucial para a economia local, o turismo da Região das Hortênsias está preocupado com o movimento de Natal, especialmente em Gramado e Canela. Ocupação hoteleira está entre 65% e 70%, quando se projetava até 90%, há queda no fluxo em restaurantes e são feitas promoções de ingressos até para o Natal Luz. Diretor-executivo da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis no Rio Grande do Sul (ABIH RS), José Justo conta que a demanda esperada para dezembro está um terço menor. Ele acompanha diariamente 16 estabelecimentos da região. Isso tem gerado um debate principalmente sobre preços altos, que chega aos atrativos turísticos.
Justo lista vários motivos para o baixo movimento, reforçados a partir de entrevistas com um grupo de cem clientes que cancelaram as viagens de final de ano para a Serra. O principal é o medo do futuro político, levando consumidores a adiar férias para guardar dinheiro. Neste último trimestre, a desconfiança deles chegou no auge.
- O cliente de Gramado é classe média, dividida entre quem tem vínculo de emprego e ganha mais de cinco salários mínimos e autônomos, como empreendedores e comerciantes. São pessoas que compram cotas de resorts e hotéis fracionados, adquirem pacotes de férias de operadoras de turismo, de clubes de viagens, ou, quando repetem a viagem, buscam direto o hotel no qual se hospedaram antes. Têm como características a desconfiança, a insegurança e a busca por previsibilidade.
A alta dos preços dos combustíveis em geral, mesmo a queda na gasolina neste semestre, também é apontada como motivo, já que metade dos visitantes vem de viagens internas no Rio Grande do Sul. Já a outra metade sentiu a disparada nos preço das passagens aéreas, que subiram, em média, 35% só nos últimos 12 meses, em cima de outra elevação, puxada principalmente por querosene.
- Os custos de energia, combustíveis e tarifas pressionaram os preços e as cidades tornaram-se mais caras, afastando o turista popular - justifica o executivo.
Mas e o dólar valorizado não atrai turistas estrangeiros? O diretor da entidade diz que, em tese sim, mas os turistas da Serra vêm de países que estão com problemas, como Argentina e Europa.
- O Oriente manda muito trabalhador para cá, mas também tem racionalizado as viagens por causa da geoeconomia e da geopolítica.
Mesmo tendo perdido um terço dos clientes, Gramado recebe diariamente 25 mil turistas que dormem e consomem na cidade. Mas Justo lembra que a discussão vem de 2017, quando começou a se falar de superoferta e que e região precisava de mais atrativos "gastadores de tempo".
- Além de alças de acessos terrestre e aéreo. Os governos não fizeram e não deixaram fazer a estrada de Gramado a Santa Maria do Herval, nem de Canela a Três Coroas, e não colocaram um centavo em um aeroporto em Vila Oliva. Deu nisso. Está matando os pequenos hotéis e pousadas, pois eles não têm canais de distribuição eficientes e não podem suportar ações de marketing de peso nos principais eventos de captação de turistas.
Reflexão
Uma postagem em rede social feita pela Flui Consultoria Hoteleira, com clientes tradicionais na região, provocou um debate importante, com participação de diversos empresários nos comentários. O título é "E agora, Gramado?", propondo que se reflita sobre o futuro do turismo, partindo de uma temporada que pode estar entre as piores dos últimos anos em números.
"Surfamos uma boa onda com a pandemia e a alta demanda gerada pelas fronteiras fechadas, porém, mesmo a realidade sendo outra desde o início de 2022, nos recusamos a olhar para este novo momento e seguimos cobrando valores exorbitantes e espantando, de forma categórica, a classe média que sempre movimentou o nosso destino.", diz trecho do texto.
Proprietária da consultoria e com experiência no setor público e privado de Gramado, Elis Gheno Zilli concorda com os impactos da economia do país e que a Copa do Mundo também afetou o turismo. Lembra que 2022 foi um ano muito bom para Gramado e entende que essa temporada atípica não deixa de ser um alerta. Observa também que a oferta de leitos cresce muito, sem ser acompanhada pelo número turistas.
- Há hotelaria para todos os bolsos, mas a viagem como um todo está cara para clientes de classes B e C. O grande problema também não é só preço, é valor. Está faltando inovação nos eventos públicos e também na iniciativa privada. A cidade em si continua muito diferenciada, limpa, sempre bem cuidada e segura - comenta Elis.
A coluna ainda conversou com dois empresários que comandam redes de hotéis na região das Hortênsias. Ambos estão apreensivos, atentos ao debate e analisando o comportamento do consumidor. Antes de tirarem conclusões, preferem aguardar a transição eleitoral para identificar o que desta queda está sendo provocado pelo momento político, após uma eleição acirrada.
Coluna Giane Guerra (giane.guerra@rdgaucha.com.br)
Equipe: Daniel Giussani (daniel.giussani@zerohora.com.br) e Guilherme Gonçalves (guilherme.goncalves@zerohora.com.br)
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