O recuo da Petrobras horas depois de anunciar aumento no preço do diesel provoca uma sensação forte de déjà vu, quando a gente tem a nítida impressão de que já viu aquela situação antes. E já viu, na época em que o reajuste dos combustíveis era usado para controlar a inflação, antes da mudança na política de preços na estatal em 2017.
E não foi apenas o ato de não aumentar, o que seria "menos pior". A Petrobras chegou a elevar e colocar o preço 5,7% maior na tabela no site e depois voltou atrás. Seria o primeiro reajuste após 20 dias sem alterações, apesar de alta nas cotações internacionais do petróleo e do diesel no período.
A sinalização de interferência política é forte, o que fica mais estranho ainda porque ocorreu no dia em que o presidente Jair Bolsonaro assinou o projeto de lei para autonomia do Banco Central. A pressão do Governo Federal pode ser pela inflação, já que o índice subiu com força puxado pelos alimentos e pela gasolina. Mas também é pelo temor de uma nova greve dos caminhoneiros, que já tinha feito a Petrobras anunciar reajustes do diesel em prazos não inferiores a 15 dias.
O impacto bem ruim - e previsível - foi imediato nas ações da Petrobras. Como a bolsa de valores de São Paulo, a B3, já tinha fechado, a Petrobras caiu quase 5% ontem no after market nos Estados Unidos, avisa o diretor da Mirae Asset, Pablo Spyer.
— Abertura tende a ser bem negativa — projeta ele para o pregão desta sexta-feira (12) aqui no Brasil.
E as ações seguem caindo nesta manhã. Sócio da Monte Bravo Investimentos, Bruno Madruga alerta que o papel está caindo cerca de 4% no pré-mercado em Nova York (EUA).
Política de preços da Petrobras
Por anos, agentes econômicos criticaram o uso da Petrobras para direcionar a inflação no país. A política de ajuste de preços não acompanhava quesitos que tranquilamente são observados por uma empresa privada. Mudou quando Pedro Parente assumiu a presidência da Petrobras, com a missão de reerguer a empresa e agradando o mercado financeiro. Inclusive, os preços chegaram a oscilar diariamente, acompanhando o câmbio e o preço do petróleo no mercado internacional. Desagradou o segmentos do setor produtivo e veio, então, a paralisação de maio.
Pedro Parente pediu demissão logo após a greve dos caminhoneiros. Na carta de renúncia, disse que sua permanência na presidência da estatal não era mais "positiva". Depois disso, os ajustes nos preços dos combustíveis deixaram de ser diários, mesmo que nem de longe tragam a imprevisibilidade da mudança de preços de antigamente.
Sócio da gestora de fundos Quantitas, Wagner Salaverry é enfático ao dizer que, sem lucro, a Petrobras não consegue fazer os investimentos necessários para continuar operando no Brasil. Lembrando que são recursos que também movimentam outros setores da economia. Fora que, deixando de existir, seria substituída por empresas privadas que também operariam em condições de mercado.
Apesar de ter controle estatal, a Petrobras tem capital aberto, ou seja, ações são compradas por investidores. Inclusive, por pessoas que usaram o FGTS para comprar papéis da empresa.
Por outro lado, há quem defenda que a Petrobras deveria sim controlar preços para evitar impactos das flutuações no mercado internacional e atender aos interesses dos consumidores. É o caso do Dieese. Com forte atuação sindical, a entidade diz que é o consumidor que acaba pagando a conta, acrescentando que o impacto maior é sobre as camadas médias e mais pobres da população.