O correto jornalismo deve ser independente e isento, mas não pode ser neutro frente ao crime nem se calar sobre o horror. A duas semanas da eleição presidencial, seria absurdo não alertar sobre o tom demencial do deputado Jair Bolsonaro, que continua a fazer da violência e do ódio fanático a sua principal proposta de candidato.
Nem a dor da brutal facada de que foi vítima humanizou sua postura, em que a ira domina tudo. Com ela, feito enlouquecido cata-vento girando para todos os lados, até do hospital sua linguagem é rude e grosseira.
Esta semana, a mais respeitada revista econômica do mundo, The Economist, de Londres, dedicou toda a capa a Bolsonaro e o classificou de "ameaça à estabilidade da América Latina".
_ Os brasileiros não devem se enganar. Seu eventual governo seria desastroso para o Brasil e o continente _, alertou, lembrando que ele nada tem do "verdadeiro comportamento liberal". Descreveu a corrupção e as dificuldades atuais e advertiu: "Se ele triunfar, os brasileiros correm o risco de tudo se tornar ainda pior".
Foi adiante: comparou Jair Bolsonaro a Nicolás Maduro, da Venezuela, e a Daniel Ortega, da Nicarágua, que viraram ditadores após eleitos.
Os ingleses salvaram o mundo em 1939 resistindo sozinhos, durante meses, à sanha de Hitler, que dominava a Europa Ocidental e ameaçava o Brasil. Agora, outra vez vem da Inglaterra o alerta contra o crime que, aqui, pode se tornar, também, obra de cada um de nós.
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A boa-fé com que vários grupos da população veem a violência fanática de Bolsonaro se explica, mais do que tudo, pelo pedantismo arrogante com que Lula e o PT nos governaram.
Diziam-se criadores do Céu e da Terra e eram "os puros". Mas entregaram a Petrobras aos grupelhos corruptos chefiados pelo PP de Paulo Maluf e pela "organização criminosa" criada no MDB, e integrada até pelo atual presidente da República, como aponta a própria Procuradoria-Geral da República. Lambuzaram-se também nas doçuras do poder e, hoje, Lula é um preso comum como outros da política.
Com a sedução típica dos violentos, Bolsonaro fingiu ser contra tudo isso e instalou-se no ninho alheio construído pelos procuradores e juízes da Lava-Jato e de outros processos, que revelaram o horror e nos fizeram perder o medo.
Mas "ainda há tempo para deter a marcha da insensatez", como disse Fernando Henrique Cardoso, de quem se pode discordar muito e muito, mas que jamais foi insensato. Pesquisa não substitui o voto. Sim, ainda há tempo.