Tão logo pousei meus olhos nos amendoados olhos emoldurados pela maquiagem cravejada em lápis-lazúli e a seguir contemplei os lábios cerrados num silêncio eterno, o nariz de perfeição angelical e as maçãs da face a reluzir em puro ouro, vi que estava diante de meu rei: o rei-menino Tutancâmon. Eu devia ter uns nove anos — a mesma idade que ele tinha ao assumir o trono, em 1336 a.C. Entrei então numa profunda viagem egípcia, sem data para acabar, embora ela tenha arrefecido. Aos 10 anos, escrevi meu primeiro “livro”: dois cadernos espiral repletos de hieróglifos — no caso, meus: 200 páginas de anotações e rabiscos compilados de livros que adquiri com a grana da mesada.
Pouco antes, em 1967, havia comprado meu primeiro livro: A Pré-História, de Grahame Clark, por nove cruzeiros, na Livraria do Globo. Quando o li, recuei no tempo e passei a viver na pré-história, entre neandertais e Homo (e mulheres?) sapiens, à procura de Adão.
Ainda tenho o livro de Clark, bem como os dois cadernos “egípcios”.
Alguns anos mais tarde, caí numa trip obsessiva ligada à vida e à obra do cantor Bob Dylan e por isso mergulhei tanto na história dos Estados Unidos, que, ao dar por mim, já estava a bordo do Mayflower — o navio que trouxe os “peregrinos” para a Nova Inglaterra, em 1620. Em 1973, caiu-me nas mãos o devastador clássico Enterrem meu Coração na Curva do Rio, de Dee Brown, e, logo a seguir, As Veias Abertas da América Latina, de Eduardo Galeano. Sem abandonar Dylan, passei a ler tudo o que encontrei sobre os povos indígenas do Novo Mundo e o terrível processo que resultara em sua conquista e, em vários casos, sua extinção.
Ainda tenho os livros de Dee Brown e Galeano – só que agora em várias edições.
Mas, até então, de história do Brasil... nada! Até que um feio dia, andando por aí, fui atingido por um raio de vergonha e concluí que, além das baboseiras às quais fora submetido no colégio, eu de fato nada sabia sobre meu próprio país: sabia “chongas”, para usar um termo técnico. Antes tarde do que nunca, pus-me a ler. Vinte anos depois, quando meus amigos não aguentavam mais me ouvir “palestrar” sobre episódios pouco conhecidos da nossa história e clamarem: “Cala a boca e escreve”, segui o conselho. E escrevi a coleção Terra Brasilis, sobre os primórdios do Brasil. Ela vendeu 1 milhão de exemplares.
Há dois anos, fui convidado para ter um canal no YouTube. Surgiu o Buenas Ideias e nele gravo episódios semanais chamados Não Vai Cair no Enem. O canal está com 490 mil assinantes. O passo seguinte foi fazer ao vivo o que faço no estúdio e Não Vai Cair no Enem virou peça de teatro. Depois de cinco apresentações com lotação esgotada no Rio e em São Paulo, a peça estará hoje, sábado e domingo no São Pedro, o mais lindo teatro do Brasil. Se você acha que a história pulsa e brilha muito além da sala de aula, apareça lá.
Dizem que Tutancâmon e Bob Dylan já confirmaram presença.