O Brasil está entre os 10 países que mais consomem medicamentos no mundo — segundo dados da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma) referentes a 2018 —, o que acaba gerando um grande volume de remédios a serem descartados com o passar dos anos, seja devido ao término do tratamento ou do prazo de validade. No entanto, muitas pessoas não sabem como descartar corretamente esse tipo de resíduo nem imaginam que jogá-los no lixo comum ou no vaso sanitário ocasiona diversos problemas.
De acordo com Rafael Carrasco, farmacêutico do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), não havia uma política pública que orientasse o descarte correto de medicamentos até 5 de junho deste ano, quando o presidente Jair Bolsonaro assinou o Decreto nº 10.388, implementando a logística reversa de medicamentos descartados pelo consumidor, baseada na Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS).
A determinação prevê que sejam definidos locais para que o consumidor possa jogar fora o medicamento inutilizado e que os distribuidores sejam os responsáveis pelo destino adequado do remédio. Carrasco explica que os postos de coleta podem ser farmácias, drogarias e até mesmo postos de saúde. A partir do recebimento, esses estabelecimentos devem fazer a junção e o transporte do material até a destinação final: incineradores, coprocessadores ou aterros especiais.
— Esse decreto é um marco no sentido ambiental e sanitário. Estabelecendo essa logística reversa, que dá o correto encaminhamento para o descarte seguro dos medicamentos, se evita que ele cause muitos danos ao meio ambiente — salienta o farmacêutico.
Impactos do descarte incorreto
O descarte inadequado desses medicamentos pode gerar diversos problemas ambientais, como a contaminação do solo, da atmosfera e dos lençóis freáticos. Carrasco afirma que é bem comum relatos de pessoas que os jogam no vaso sanitário ou na pia, mas enfatiza que essa atitude é igualmente errada e prejudicial ao ambiente, pois os remédios acabam caindo no esgoto e indo parar em cursos d'água e mananciais.
— A questão é que, uma vez nesses locais, não há como remover o medicamento de lá. E, com o passar do tempo, os remédios acabam se degradando e gerando produtos tóxicos que ainda alteram o processo de decomposição de outros resíduos orgânicos — explica.
João Victor Laureano, doutor em Ciências Farmacêuticas e professor do curso de Farmácia da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra), acredita que muitas vezes as pessoas fazem o descarte errado por não terem conhecimento dos problemas que causam. Por isso, considera importante destacar que os medicamentos são compostos químicos que originam danos:
— No esgoto, por exemplo, os remédios vão ficar concentrados em algum lugar, e não temos uma estação de tratamento de água adequada que consiga retirá-los de lá.
O professor ressalta que o problema é ainda maior quando se trata de antibióticos e antiparasitários, pois, quando ocorre o descarte incorreto desses medicamentos, eles acabam em contato com a flora bacteriana e parasitária.
— A quantidade às vezes não é o suficiente para matar a bactéria, mas a gente a expõe e faz com que ela desenvolva resistência. Depois, acontece de não termos antibióticos para tratar essas bactérias — alerta Laureano.
Quando descartar
Os profissionais salientam que as pessoas devem utilizar medicamentos somente com orientação e acompanhamento profissional, a fim de saber a quantidade adequada e usá-los de forma racional. Carrasco aponta que, na maioria das vezes, os remédios sobram nas residências porque são comprados em excesso, já que muitas pessoas se automedicam.
— Isso é até um risco para crianças, idosos e animais de estimação. Se tu tens um acompanhamento de um profissional da saúde, as chances de não ter um acúmulo desnecessário de medicamentos é muito maior — afirma. — Cerca de 28% dos casos de intoxicação no Brasil são por causa de medicamentos, justamente porque o temos disponível ali, quando sobra a gente acaba usando de maneira inadequada — complementa Laureano.
O ideal é descartar sempre que o medicamento estiver vencido ou sobrando. Os profissionais ainda ressaltam que remédios fora do prazo de validade não podem ser consumidos em hipótese alguma, pois ao longo do tempo eles perdem a eficácia e se degradam em compostos tóxicos, que podem inclusive provocar danos aos pacientes.
Como descartar
De acordo com José Francisco Agostini Roxo, fundador do programa Descarte Consciente e CEO da Brasil Health Service (BHS), as pessoas devem separar o medicamento vencido ou inutilizado em casa, evitando que ele fique perto de idosos e crianças, para levá-lo até o posto de coleta quando possível. Pode-se rasgar a caixa e a bula e colocá-las no lixo reciclável, mas não se deve retirar o medicamento da cartela nem do frasco, pois tudo que tem contato com o remédio vai para a incineração, que é o destino final.
No entanto, Roxo explica que exclusivamente no Rio Grande do Sul a incineração não é permitida, pois o Estado conclui que a queima também polui muito. Os medicamentos descartados no RS são encaminhados para um aterro industrial classe 1, que é revestido com camadas impermeáveis, no qual todos os produtos químicos ou perigosos ficam reservados até que surja uma tecnologia capaz de tratá-los.
Onde descartar
Mesmo com o novo decreto, não são todas as farmácias e drogarias que recebem esse tipo de resíduo — o que faz com que muitas pessoas ainda não saibam onde podem descartar seus medicamentos vencidos ou sem uso. Para auxiliar nisso, o site eCycle possui uma ferramenta para a busca de postos de descarte.
Como procurar?
- Clique neste link;
- Na caixa “O que precisa descartar?”, escreva “medicamentos”;
- Em seguida, na caixa “Onde deseja descartar?”, informe seu CEP ou endereço;
- Clique em “Buscar” para ter acesso aos postos disponíveis perto de você.