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Três mortes
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"Tenho de seguir em frente", diz viúvo de uma das mulheres que comeu bolo envenenado em Torres

Jefferson Luiz Moraes, 60 anos, era casado com Maida Berenice Flores da Silva, que morreu após consumir o doce. De acordo com ele, familiares passaram mal instantes depois de ingerir a sobremesa contaminada com arsênio

Cristine Gallisa

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Reprodução / RBS TV
Jefferson Luiz Moraes era casado com Maida Berenice Flores da Silva havia 32 anos.

Viúvo de Maida Berenice Flores da Silva, uma das mulheres que morreu em razão do bolo envenenado em Torres, Jefferson Luiz Moraes, 60 anos, ainda mora no apartamento onde a família comeu a sobremesa.

Na primeira entrevista que concedeu após a tragédia do bolo envenenado, que matou outras duas mulheres, além da esposa, Jefferson relembra os últimos momentos delas e desabafa:

— Agora tem de seguir em frente. Tá muito difícil. Tenho de reconstruir tudo. Ainda bem que eu tenho dois trabalhos, então eu vou focar no trabalho. Porque quando eu começo a trabalhar, consigo dar uma desligada — desabafa.

A decoração do local foi mantida como estava na tarde de 23 de dezembro: enfeites, montados por Maida, seguem em todos os cômodos. A equipe da RBS TV esteve na residência, onde conversou com Jefferson.

Maida morreu aos 58 anos após comer o bolo no dia 23 de dezembro. Neuza Denise Silva dos Anjos, irmã dela, e Tatiana Denise dos Anjos, filha de Neuza, também morreram.

Zeli dos Anjos, irmã de Maida e Neuza, preparou o bolo. Ela chegou a ficar internada, mas sobreviveu e teve alta do hospital. Sua nora, Deise Moura dos Anjos, está presa por suspeita de envenenar o doce com arsênio, em razão de desavenças com a sogra. 

Na confraternização estavam ainda uma criança de 10 anos, filho de Tatiana, e João, marido de Neuza — o único que não comeu o bolo. Deise não estava presente

Segundo Jefferson, Zeli e os demais familiares chegaram no apartamento de Torres por volta das 14h do dia 23 de dezembro. 

O bolo foi partido e dos sete presentes, seis comeram. Ele conta que sentiu um gosto ardido, ácido, que disse ser semelhante ao do gengibre. Mas o sabor foi mascarado pela cobertura de açúcar. 

De acordo com ele, em minutos, todos os que tinham comido começaram a passar mal. 

— Quando a Zeli comeu, ela já se levantou, sentou na cadeira, ficou inquieta. Daí a Neuza foi comer, deu uma mordida, a segunda, a Zeli disse: "Não, não come, porque não tá legal esse bolo". Foi então que Zeli saiu correndo e começou a vomitar — relatou Jefferson. 

Segundo ele, Tatiana e Maida passaram mal, mas não vomitaram. Ele acredita que quem vomitou, sobreviveu. 

— Só tá vivo quem, desculpe falar, vomitou. Quem não vomitou não tá vivo — disse.

Jefferson afirma que manteve o doce intacto para que a polícia pudesse investigá-lo. Ele descreve a sequência de eventos como um "filme de terror".

— Mas a gente não estava sabendo ainda que ia ser tão grave. Eu não liguei com o fato do Paulo. Mas depois, no velório da Neuza, a minha irmã começou a pesquisar lá, e ela mostrou: "Ó, pode ser arsênio". E nesse meio tempo, acho que o delegado me ligou porque ele queria saber onde estava o resto do bolo, se tinha botado fora. Eu disse: "Não, o bolo está lá intacto, não botei fora porque eu sabia que era coisa grave isso aí" — afirma.

O casal

Ele e Maida se conheceram em um CTG, há 32 anos. Costumavam viajar pelo Brasil em um motorhome. Faltava conhecer só dois Estados: Amapá e Roraima.

— A gente estava em um momento muito bacana. Filhos não tinha, mas a questão familiar, financeira, conjugal, saúde, lazer, social, intelectual, estava tudo em harmonia, sabe? É um buraco que fica. Minha cara metade foi —finaliza.

Morte de sogro

A Polícia Civil investiga o crime. Deise Moura dos Anjos está presa. A investigação apura se ela também estaria envolvida na morte do sogro, Paulo Luiz dos Anjos. 

O sogro de Deise morreu em setembro. Inicialmente, acreditou-se que ele havia sido vítima de intoxicação alimentar. Porém, perícia realizada após a exumação do corpo demonstrou a presença de arsênio, mesma substância encontrada nas vítimas que comeram bolo.

"Essa menina é do mal"

Segundo Jefferson, Maida nãogostava de Deise Moura dos Anjos, nora de sua irmã Zeli.

— "Essa menina é do mal", ela dizia — relata o viúvo.

Deise não frequentava a casa de Jefferson e Maida. Quando o marido de Zeli, Paulo dos Anjos, morreu, a família chegou a desconfiar de Deise.

— A gente não levou adiante (a desconfiança). Talvez o filho, porque levou a banana, poderia ter ficado chateado, então a gente também não quis magoar. Mas nós tínhamos combinações de não comer nada que viesse de lá (de Deise). Porque a gente tava muito desconfiado já — afirmou.

Amiga relata ameaças a Zeli

Uma amiga da família, que preferiu não se identificar, procurou a Polícia Civil no dia do velório de Tatiana. Registrou um boletim de ocorrência, contando o que ouviu de Tatiana, dois dias antes de ela comer o bolo envenenado e morrer.

— Relatei essa desconfiança, a questão das ameaças que ela (Deise) fez pra Zeli, que a Tati me falou. Ela explicou tudo isso, contou a história da mensagem que a Deise mandou pra Zeli, dizendo que ainda vai ver toda a família dentro de um caixão — afirma a amiga.

A amiga relembra que a relação de Deise com a sogra sempre foi conturbada, e que as desconfianças se voltaram contra ela depois da morte de Paulo.

Ela acredita que Deise sentia inveja da relação entre Zeli, as irmãs e a sobrinha Tatiana, que cresceu junto ao primo, filho de Zeli.

— Acho que era inveja dessa união, as três eram muito unidas, era muito bonita a relação das três irmãs — diz.

Contraponto

A defesa da acusada Deise, representada pelo escritório Cassyus Pontes Advocacia, através da presente nota, vem se manifestar sobre os fatos envolvidos no inquérito em andamento na Comarca de Torres sobre o fato do bolo.

 De início, insta salientar que a condição da presunção de inocência é garantida constitucional, que não necessita de demonstração, em um inquérito que não possui relatório final da investigação.

 Ademais, os fatos aventados na mídia, até o presente momento, não possuem enfrentamento a ampla defesa e o contraditório diante do caráter inquisitorial do procedimento administrativo.

Neste sentido, toda prova técnica necessita de análise específica, pericial e com contraprova, a qual irá se desenvolver no trâmite judicial, com o devido processo legal.

 Assim, sobre as provas, se teve acesso ao relatório parcial de aparelho telefônico indicado como da acusada Deise, que não apresenta integralidade do conteúdo para o apontamento definitivo do caso. Ainda, qualquer arquivo armazenado, conversas, ou imagens devem ser avaliados no contexto correto e devido no qual era inserido.

 Já existem requerimentos de enfretamento sobre as provas inquisitoriais e decisões dos juízos responsáveis, os quais já foram protocolados e aguardam julgamentos pelo juízo de primeira instância.

Porto Alegre, 12 de janeiro de 2025.

Cassyus Pontes advocacia

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