André Ávila Fonseca, 37 anos, foi indiciado pela morte da namorada, a jovem Laila Vitória Rocha Oliveira, 20 anos, que teve o corpo encontrado no fim de março, na casa do homem, em Porto Alegre. O crime aconteceu no bairro Lomba do Pinheiro, na zona leste da Capital. Segundo a investigação, os dois mantinham relacionamento a distância: a jovem morava em Parauapebas, no Pará, e estava na Capital visitando o companheiro desde meados de fevereiro. O homem está preso e confessou o crime.
Fonseca deve responder por homicídio qualificado (por feminicídio e motivo torpe) e por violência psicológica contra a mulher. O inquérito foi remetido à Justiça na sexta-feira (5).
De acordo com a Polícia Civil, a investigação apontou que a ação do homem teve contornos cruéis. Na noite de 25 de março, a polícia foi acionada por vizinhos que relataram ter ouvido gritos vindos da residência do homem. Ao chegar na casa, as equipes encontraram o corpo de Laila na lareira, parcialmente carbonizado. A perícia indicou que a mulher ainda estava viva quando foi colocada ali.
— O laudo pericial demonstrou que ela aspirou fuligem e portanto foi queimada viva. Estava viva ate o momento em que foi queimada. As perícias também demonstraram que a vítima possuía marcas que indicam tentativa de defesa. Ela tentou se defender dos golpes praticados pelo agressor. Essas marcas aparecem especialmente nas mãos, e os dedos chegaram a ser decepados — explica a delegada Cristiane Ramos, da 1ª Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam) da Capital.
Segundo a polícia, não se sabe se a vítima ainda estava consciente quando as violências foram cometidas.
Para ferir a namorada, o agressor teria usado uma faca longa, como uma espada. O laudo pericial do local do crime ainda detalhou algumas ações, como o uso de uma cortina interna da casa para enrolar a jovem e transportá-la até a casa que possuía a lareira. Segundo a delegada, o homem confirmou essa dinâmica.
Em depoimento logo após a prisão, no dia 29 de março, Fonseca alegou que agiu em legítima defesa. Ele afirmou que os dois estavam tendo uma briga e Laila teria partido para cima dele com uma espada. Em relação aos dedos da vítima, o homem disse que ela segurou a lâmina da espada e se autolesionou.
— Mas a perícia indica que foi um ferimento provocado por instrumento cortocontundente, ou seja, que houve pressão, força, pra esses cortes — explica a delegada.
Nas redes sociais, o homem mantinha hábitos incomuns. Fonseca teria criado a própria religião, se intitulava "mestre bruxo" e "especialista em destruição e vingança", oferecendo trabalhos para "drenar as energias do seu inimigo". Segundo informações de familiares, o homem teria começado a estudar ocultismo e satanismo aos 15 anos e criado, depois, uma religião própria.
Nas redes, ele se apresenta como Victor Samedi, "mestre bruxo em necromancia" — prática que promove um suposto contato com mortos —, e vendia trabalhos espirituais. Com um deles, chamado "ritual Portal da Fortuna", prometia que a pessoa ficaria rica "em 66 dias". Em uma das imagens publicadas em seu perfil, aparece sentado em uma poltrona vermelha, com um cetro em uma das mãos.
Fonseca morava sozinho em uma casa no terreno do pai, onde também fica uma residência de outros familiares. Na de Fonseca, a polícia encontrou um cenário construído para os supostos rituais, com diferentes facas, espadas, espécies de machados, castiçal, caveira, estátuas e máscaras com aspectos demoníacos e chifres.
A polícia, no entanto, descarta que Laila tenha sido vítima de algum tipo de ritual. A morte ocorreu, segundo ela, por questão de gênero.
Violência psicológica
Segundo a investigação, agressor e vítima se conheceram pela internet e mantinham relacionamento a distância. A jovem morava em Parauapebas e estava na Capital visitando o homem desde meados de fevereiro. Seria a primeira vez que os dois se encontravam pessoalmente. Laila voltaria para sua cidade natal no dia 29 de março, mas foi morta antes disso.
Durante a estadia dela em sua casa, Fonseca teria se mostrado ciumento e apresentou comportamento controlador e abusivo com a vítima. Por isso, o homem também foi indiciado por violência psicológica contra a jovem.
— Essa violência foi demonstrada pelos relatos das testemunhas ouvidas em Parauapebas, que também juntaram prints de conversas com a vítima em que ela demonstrava medo e também um controle praticado pelo agressor. Ela tinha muitas limitações, por exemplo, para falar ao telefone. Só fazia chamadas de vídeo com a mãe sem mostrar o rosto, de costas. Desligava com pressa avisando que ele estava se aproximando. Em mensagens que ela mandou, ela afirmou que o homem já havia verbalizado que não gostava do comportamento dela, demonstrando uma tentativa de controle sobre a vítima. A maioria das testemunhas do bairro relatou que só a viam acompanhada, com ele ou familiares dele.
A delegada Cristiane afirma que a vítima pode não ter procurado autoridades por medo de Fonseca ou por acreditar que a violência não iria evoluir:
— Ela possivelmente acreditava que logo voltaria para casa, que ele não faria nada mais grave com ela.
Conforme a investigação, Fonseca costumava receber em casa jovens de outros Estados para passar temporadas. A polícia diz não ter recebido denúncias de mulheres que possam ter sido vítimas de agressão por parte do homem.
Fonseca era monitorado por tornozeleira eletrônica desde janeiro, após ser condenado por uma tripla tentativa de homicídio em Porto Alegre. A condenação, que saiu neste ano, se refere a um caso de 2007, em que Fonseca atirou contra três pessoas, sendo dois policiais militares. Na época do crime, ele chegou a ficar preso por cerca de 40 dias, e desde então respondia ao processo em liberdade.
Após o crime, na noite de sábado, ele conseguiu romper o dispositivo e desativar o sinal de monitoramento. Ele foi preso na quarta-feira seguinte, perto da residência onde morava, na Zona Leste, e permanece detido.
Contraponto
GZH entrou em contato com a defesa de Fonseca, e aguarda posicionamento.
Em uma nota enviada no dia 27 de março, o advogado Jean Maicon Krause afirmou que o cliente não praticou os atos da forma que vêm sendo divulgados, negando qualquer motivação religiosa.