Nos últimos meses, Thiele Sallete Molina, 30 anos, vinha se redescobrindo. Depois de sair de um relacionamento de 10 anos, ela embarcou em uma nova fase, em que o foco era cuidar de si e das filhas, gêmeas de três anos. Essa etapa, no entanto, foi interrompida na última terça-feira (16), quando a mulher foi morta com três disparos efetuados pelo ex-companheiro, o médico Wilson Roos Junior, 64 anos, pai das crianças. O homem foi preso em flagrante e o caso é investigado pela Polícia Civil.
Na ação, Rodrigo Falcão, 38, também foi baleado e assassinado por Roos. A vítima era major do Exército e estava conhecendo Thiele. O crime ocorreu na casa onde a mulher morava com as crianças, que, naquela noite, estavam na residência, mas não ficaram feridas.
A defesa do médico, que é cirurgião gastroenteorologista, afirmou, em nota, que só irá se manifestar nos autos do processo (confira abaixo).
Segundo pessoas próximas a Thiele, Roos não aceitava o fim do relacionamento – os dois estavam separados desde o fim do ano passado, e o médico já não morava na mesma casa em que a ex-companheira e as filhas. Mas seguia procurando Thiele, supostamente tentando reatar o relacionamento, conforme parentes da vítima.
Enquanto isso, a mulher investia em outra fase: focada em buscar um espaço na profissão, trabalhava como consultora, produzindo conteúdo nas redes sociais para orientar mães sobre a chegada do recém-nascido e demais desafios da maternidade.
— As meninas eram a vida dela. Ela trabalhava mais pelas redes sociais, então, ficava de casa, conseguia se dedicar bastante às filhas. Ultimamente, estava querendo focar mais no trabalho, chegou a me perguntar se eu sabia de alguma vaga de emprego. Isso ainda antes de se separar. Era cheia de sonhos — conta Julianne Marçal Munhoz, 42 anos, dinda das crianças e cunhada de Thiele.
Thiele já havia perdido a maior parte dos parentes próximos — ela tinha um irmão gêmeo, que é vivo. O pai faleceu quando ela tinha três anos, em um incêndio. O irmão mais velho, que era casado com Julianne, perdeu a vida em um acidente de trânsito, em 2005. A mãe morreu em março deste ano, após luta contra o câncer. Segundo a polícia, as duas filhas da vítima estão com a família materna.
Segundo Julianne, ela e Thiele nunca perderam o contato. A madrinha conta que costumava visitar as crianças e passear com elas e com a cunhada. E lembra a luta da mulher para ser mãe. Após algumas tentativas de inseminação artificial, a "gringa", como era chamada, teve as gêmeas em 2019:
— Ela sempre teve o sonho de ser mãe, era algo muito importante para ela. Tanto que o trabalho que ela desenvolvia também era relacionado a esse universo de maternidade e infância.
Tentativas de separação
Ainda conforme Julianne, Thiele vinha tentando se separar de Roos desde a metade do ano passado, e chegou a reatar o relacionamento algumas vezes, por insistência do médico.
— Depois que perdeu a mãe, ela ficou muito fragilizada. Tentou algumas vezes manter o relacionamento, ia dando chances, porque entendia que a presença do pai era importante para as filhas. Mas o vínculo entre eles foi mudando ao longo do tempo, muito em razão da bebida. Ele vinha bebendo muito, ela comentava que ele não dava atenção à família, que fazia ameaças em casa. Teve um episódio em que ele apontou uma arma para ela dentro de casa, mas ela acreditava que ele não seria capaz de fazer o que fez — relata a cunhada.
Segundo a polícia, não há boletins de ocorrência feitas pela vítima contra o médico, nem pedido de medida protetiva. Julianne afirma que a parente acreditava que "tudo iria se resolver":
— Ela tinha esperança de que ele entenderia a separação e deixaria ela seguir a vida. Dizia isso a todo momento. Era o pai das filhas dela, nunca achou que chegaria a isso. Ele não queria que ela tivesse nenhuma outra pessoa além dele. Não aceitava que ela não estivesse com ele. Ele viu que ela estava se tornando independente.
Julianne afirma ainda que Thiele tinha receio de pedir ajuda por "saber que o marido era um médico respeitado na cidade":
— Infelizmente, é muito difícil para as mulheres reunirem força suficiente para sair de relacionamentos assim. Mas a gente tem o direito de escolher viver do jeito que for, e isso deve ser respeitado. Nenhum homem tem o direito de fazer o que ele fazia em casa, nem de tirar a vida dela. A gente vê uma Justiça muito falha, mas espera que ele pague pelo que fez.
Investigação
Segundo a Polícia Civil, o inquérito deve ser concluído na sexta-feira (26), quando se encerra o prazo legal para o trabalho. Roos deve responder por dois homicídios, sendo um deles qualificado como feminicídio. O homem foi preso em flagrante, horas após o crime, e a prisão foi convertida em preventiva.
Em depoimento, ele admitiu ter matado as duas vítimas. Afirmou que foi até a casa da ex para ver as filhas e que, no local, houve uma discussão entre ele e Thiele. Falcão interferiu, segundo Roos, que, então, sacou a pistola 380 e atirou, atingindo cada vítima com três disparos. O militar morreu no local. A mulher chegou a ser levada ao hospital de São Gabriel e passou por cirurgia, mas morreu na madrugada de quarta-feira (17).
Roos fugiu da cena do crime, mas foi localizado e preso. A arma usada na ação foi apreendida e, segundo o delegado Fabrício Lima Ferreira, foi obtida de forma regular pelo médico, que, no entanto, não tinha autorização para transitar com ela fora de casa. Roos também teria outras armas além da utilizada no assassinato.
O delegado Ferreira ressalta que testemunhas ainda estão sendo ouvidas e evita divulgar detalhes para não prejudicar o trabalho.
Contraponto
A defesa do médico, feita pelo advogado Ezequiel Vetoretti e demais sócios, afirmou em nota que, "em respeito à autoridade policial que conduz as investigações, ao Juízo e às partes", irá se manifestar apenas nos autos, "por ora".