Deverá ser julgado nesta terça-feira (17) pelo Tribunal de Justiça o habeas corpus que pede perícia em um áudio do caso Rafael. A defesa da ré, Alexandra Salete Dougokenski, 34 anos, quer que a gravação seja analisada pelo Instituto-Geral de Perícias (IGP). O conteúdo, extraído do celular do pai de Rafael Mateus Winques, menino assassinado aos 11 anos, esteve no centro do impasse que levou ao cancelamento do julgamento da mãe no fim de março em Planalto. O crime completa dois anos neste fim de semana.
Na gravação de poucos segundos é possível ouvir a fala de uma criança — a defesa de Alexandra sustenta que o áudio é do menino. Uma perícia particular já foi realizada a pedido dos advogados e indicou que a voz possui semelhanças com a de Rafael. O Ministério Público (MP), por outro lado, fez análise técnica e sustenta que esse é um áudio compartilhado com o pai do garoto. Portanto, não haveria relevância se a voz é ou não de Rafael.
O impasse se deu porque a gravação foi extraída com data de 15 de maio de 2020 às 20h33min e, segundo a acusação, o garoto foi assassinado pela mãe entre 23h de 14 de maio de 2020 e o início daquela madrugada. A partir disso, a defesa da ré passou a sustentar que era essencial a perícia para comprovar se a voz é ou não de Rafael. Como o pedido não foi atendido, os advogados se retiraram do plenário após 11 minutos do início da sessão e o julgamento foi cancelado.
Em 25 de março, os advogados da ré ingressaram com habeas corpus contra a decisão da magistrada Marilene Campagna, de Planalto. Três dias depois, o desembargador José Antônio Cidade Pitrez, da 2ª Câmara Criminal, manteve a decisão da juíza de forma liminar. Em 25 de abril, o habeas chegou a entrar na pauta, mas seu julgamento foi adiado. Agora, a expectativa é de que haja decisão dos desembargadores. A defesa terá direito a 10 minutos para apresentar seus argumentos. A sessão terá início às 14h, mas não há horário definido para o julgamento do caso — depende do andamento da pauta.
— Espero que o tribunal mande esse processo para a perícia. Vamos periciar voz, vamos periciar celulares. O IGP, que é um órgão isento. Vamos perder aí mais 30 ou 60 dias, mas ao menos vamos ter uma prova segura do que realmente aconteceu. Essa é nossa esperança, de que seja produzida essa prova, que é muito importante — sustenta o advogado Jean Severo, um dos responsáveis pela defesa da ré.
Do outro lado, o MP espera que os desembargadores também neguem a perícia, já que entende que isso só arrastaria o processo e que já está esclarecido que o áudio foi apenas compartilhado com o pai, justamente após o desaparecimento do garoto. Caso isso aconteça, a acusação deve pedir à juíza que marque a nova data do júri. A magistrada já sinalizou em decisões anteriores que pretendia aguardar a decisão do TJ para agendar o julgamento.
— Esperamos que o júri possa ocorrer ainda neste semestre ou, no mais tardar, no começo do próximo, por uma questão de logística e organização. Estamos preparados para o que vier. Temos muita certeza do que tem no processo, de todas as provas que apontam para a Alexandra como a autora da morte do Rafael — afirma a promotora Michele Dumke Kufner.
Outras decisões
Com base no parecer da perícia particular, a defesa de Alexandra pediu à Justiça que a ré seja colocada em liberdade. Essa solicitação foi encaminhada à juíza Marilene Campagna, responsável pela comarca de Planalto.
— É fato que dia 15 de maio, às 20h33min, o menino estava mandando áudio ou o pai estava encaminhando áudio junto ao menino. Então alguma coisa está muito errada — afirma Severo.
O MP já se manifestou contrário ao pedido da defesa, que ainda precisa ser analisado pela magistrada. A promotora sustenta que Rodrigo Winques, pai de Rafael, chegou a ser investigado na época e que todas as provas colhidas apontam que ele não possui envolvimento com o sumiço.
— É um áudio comprovadamente encaminhado ao celular do pai do Rafael. Não é um áudio criado no celular do pai. E muito menos criado pelo Rafael no dia 15 porque ele já estava morto. Desde que o Rafael foi dado como desaparecido, no dia 15, quem ficou com o celular dele foi a Alexandra. Com relação ao Rodrigo, temos provas dentro do processo que ele ficou em Bento Gonçalves (onde morava) e na região durante toda a semana que antecedeu o dia 15 e no dia 15. Ele só saiu dia 16 pela parte da manhã. Temos todo o registro do deslocamento dele até Planalto — argumenta a promotora.
A defesa, por outro lado, quer que sejam abertas novas investigações do caso, para apurar o possível envolvimento do pai no desaparecimento e morte de Rafael.
Dois anos
Em 15 de maio de 2020, Alexandra procurou o Conselho Tutelar de Planalto, afirmando que o filho caçula havia desaparecido de casa durante a madrugada. No mesmo dia, a mulher registrou na Polícia Civil o sumiço do garoto. O caso mobilizou a comunidade e buscas passaram a ser realizadas.
Dez dias após o registro, em 25 de maio de 2020, a mãe admitiu à polícia que havia medicado o filho com um sedativo e que isso tinha causado sua morte. Naquele mesmo dia, ela indicou o local onde estava escondido o corpo do menino: uma caixa de papelão na garagem de uma casa a poucos metros de onde Rafael tinha vivido com a mãe e o irmão mais velho.
Após ser presa, Alexandra apresentou outras versões para o crime, que chegou a passar por reconstituição. Em uma delas, a mulher relatou ter asfixiado o menino com uma corda de varal após se irritar com o fato de que ele não parava de usar o celular — essa versão foi contestada pela defesa, que alegou que a cliente foi coagida. A perícia apontou que Rafael foi mesmo estrangulado com uma corda.
Em seu último relato, durante audiência na Justiça, Alexandra acusou o ex-marido, pai de Rafael, de ter matado o filho. Em todas as versões, ela mesma indica que a morte teria acontecido entre a noite de 14 de maio e o início da madrugada seguinte. A defesa alega que ela tinha medo do ex e, por isso, não teria relatado a verdade.