A Polícia Civil de Santa Maria concluiu o inquérito da Operação Casa das Ilusões, deflagrada em setembro de 2020, e que apurou irregularidades na ONG Casa Maria, que auxilia pessoas em tratamento contra o câncer no município da Região Central. Ao todo, 20 pessoas foram indiciadas.
Os principais investigados no inquérito são o casal que administrava a entidade e uma assistente social do local. A filha do casal também foi indiciada. Os crimes apontados são associação criminosa, falsidade ideológica, estelionato, furto e apropriação indébita.
Além deles, 16 pessoas que recolhiam doações para a entidade — os chamados mensageiros da ONG —foram indiciados por apropriação indébita.
Conforme o delegado regional da Polícia Civil, Sandro Meinerz, o inquérito conta com mais de 30 mil documentos. Segundo ele, ao longo da investigação foram constatadas divergências entre os registros de controle da ONG e os de contabilidade. Os valores desviados ultrapassariam os R$ 3 milhões. De acordo com Meinerz, o casal de administradores da Casa Maria agia como se fosse proprietário da entidade.
— Os administradores, o objetivo deles, era proveito pessoal. Eles usavam o dinheiro da ONG. Usavam para pagar viagens, locar veículos, comprar comida para a residência, plano de saúde para a família. A ONG era como se fosse deles, como se fosse uma empresa deles — destaca o delegado.
Uma filha do casal também foi indiciada porque, segundo a investigação, ela tinha vínculo formal com a ONG, recebendo salários e benefícios, mas não trabalhava efetivamente no local.
— Tinha uma falsa relação laboral. Ela era funcionária, mas na verdade nunca trabalhou lá, enquanto tinha uma loja em um shopping, mas recebia salário mensalmente da ONG e todos os direitos correlatos a uma relação de trabalho — explica Meinerz.
A assistente social foi indiciada também porque, assim como os administradores, a investigação apontou que ela usufruía da estrutura da ONG. Além disso, ela era responsável por criar campanhas, algumas falsas, para arrecadar doações, conforme explica o delegado.
— Ela que montava as campanhas. Eles pediam dinheiro em alguns lugares até usando pessoas que já tinham morrido. Normalmente eles usavam histórias tristes, que eram narradas pelas funcionárias de telemarketing, de crianças que estavam morrendo, que tinham graves problemas e precisavam de assistência. Só que numa dessas campanhas, a criança havia morrido e foi uma das primeiras denúncias que recebemos — relata Meinerz.
Após a deflagração da Operação Casa das Ilusões os 16 responsáveis por recolher as doações não repassaram à ONG os valores recolhidos.
— Quando fizemos a operação eles estavam de posse desses valores e nunca mais prestaram contas para a ONG. A posse era legítima, mas eles tinham que prestar contas e não prestaram. E quando foram chamados, ninguém trouxe um comprovante de que devolveram o dinheiro. Uns admitiram que tinham gastado, outros admitiram que tinham pegado. Outros disseram que mandaram para a ONG, mas não tinham como comprovar — detalha Meinerz.
O casal e a assistente social estão afastados das funções desde setembro de 2020, quando a Polícia Civil cumpriu mandados de busca e apreensão. Eles também tiveram bens sequestrados, como veículos e imóveis, e também bloqueio de contas.
Os nomes dos indiciados não foram divulgados pela Polícia Civil.
Por meio de nota, o escritório Cipriani, Seligman de Menezes e Puerari, que representa o casal, se manifestou sobre o indiciamento e disse que causou "imensa surpresa" a conclusão da investigação se tornar público antes de os advogados tomarem conhecimento. A defesa alega que insiste, há meses, pelo encerramento da investigação. Os advogados do casal dizem que vão examinar os detalhes do inquérito para depois comentar o caso, mas estão seguros da inocência de seus clientes.
Leia a nota da defesa na íntegra
"Tomamos conhecimento hoje de manhã, pouco antes dos primeiros contatos da imprensa, da finalização do inquérito policial decorrente da Operação Casa das Ilusões. Causou-nos imensa surpresa o fato de as conclusões da polícia terem se tornado públicas antes mesmo que pudéssemos ter acesso a elas. Isso depois de meses de insistência por parte da defesa para que as investigações fossem encerradas, considerando-se que tramitavam há mais de três anos.
Essa mesma polícia que vinha insistentemente descumprindo determinações judiciais para finalizar seu trabalho, agora, tem pressa em apresentá-lo aos jornalistas antes mesmo de cumprir mais uma determinação judicial.
Vamos examinar cuidadosamente os detalhes da investigação para nos pronunciarmos acerca do resultado dela. Mas estamos, como há três anos, seguros da inocência de nossos clientes que, enfim, poderá restar comprovada.
Escritório Cipriani, Seligman de Menezes e Puerari, que representa os donos da Casa Maria"