Apreendida nesta semana em uma operação da Polícia Civil e Receita Federal em Porto Alegre, a substância conhecida como tetracaína pode ser mais potente que a lidocaína, outro aditivo usado tradicionalmente na mistura com a cocaína. Também pode provocar intoxicação e, dependendo da quantidade ingerida, levar a morte. O produto é usado por traficantes para aumentar o volume da cocaína.
Na Medicina, a tetracaína é utilizada como anestésico tópico. O produto costuma chegar ao consumidor na forma de pomadas, e a versão em pó é mais utilizada por indústrias, que produzem os medicamentos.
Em razão da grande quantidade apreendida na última quarta-feira (24) — 1,6 tonelada —, o titular da 3ª Delegacia do Departamento de Investigações do Narcotráfico (Denarc), delegado Alencar Carraro, afirma que a polícia investiga se a substância seria utilizada somente para o tráfico:
— O que sabemos é que se trata de um grande e organizado esquema criminoso. Ainda iremos investigar se esse produto seria usado somente na preparação de drogas ou se também pode ter outras aplicações. Não é um produto muito comum aqui no Estado. Como ele é um fármaco, pode ser utilizado na medicina também, de maneira clandestina, por exemplo.
Carraro estima que a venda da tetracaína esteja orçada em R$ 3,5 mil o quilo, enquanto a cocaína, quando comprada em grande escala, pode custar R$ 30 mil o quilo.
A substância apreendida foi analisada pelo Instituto-Geral de Perícias (IGP), e a equipe responsável pelo trabalho ressaltou que o produto vem aparecendo com mais frequência nos últimos dois anos no Estado. Conforme os peritos, dependendo da quantidade ingerida e das condições de saúde do usuário, a tetracaína pode ser mais tóxica que a lidocaína, que também tem efeito anestésico, segundo o instituto.
Conforme a perita Bruna Gauer, uma das profissionais que atuou no laudo da carga apreendida, o uso da cocaína é feito, em geral, em doses baixas, para atingir o efeito estimulante da droga, "que deixa a pessoa mais enérgica, extrovertida".
— No entanto, quando a cocaína e a tetra são combinadas e ingeridas em altas doses, a tetra amplifica o efeito depressor do sistema nervoso central, causando um efeito inverso, em que a pessoa fica mais lenta, a respiração e os batimentos cardíacos vão caindo. Isso pode, em alguns casos, evoluir para um coma e até a morte.
Conforme o IGP, a comercialização da substância é controlada no Brasil.
— Se uma pessoa é pega com uma quantidade maior do que a de uma grama, já precisa justificar às autoridades, porque já é sabido que o produto é usado para alterar a cocaína — complementa Bruna.
Apreensão ocorreu na BR-448
A substância foi localizada escondida dentro de um caminhão que simulava transportar apenas sucata na BR-448, em Porto Alegre, nas proximidades da freeway. As autoridades estavam monitorando, nos últimos meses, uma rota rodoviária usada por traficantes entre a Fronteira Sul — provavelmente originária no Uruguai — a Região Metropolitana e, na última quarta, encontraram o produto. A polícia investiga se o destino final da carga seria o RS ou se iria para outro Estado. O motorista do caminhão foi preso em flagrante.
Segundo a polícia, o caminhão que transportava a tetracaína havia saído de Santana do Livramento e foi apreendido após a abordagem nesta semana, sendo encaminhado para perícia em busca de digitais. O anestésico em pó estava estava acondicionado dentro de sacos plásticos, separados em 150 caixas de papelão na caçamba do veículo. Carraro acredita que, após a mistura do fármaco com a droga, os traficantes poderiam produzir até 5 toneladas de cocaína.