A Câmara dos Deputados pretende votar ainda em março a flexibilização no Estatuto do Desarmamento, facilitando o acesso a armas de fogo no país. Na prática, está em jogo a retirada da exigência da “efetiva necessidade” de posse de armamento, condição que hoje precisa de aval de um delegado da Polícia Federal.
Em meio a um clamor popular por mais segurança pública, principalmente pela situação vivida no Rio de Janeiro, integrantes da bancada da bala e parlamentares desarmamentistas defendem as propostas em análise no Congresso.
Provável relator do projeto, o deputado Alberto Fraga (DEM-DF) salienta que a proposta deve ir a plenário após ser aprovado o Sistema Único de Segurança Pública (Susp), previsto para entrar na pauta da Câmara até o dia 20. Para o parlamentar, modificar a legislação é dar um “direito ao cidadão”.
— O referendo de 2005 decidiu que o cidadão tem direito a comprar arma, agora quem está tirando o direito é o delegado. Sou totalmente favorável (a mudanças no Estatuto) — observa o parlamentar.
Segundo Fraga, as discussões sobre mudanças no Estatuto do Desarmamento já se arrastam por dois anos. Mesmo assim, ainda não há consenso sobre alguns pontos, salienta o deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS), também integrante da bancada da bala:
— Na realidade, tem uma série de embates. O que emperra é que uns acham pouco o que a gente está aprovando e outros, demais. O que precisa é um ponto de equilíbrio — explica.
O porte é perigoso, tem de ser restrito a forças de segurança
POMPEO DE MATTOS
Deputado federal
Um grupo de políticos sustenta que o porte de armas (andar com revólver) também deveria ser revisto. Com isso, seria possível andar armado, o que hoje é restrito às Forças Armadas e polícias. Fraga e Mattos defendem apenas modificações na posse (ter arma em casa), sem circular nas ruas.
—O porte é perigoso, tem de ser restrito a forças de segurança. Defendo a posse, desde que tenha autorização – observa Pompeo.
Para o pedetista, a arma é como um carro e, para se poder usar, é preciso habilitação, por meio de um curso. O deputado acredita que é necessário, no mínimo, 10 horas de práticas de tiro, além da formação teórica. Pompeo ainda entende que, com boa formação, é possível evitar riscos de acidentes, caso a flexibilização seja aprovada.
— Não temos de coibir o acesso às armas, mas prevenir – afirma.
Diferentemente de outros parlamentares da bancada da bala, Alceu Moreira (PMDB) defende mudanças no porte e transporte de armas.
Defendo a arma para autodefesa. Como instrumento de agressão, inadmissível.
ALCEU MOREIRA
Deputado federal
Para ele, é preciso legislação “rígida”, mas mais disciplinar do que burocrática.
— Defendo a arma para autodefesa. Como instrumento de agressão, inadmissível. Para no caso de um roubo, o assaltante saber que naquela casa tem arma – argumenta.Moreira observa que as regras atuais para a concessão de uso de armas para moradores de áreas rurais são “complicadas” e caras:– O grau de burocracia é tão grande que fica inviável fazer a renovação. É preciso mostrar a capacidade técnica de três em três anos.
“Há vários interesses em jogo”, diz parlamentar
Contrário à proposta de flexibilização do Estatuto, o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) entende que, por trás do discurso de “mais armas”, há interesses financeiros escondidos.
— Interesses da indústria das armas, dos próprios cursos de tiro. Há vários interesses em jogo, nenhum de pacificação possível. Mahatma Gandhi já dizia uma coisa: na linha do olho por olho, todos estariam cegos — observa o político.
Para o deputado fluminense, a mudança na legislação pode gerar aumento das mortes no país, devido à presença maior de armas com civis, e ainda com criminosos.
– Se um policial, que é treinado, acaba morto quando é surpreendido, imagina um cidadão – compara o deputado.
Para o deputado Paulo Pimenta (PT-RS), mudanças no Estatuto do Desarmamento não deveriam ser votadas. De acordo com o parlamentar, a população já se manifestou contra o acesso maior às armas no referendo de 2005.
– Não existe nenhum profissional respeitado na segurança pública, estudo ou experiência no mundo que mostre que acesso maior às armas pode reduzir a criminalidade – salienta o petista.
Chico Alencar complementa:
– É, na verdade, uma descrença total do Estado como monopólio da segurança pública. Aprovar uma medida dessas é desacreditar em políticas públicas de segurança, entregar o indivíduo à própria segurança.
Detalhe GaúchaZH
Para se ter uma arma hoje, é preciso preencher quatro requisitos:
1) Ausência de antecedentes criminais ou não estar respondendo processos ou inquéritos.
2) Residência fixa.
3) Apresentar comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica.
4*) Exigência de “efetiva necessidade” atestada por um delegado da PF.
*Caso seja aprovada a proposta de flexibilização, não será mais preciso aval de um delegado da PF.