Débora Saueressig (*)
Os inúmeros dados, pesquisas e estudos não deixam dúvidas: estamos adoecidas mental, física e emocionalmente. Nós, mães de crianças atípicas. E isso tem impactos familiares, lógico, mas também sociais, culturais e econômicos.
O nível de estresse experimentado por mães de pessoas com TEA (Transtorno do Espectro do Autismo), por exemplo, assemelha-se ao estresse crônico apresentado por soldados combatentes, segundo um estudo feito com famílias norte-americanas e divulgado no Journal of Autism and Developmental Disorders. Um outro estudo, conduzido pela Universidade da Califórnia e publicado na Revista Family Process, mostrou que as taxas de depressão em mães de crianças autistas eram absurdamente altas: enquanto 50% delas apresentavam níveis elevados de sintomas depressivos durante um período de 18 meses, esse número estava entre 6% e 13% para mães cujos filhos tinham desenvolvimento típico.
O que isso nos sinaliza? A urgência e importância do debate.
Enquanto as esferas governamentais (principalmente, das áreas da educação, assistência social e saúde) não oferecerem políticas efetivas, comunitárias, democráticas e acessíveis para temas como: autismo, depressão, prevenção ao suicídio, neurodivergência, transtorno de ansiedade generalizada, transtorno maníaco depressivo, transtorno bipolar, exaustão crônica, deficiências (na infância, adolescência e VIDA ADULTA), doenças raras, INCLUSÃO, burnout, pânico, AUTOCUIDADO e seguirem colocando todas as nossas mazelas (físicas, sociais, psíquicas e emocionais) na conta dos chiliques, das frescuras, dos nervos e da AUSÊNCIA DE GARRA, LUTA, AMOR e entendimento de meritocracia (lute mais e mais e mais), não sairemos da lama. Nós, sociedade. Você, inclusive.
O adoecimento das mães de crianças ATÍPICAS, e este é meu lugar de fala e vivência, é responsabilidade do posto de saúde que nega o remédio para pressão alta da mãe e para o transtorno de sono do filho.
Do médico que atrasa, não atende e não desmarca com antecedência.
Do PROFISSIONAL DE SAÚDE que se furta a ouvir a história familiar do paciente, certamente balizadora de um prognóstico, porque não tem tempo e a vida é isso aí mesmo, uma correria danada.
É responsabilidade dos planos de saúde que de uma hora para outra, sem qualquer tipo de legalidade ou explicação plausível, suspendem os atendimentos multidisciplinares, ou alteram as regras, ou transferem os pacientes, esquecendo qualquer tipo de contrato ou vínculo feito entre a criança e os profissionais.
É responsabilidade da ESCOLA que nega vaga ou que aceita, mas fecha a porta na cara da mãe porque lá vem ela, de novo, cobrar. Inquirir. Requisitar. Procurar respostas. Da mesma ESCOLA que dificulta a presença de um monitor (ou assistente terapêutico) especializado porque: ah, veja só, ele não aprende nada igual, que insistência dessa mulher!
O adoecimento das mães de crianças atípicas é a sintomatologia de um ESTADO que demora meses ou anos na entrega de um laudo, impossibilitando o início da intervenção. Da dificuldade imposta pelos trâmites do INSS na confecção da avaliação social e médica para o Benefício Assistencial à Pessoa com Deficiência (BPC/LOAS) e assim eu poderia aqui seguir “ad eternum” porque a lista de tribulações é infindável e ainda que possa não estar ao alcance dos seus olhos, da sua poltrona, do seu café da manhã ou da sua família ELA EXISTE e devora vidas inteiras.
O que adoece as mães das crianças ATÍPICAS não são os filhos, é o sistema.
(*) Jornalista e mãe do Theodoro (típico) e do Benjamin (autista)