Nesta semana, a morte da modelo, jornalista e influenciadora Lygia Fazio, aos 40 anos, após complicações causadas pelo uso de silicone industrial e polimetilmetacrilato, chamou a atenção para os riscos do uso indevido de determinadas substâncias para fins estéticos. Em 2022, Lygia ficou mais de cem dias internada para tentar remover os produtos que haviam sido aplicados em seus glúteos e se espalhado por todo o corpo, desencadeando infecções.
O polimetilmetacrilato, também chamado pela sigla PMMA, é um produto sintético, um polímero, explica o cirurgião plástico da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, Michel Pavelecini, que é membro da Diretoria da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, regional do Rio Grande do Sul (SBCP-RS). A substância é utilizada pela cirurgia plástica e por outras áreas médicas, como a ortopedia, servindo como uma espécie de “cimento ortopédico” em procedimentos relacionados a próteses ortopédicas.
De acordo com o especialista, na plástica, o produto na forma de gel é injetado no plano subcutâneo, logo abaixo da pele, acima da musculatura, para aumentar o volume de determinadas áreas do corpo que tenham deformidades pela ausência de gordura. No entanto, a substância tem autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) apenas para aplicações específicas:
- Correção de lipodistrofia (alterações na camada de gordura que levam a sua concentração em algumas partes do corpo) provocada pelo uso de antirretrovirais em portadores do vírus HIV.
- Correção volumétrica facial e corporal, que é uma forma de tratar alterações, como irregularidades e depressões no corpo, fazendo o preenchimento em áreas afetadas por meio de bioplastia.
Em nota publicada em junho de 2022, a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica ressalta que o uso do PMMA fora das recomendações é “extremamente perigoso”, podendo causar complicações. Por isso, não recomenda sua utilização para fins estéticos.
— Uma coisa é ter um afundamento no glúteo e precisar de uma cirurgia corretiva, outra diferente é ter glúteos de formato normal e decidir aumentar. Aumentar as maçãs do rosto apenas por desejo, sem deformidade e sem sequelas de traumatismo, também é uma finalidade estética — esclarece Pavelecini.
O especialista destaca que há outros produtos liberados para fins estéticos, como o ácido hialurônico. A diferença é que o PMMA não é absorvível, ou seja, o organismo não o elimina naturalmente — o que representa um grande problema, conforme o cirurgião plástico:
— Enquanto o ácido hialurônico é absorvível, então terá um tempo de permanência no organismo e será eliminado, o PMMA não é. Então, ele vai ficar eternamente no local em que foi injetado e, se tiver algum problema, será de difícil resolução. Por isso, pensamos que ele deve ser aplicado somente em quem realmente precisa. Fora disso, é uso indevido.
Entenda os riscos
Pavelecini aponta que as complicações do polimetilmetacrilato podem ser classificadas de duas formas: agudos e crônicos. Entre os agudos, que ocorrem logo após a aplicação, está a embolia vascular. Segundo o especialista, o produto pode ser indevidamente injetado em um vaso e obstruí-lo, o que deixará uma área sem o devido suprimento sanguíneo.
— Já foram descritos casos de cegueira por injeção do produto em uma área próxima aos olhos, por exemplo. Além disso, como extensão da embolia, pode haver necrose da pele da área em que faltou circulação de sangue. Reações alérgicas e infecções também estão entre as complicações mais comuns — explica.
Outro ponto preocupante é que, se um grande volume do PMMA for injetado em um glúteo e atingir uma veia, por exemplo, a substância pode ser transportada para outras partes do corpo, causando uma embolia a distância. Nesses cenários, já foram descritos casos de acidente vascular cerebral (AVC), aponta Pavelecini.
Já entre os riscos crônicos, pode haver a formação de granulomas, que representam uma tentativa do organismo de englobar e separar aquela substância, como forma de eliminá-la. Da mesma forma, a pessoa também pode desenvolver uma reação inflamatória crônica, com dor, vermelhidão e, por vezes, secreção.
— Se a pessoa injeta esse produto no lábio e o organismo tenta eliminá-lo, passando a formar nódulos endurecidos, pode gerar complicações estéticas graves, como deformidades nos lábios. Isso porque o PMMA não vai sair dali e, para tirar, tem que remover tecidos saudáveis. Às vezes, tem que tirar um pedaço do lábio. Não tem um antídoto e nem uma medicação para dissolver a substância, a retirada é cirúrgica — alerta, comentando que, se o produto fosse aplicado nos glúteos, seria preciso remover toda a gordura da região, em caso de problemas.
Conforme Pavelecini, pessoas interessadas em realizar procedimentos estéticos devem tomar alguns cuidados, como procurar um profissional habilitado e especialista, buscar informações sobre o produto que será utilizado e questionar se a substância é absorvível, se é possível retirá-la e quais os riscos relacionados.