Depois de um ano e meio desvendando o coronavírus, a comunidade científica já acumula descobertas que permitem estabelecer diferenças de efetividade entre os cuidados preventivos que eram recomendados no início da crise sanitária e no momento atual.
A grande novidade entre os dois extremos temporais é campanha de vacinação — o que não habilita as pessoas a dispensarem os cuidados não farmacológicos, mesmo com o esquema vacinal completo (duas doses ou dose única, conforme o laboratório fabricante).
Em termos gerais, seguem válidas as mesmas recomendações, com mais atenção a determinados aspectos. A constatação de que a transmissão do coronavírus se dá muito mais pelo ar do que pelo contato com superfícies contaminadas ressalta quão fundamentais são o uso correto de máscara, a ventilação de ambientes e o distanciamento entre pessoas, mas não inutiliza o uso de álcool gel — que virou um quase sinônimo de protocolo inútil em memes que circulam pelas redes sociais.
Melissa Markoski, bióloga, doutora em Biologia Celular e Molecular e professora de Biossegurança da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), lembra que, no começo de 2020, acreditava-se que o sars-cov-2 agisse de forma muito semelhante ao H1N1, vírus causador da gripe e que também provocou uma pandemia. A onipresença dos frascos de álcool gel em locais públicos é, em parte, herança do aprendizado daquela época, mais de uma década atrás. A substância diminui a transmissão de agentes biológicos e ajuda no controle de infecção, prática fundamental em hospitais, por exemplo.
— Mas o coronavírus persiste muito mais em suspensão, com os aerossóis. Também se deposita em superfícies, mas o mais perigoso é o ar. Os vírus das gotículas em suspensão têm maior facilidade de penetrar nos nossos tecidos, conseguem chegar aos pulmões e à corrente sanguínea. A penetrância é maior — explica Melissa, também membro da Rede Análise Covid-19.
Há locais onde a limpeza das superfícies continua sendo fundamental. Em um restaurante, por exemplo, em que os ocupantes de uma mesa tiram as máscaras para ingerir alimentos e bebidas, além de conversar, é necessário limpar a área antes que os próximos clientes se acomodem.
— Se alguém está contaminado ali, deposita muitas gotículas contaminadas — detalha Melissa, lembrando de um alerta do Centers for Disease Control and Prevention (CDC), a agência nacional de saúde pública dos Estados Unidos. — No início do ano, o CDC publicou uma nota atentando para os aerossóis sem desmerecer os protocolos de limpeza de superfície — acrescenta.
Lavar as mãos após tocar em corrimãos, maçanetas, assentos de transporte coletivo e outros pontos onde há grande circulação de pessoas continua sendo uma medida válida. “Dar banho” nas compras do supermercado, por outro lado, deixou de ser tarefa imprescindível, como pontua a médica infectologista Andréa Dal Bó, membro da Sociedade Rio-Grandense de Infectologia.
— Não existe mais algo que corrobore esse tipo de medida. O vírus se inviabiliza (nessas superfícies). Do ponto de vista sanitário, se as pessoas quiserem manter essa medida, é saudável, pensando em bactérias que possam estar levando para casa — afirma Andréa, destacando que deixar os sapatos do lado de fora da casa, antes de entrar, também é um bom hábito de higiene.
Apesar da repetição exaustiva por parte de médicos e especialistas sérios e autoridades sanitárias, Andréa reforça um lembrete importante:
— Não existe ainda nenhuma medicação preventiva para a covid-19. Nem vitaminas, nem zinco, nem cloroquina, nem ivermectina.
Confira, a seguir, o detalhamento de quatro pontos essenciais para a prevenção da infecção pelo coronavírus, lembrando que tomar a vacina respeitando os intervalos em vigor entre as doses é o cuidado número um.
ALÉM DA VACINAÇÃO, O QUE FAZER PARA EVITAR A COVID-19
USO DE MÁSCARA
- Máscaras do tipo PFF2 ou N95: são as que mais protegem. Têm múltiplas camadas, poros menores e clipe nasal para melhor vedação. Os elásticos, presos atrás da cabeça e do pescoço, podem ser adequados para que o acessório cubra o nariz e a boca da melhor forma possível. Faça um teste depois de colocá-la: inspire e solte o ar para observar se há escapes. A médica infectologista Andréa Dal Bó indica que cada máscara pode ser usada por um turno único de 12 horas ou três turnos de quatro horas — depois, precisa ser descartada. Entre uma e outra utilização, acondicione-a em uma embalagem plástica ou de papel, deixando os elásticos para fora. Há especialistas que indicam um revezamento entre máscaras, respeitando-se um intervalo de alguns dias entre cada uso.
— Máscara cirúrgica: com camada tripla e clipe sobre o nariz, é a segunda melhor indicação, conforme a bióloga Melissa Markoski. Andréa recomenda que, se necessário (no caso de o acessório ser muito grande e ficar frouxo), faça-se um nó nos elásticos perto do tecido — a sobra do tecido deve ser colocada para dentro do acessório — e não atrás das orelhas.
— Máscara de tecido: deve ter três camadas (uma de poliéster entre duas de algodão) e pregas laterais, para dar maior amplitude. Também precisa ficar bem ajustada ao rosto, sem folgas ou áreas de escape.
—Combinação de duas máscaras: a infectologista Andréa salienta que a máscara de tecido colocada por cima da máscara cirúrgica oferece proteção quase equivalente à da máscara profissional.
— É fundamental não ficar tocando na máscara, o que a deixa suja e contaminada. Quando tiver que manipulá-la, higienize as mãos antes e depois.
— Tenha sempre em mente que a máscara só cumprirá o papel protetor tendo boa vedação permanentemente. Não adianta adquirir um estoque de máscaras PFF2 e não usá-las com plena vedação no rosto.
DISTANCIAMENTO E VENTILAÇÃO DE AMBIENTES
— Quanto melhor a qualidade da máscara, mais segura a pessoa estará ao conversar com alguém a 1,5 metro de distância, frisa Melissa Markoski. As gotículas expelidas serão contidas por essa barreira, e o que eventualmente escapar de aerossóis se dispersará antes de atingir o interlocutor. Quanto mais simples e menos eficiente o tipo de máscara, maior deverá ser o distanciamento e a ventilação do ambiente.
— O conceito de aglomeração pode dar a ideia de dezenas de indivíduos concentrados, mas um jantar que reúne dois ou três casais de amigos dentro de casa já pode configurar uma situação de grande risco. Melissa alerta para a importância do comportamento habitual de cada um: a pessoa com quem você vai se encontrar tem circulado sem restrições por diversos ambientes? Costuma frequentar restaurantes? São fatores que precisam ser considerados no momento de cogitar se encontrar com quem não mora na mesma casa.
— Andréa destaca que encontros de familiares e amigos não devem acontecer, mas, se ocorrerem, precisam ser ao ar livre ou em locais muito bem arejados. Evite almoços e jantares sem o distanciamento adequado. Pessoas que comem próximas umas das outras em locais abertos também se expõem ao risco de infecção. Membros de uma mesma família, que residem juntos, podem se alimentar perto uns dos outros.
— Abrir uma janela da sala, simplesmente, não torna o ambiente bem ventilado. É preciso ter fluxo de ar para uma renovação rápida. Abrir a janela que fica diante de uma porta, por exemplo, aumenta essa velocidade de circulação, mas essa renovação de ar ainda pode levar até 30 minutos, avisa Melissa.
— Aparelhos de ar-condicionado domésticos não proporcionam renovação de ar, apenas recirculação — ou seja, o mesmo ar viciado é jogado de dentro do equipamento para fora, ininterruptamente. Se apenas coabitantes estiverem na casa, sem problemas. Mas, quando se reunirem pessoas que não moram juntas, é preciso manter uma janela aberta.
— Ventilação em veículos de transporte público também é essencial. Peça ao motorista de táxi ou de aplicativo para abrir janelas opostas. Em ônibus e lotações, o ideal também é manter janelas abertas.
— Em escritórios onde há refeitório, copa ou cozinha para alimentação dos funcionários, deve-se estabelecer escalas para a utilização desses espaços. O fato de dois colegas trabalharem juntos diariamente não os torna seguros um para o outro. A máscara deve ser retirada somente no momento da ingestão de alimentos, o que deve ser feito distante dos demais. Ao comer, liberamos gotículas ao redor, e quem estiver infectado estará colocando os demais em risco.
— Uma reunião em que todos tiram as máscaras para tomar cafezinho já pode ser considerada uma aglomeração. Evite comer ou beber no ambiente de trabalho se não for estritamente necessário, buscando sempre lugares mais afastados dos demais colegas.
HIGIENIZAÇÃO DAS MÃOS
— A transmissão do coronavírus é menor por contato, mas acontece. Por isso, profissionais de saúde continuam vestindo aventais e luvas ao lidar com pacientes infectados.
— Mantenha as mãos limpas pelo maior período possível de tempo, lavando-as com água e sabonete ou aplicando álcool em gel, esfregando bem as palmas, o dorso e entre os dedos. Sem perceber, tocamos o rosto com frequência, o que pode comprometer a eficácia da máscara ou contaminar boca, nariz e olhos diretamente. Quanto mais limpas as mãos estiverem, menor o risco de contaminação, diz Melissa.
— Continua valendo a orientação de higienizar as mãos após tocar em maçanetas e corrimãos ou outros pontos onde várias pessoas encostam.