Correção: os casos da variante Delta do coronavírus no Rio Grande do Sul cresceram 7,5 vezes em cinco semanas, e não seis vezes, como publicado entre 18h12min e 21h35min de 19 de agosto de 2021. O texto já foi corrigido.
A despeito de ainda não predominar no Rio Grande do Sul, a variante Delta da covid-19, altamente transmissível, cresceu 7,5 vezes desde que foi detectada pela primeira vez em território gaúcho há cinco semanas, apontam sequenciamentos genéticos conduzidos pela Secretaria Estadual da Saúde (SES-RS).
Se, na semana entre 4 e 10 de julho, a nova cepa representava 2,38% de todas as amostras analisadas pelo Centro Estadual de Vigilância em Saúde, na primeira semana de agosto a Delta pulou para 17,92% de todos as coletas.
No Estado do Rio de Janeiro, a Delta representa hoje cerca de 60% dos casos sequenciados. Na capital carioca, a ocupação das Unidades de Terapia Intensiva (UTI) voltou aos 95% e a prefeitura chegou a reconhecer que a cidade é o epicentro da Delta no Brasil.
Ainda que a nova cepa tenha ganhado terreno nas últimas cinco semanas, o governo do Estado constata uma diferença em comparação à chegada da Delta em Israel, Estados Unidos e países da Europa, onde a variante domina hoje quase completamente o cenário: a conquista de terreno não ocorre na mesma velocidade.
Se, no Rio Grande do Sul, 17,92% das amostras analisadas são Delta na quinta semana, nos Estados Unidos e em Israel a variante representava, no mesmo período, 50% das amostras. No Reino Unido, isso ocorreu depois de quatro semanas. Os dados são do site CoVariants, mantido pela Universidade de Berna, na Suíça.
A provável explicação para isso é que, no Rio Grande do Sul, a Delta está “brigando” com a Gama, a variante originária de Manaus que também é bastante transmissível. Já os países citados tinham predomínio da variante Alfa (originária do Reino Unido), que é menos infecciosa do que a Delta e a Gama, observa Richard Salvato, responsável pela vigilância genômica do Centro Estadual de Vigilância em Saúde.
— A gente nota que a Delta tem tido dificuldade de predominar com a disputa com a Gama, mas tem conseguido se estabelecer lentamente. A principal hipótese é que aqui a Delta encontrou um ambiente não tão fácil quanto em outros países, uma vez que temos a variante Gama, também altamente transmissível. As duas disputam o espaço e, por isso, não sabemos dizer ainda qual vai predominar ou se as duas vão coexistir — afirma Salvato.
Saber qual das duas cepas vai vencer a briga ou se as duas coexistirão é a resposta que especialistas e autoridades aguardam – estudos em laboratório apontaram que a Delta é até 40% mais transmissível do que a Gama.
Salvato cogita que, se as duas variantes conviverem, é provável que a epidemia se mantenha como agora, graças ao avanço da vacinação – o Rio Grande do Sul tem 64,6% da população com uma dose e 31,3% com duas doses.
No entanto, caso a Delta ganhe a disputa contra a Gama, as hospitalizações podem aumentar, como já observam Distrito Federal e Rio de Janeiro. É por isso que a vacinação precisa avançar, sobretudo a cobertura de duas doses.
— Estamos no meio do processo: acompanhando a Delta crescer. Não foi tomada nenhuma decisão restritiva ou de alerta devido à não existência de mudança de indicadores. Tem-se notado uma estabilidade, a não ser nos surtos. Mas os dado são acompanhados diariamente pelo GT Saúde para embasar o Gabinete de Crise a tomar alguma decisão restritiva ou não — afirma o especialista em saúde da SES-RS.
Para Afonso Barth, coordenador do Laboratório de Biologia Molecular do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em ambos os cenários a epidemia pode piorar, mas não como em fevereiro, quando hospitais colapsaram.
— Não está tendo explosão de casos porque as pessoas se vacinaram. Quero crer que, se tiver uma piora, não será tão rápida como em fevereiro — diz.
Mas se a Gama também era predominante no Rio de Janeiro, por que lá a Delta já está causando estragos e aqui, não? Para Barth, uma das possíveis razões é que a nova variante chegou antes ao Rio de Janeiro, portanto os efeitos já são sentidos por lá.
Para além disso, ele cogita que o inverno gaúcho rigoroso das últimas semanas conclamou a população a se resguardar em casa de forma mais intimista e ter evitado novos contatos, ao contrário do Rio de Janeiro, com clima quente mais propício a encontros sociais.
— Tem a questão da redução do distanciamento social e relaxamento do uso de máscaras, que provavelmente diminuiu mais no Rio de Janeiro. Aqui no Rio Grande do Sul, apesar de existir, está mais devagar essa diminuição da restrição de contato social. E, no calor, as pessoas circulam mais ,enquanto que, no frio, ficam mais recolhidas. Isso pode simplesmente retardar o inicio da Delta aqui — afirma o microbiologista.
Delta é mais presente em algumas regiões
A despeito de a Delta estar presente em 17,92% das amostras analisadas pelo Estado, o predomínio é mais forte em determinadas regiões. O boletim mais recente do governo aponta que a maioria dos casos está na Região Metropolitana, no Vale dos Sinos e na Serra, em municípios como Porto Alegre, São Leopoldo, Gramado e Caxias do Sul.
O virologista Fernando Spilki, coordenador da Rede Corona-Ômica do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, observa que, na Região do Vale dos Sinos, a Delta já representa cerca de 25% de todas as amostras sequenciadas pela Universidade Feevale, onde é professor.
— Miramos em municípios em que havia possibilidade de ser Delta, então pode ter uma variação pela zona geográfica a ser analisada. Se pegarmos até três semanas atrás, vimos que flutuava entre 10 e 20%. Mas, de duas semanas para cá, e particularmente na última semana, a Delta avança. Ela chegou a 50% das amostras de Novo Hamburgo e de Garibaldi. No Estado do Rio, onde a Delta representa 60%, já temos cidades com ocupação de leitos de 100% — diz o virologista.
Ele destaca que agora é o momento para as autoridades investirem em rastrear quem teve contato com um caso confirmado de covid-19 e colocar essa pessoa em quarentena.
— Deveríamos aproveitar agora o declínio no número de casos e as estruturas de diagnóstico para também rastrear os indivíduos e os contatos para a quarentena. O distanciamento poderia evitar a disseminação da Delta - diz o virologista.
O secretário da Saúde de Porto Alegre, Mauro Sparta, confirmou em entrevista à Rádio Gaúcha nesta quinta-feira (19) que Porto Alegre tem transmissão comunitária da Delta. As medidas de enfrentamento à variante, disse, incluem maior agilidade na vacinação, aumento da testagem e manutenção dos protocolos sanitários.
O secretário da Saúde disse que a pasta está reforçando os protocolos sanitários e emitindo alertas para todos os hospitais da Capital, orientando que fiquem mais atentos e mantenham todas as medidas de prevenção, além de restringir as visitas aos pacientes.
Apesar da preocupação, Sparta ressaltou que a taxa de ocupação das unidades de terapia intensiva (UTIs) está mais baixa, o que “dá uma folga e é algo positivo” – a lotação é de 76%.