A vacinação dos moradores do Asilo Padre Cacique, em Porto Alegre, assim como dos funcionários da instituição, praticamente não alterou os protocolos contra a covid-19. Entre as ações que foram liberadas no estabelecimento há cerca de um mês, as consultas eletivas externas estavam entre as mais aguardadas.
Na volta do consultório médico, o morador precisa passar por uma higienização completa antes de ingressar no lar. Quem chega a ser internado em hospital tem um protocolo mais intenso no regresso: são cinco dias em isolamento e teste de covid-19 no último dia, para então voltar ao convívio no lar.
As visitas de familiares e amigos, com agendamento e distanciamento rígido, foram liberadas depois da troca da bandeira preta pela vermelha no antigo modelo de distanciamento controlado do Estado. Depois de dois meses sem qualquer contato externo, os moradores, sempre acompanhados de um funcionário, passaram a conversar com os visitantes a partir de uma janela do prédio.
Entre abril e dezembro de 2020, o Asilo Padre Cacique agendou 108 visitas pela janela e 407 chamadas de vídeo. Segundo a assistente social Rogéria Pazini, 101 idosos vivem no local. Destes, 30 são acamados, moram na enfermaria e não tiveram mais qualquer contato presencial com familiares desde o início da pandemia. Do restante, menos da metade recebe visitas.
Na segunda-feira passada (24), o aposentado Ubirajara Socias Villela, 76 anos, pôde rever a irmã gêmea, Iracema, e o marido dela, Joélio Corrêa, 79, depois de dois meses sem visitas. O sorriso de Ubirajara era tão largo que pôde ser notado mesmo atrás da máscara. Faceiro, fez questão de tirá-la rapidamente para mostrar à irmã uma novidade: o cavanhaque cultivado durante o período de distanciamento completo.
— Foi muito bom revê-lo depois de dois meses. Vi que ele engordou, está bem e alegre. Ele me disse que vai deixar o cabelo crescer — conta Iracema.
Morador do Padre Cacique desde setembro de 2019, Ubirajara tinha uma vida independente antes da pandemia. Nos finais de semana, por exemplo, visitava sempre a irmã e o cunhado. Desde o início do distanciamento, porém, precisou se manter isolado no asilo.
Como não podíamos vê-lo pessoalmente, a assistente social começou a fazer videochamadas para conversarmos. Mas, mesmo com estes contatos, percebi que ele está com mais dificuldades de memória.
IRACEMA VILLELA
Irmã gêmea de morador do Padre Cacique
A assistente social revela que o distanciamento acabou afetando diretamente os moradores da instituição. Segundo Rogéria, muitos dos que ainda saíam sozinhos antes da pandemia tiveram aceleração no processo de demência:
— Não tivemos casos de covid-19, mas o preço do isolamento é muito alto para eles. O que mais dói é não ter a presença dos voluntários, porque eles acabavam fazendo o papel de família para muitos dos moradores, que não costumam receber visitas de parentes.
“Guerra”
Sem bingo, baile, cinema, artesanato e salão de beleza semanais e com as ações voluntárias suspensas desde 15 de março do ano passado, os próprios funcionários intensificaram os trabalhos com os idosos. Mensalmente, o serviço social realiza atividades em grupos, e o fisioterapeuta repassa exercícios físicos três vezes por semana. Com a chegada de três cachorros, os moradores da enfermaria começaram a ter pet terapia.
— Temos hoje a atividade física, e eles estão vacinados contra a covid-19, mas estamos numa guerra para manter a saúde mental dos idosos — pontua Rogéria.