Depois de quase um ano praticamente isoladas para tentar evitar surtos de covid-19, as instituições de longa permanência de idosos estão recomeçando a abrir para receber visitantes. O início da vacinação contra a doença no Brasil, em janeiro deste ano, trouxe um fio de esperança à população idosa, considerada de alto de risco para contaminação.
Os indicadores da Secretaria Estadual da Saúde (SES) confirmam que, a partir da chegada da vacina, os casos confirmados e as mortes entre pessoas acima de 80 anos vêm caindo mês a mês. Em janeiro de 2021, foram 2.268 casos (2,63%) e 539 mortes (30,57%). Em maio, até o dia 28, são 1.073 casos (1,89%) e 303 mortes (13,68%). Entre as cinco faixas etárias, é a que tem maior queda nos dois índices.
Mesmo sem recomendação expressa – da SES e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) – de proibição de visitas a partir de março de 2020, quando a covid-19 foi considerada pandemia pela Organização Mundial da Saúde (OMS), a maior parte das instituições optou por manter o distanciamento entre moradores e familiares. Entre as orientações repassadas pela SES e pela Anvisa às casas geriátricas com relação a visitações estão a redução, ao máximo, do número de visitantes, assim como a frequência e a duração das visitas, a higienização das mãos logo na chegada e o uso constante de máscara.
Neste ano, 362 lares geriátricos localizados em Porto Alegre se cadastraram para vacinar residentes e colaboradores. Segundo o coordenador do Núcleo de Residenciais Geriátricos do Sindicato dos Hospitais e Clínicas de Porto Alegre (SindiHospa), Marcos Cunha, pelo menos 4 mil idosos vivem em instituições na Capital. Algumas delas optaram por não fechar as portas durante a pandemia, mas mantiveram o distanciamento nas visitas. Outras, a maioria, como o Solar Anita Residencial Sênior, administrado por Cunha, investiram na tecnologia, com uso de robôs – cujo rosto é visto num tablet – e celulares para ligações entre residentes e familiares.
— Mesmo com a chegada da vacina, o risco e os cuidados continuam. Existe a preocupação com a saúde mental do idoso, que necessita de convívio. Temos liberado um pouco mais as visitas, mas com controle rígido sobre o visitante — acrescenta Cunha.
A partir da vacinação da população idosa, a orientação do SindiHospa foi liberar a visitação às casas, mas com agendamento e, de preferência, em locais abertos e arejados, com uso de máscara e mantendo o distanciamento. Ainda não há possibilidade de abraços.
— Não será tão cedo que voltaremos ao normal, reunindo todos num mesmo ambiente. Isso só ocorrerá quando tivermos vacinado 75% da população total — acrescenta Cunha.
Isolamento afeta o lado emocional
Conforme a psicóloga Samanta Sittart, integrante do Grupo de Pesquisa Envelhecimento e Saúde Mental, do Instituto de Geriatria e Gerontologia da Pontifícia Universidade do Rio Grande do Sul (PUCRS), o isolamento é uma situação estressora e pode afetar, inclusive, a resposta imunológica do ser humano.
A privação do ir e vir e das visitas é um fator que acabou atingindo emocionalmente idosos e familiares. Por isso, manter-se presente é fundamental, apesar da continuidade do distanciamento.
— Os próprios residenciais geriátricos estão se reinventando para a manutenção dos vínculos, de forma que amenizem a saudade e a preocupação de ambos os lados. É importante se fazer presente de alguma forma, seja no local e com distanciamento ou numa videochamada — finaliza.
Cabine para matar a saudade do olho no olho
Ao contrário da maior parte dos lares geriátricos, a Hospedaria San Remo, em Porto Alegre, optou por não suspender as visitas, mesmo durante o período mais crítico da pandemia. Para isso, criou regras próprias e construiu a chamada “cabine de visitação”, logo na entrada da casa.
Feita em ferro junto ao portão principal, a cabine é uma espécie de gaiola com telhado, onde o visitante fica acomodado numa cadeira à espera do morador, que vai até o local sempre acompanhado de alguém da equipe de enfermagem. É preciso contar com a ajuda de São Pedro: com chuva, não há visitas.
A medida foi a forma encontrada pelos administradores Angela Welter Pereira e Luciano Lemanski para não suspender o contato presencial dos idosos com os familiares e amigos.
— Antes da pandemia, o jardim estava sempre lotado de familiares e moradores da hospedaria. Não podíamos privá-los desses momentos. Então, optamos pelo contato visual de forma presencial. O investimento valeu a pena — garante Angela.
As visitas são agendadas e podem durar até uma hora. A casa tem 15 idosos, com idades entre 69 e 96 anos, e prepara um novo espaço para receber mais oito nos próximos meses.
Até hoje, nenhum residente teve covid-19. Para evitar ainda mais a possibilidade de surto, os administradores fizeram um acordo salarial com os funcionários. O objetivo foi mantê-los trabalhando apenas no local, evitando a circulação em outros ambientes – nesse setor, é comum que os trabalhadores tenham outros empregos. Os colaboradores usam todos os equipamentos de proteção individual (EPIs) necessários, como máscara e face shield.
A opção de visitação agendada foi celebrada pelos parentes dos moradores da hospedaria. A professora aposentada Magda Pesce, 69 anos, visita a sogra, Norinha Pesce, 92, pelo menos uma vez por semana. E só não vai outros dias para dar oportunidade aos demais familiares:
Este momento que estamos vivendo é muito triste se não pudermos estar próximos de quem amamos. Então, esta alternativa para os familiares foi maravilhosa
MAGDA PESCE
Nora de uma moradora da hospedaria
— Todos os filhos, netos e bisnetos querem ver a bisa. Cada parte da família a visita num dia da semana, e a família inteira pode conviver de forma próxima.
Além da cabine, Angela ampliou o contato diário dos residentes com os familiares por meio de videochamadas e envio de fotos das atividades promovidas com os idosos.
— É uma forma de deixá-los mais próximos, mesmo com o distanciamento. Apesar de todos estarem vacinados, não podemos relaxar nas medidas enquanto houver pandemia — esclarece a proprietária.