As internações por coronavírus em Unidades de Tratamento Intensivo (UTI) de Porto Alegre mantiveram, nesta quarta-feira (22), uma estabilização pelo terceiro dia consecutivo. Há 284 pessoas hospitalizadas em estado muito grave – nos dois dias anteriores, eram 281. Médicos epidemiologistas, contudo, afirmam que é cedo para afirmar que a pandemia do coronavírus está sob controle.
Neste momento, a lotação de UTIs de Porto Alegre é de 88,5%, menos do que os 91% do dia anterior. A redução ocorre após a Santa Casa de Misericórdia inaugurar 17 novos leitos especializados em tratamento do novo coronavírus. No dia 31, serão mais 15 vagas.
Apesar de três dias de estabilização, o ideal é aguardar ao menos uma semana para assegurar que a baixa variação está relacionada à redução de casos. O número de internações desta quarta-feira ainda é 17,8% mais alto do que há uma semana e 56% maior do que há 15 dias.
O receio de médicos e autoridades gaúchos é de que a epidemia estabilize (pare de crescer) em um ritmo maior do que o número de leitos disponíveis na cidade. É o que ocorreu em Itália, Espanha e Nova York, onde, por dias a fio, o número de hospitalizados seguia o mesmo ritmo, mas em demanda muito acima do disponível em hospitais.
Desde o início da epidemia na Capital gaúcha, houve ao menos cinco outras vezes em que a lotação de UTIs estabilizou por poucos dias e em seguida, cresceu em ritmo alto, destaca a médica epidemiologista do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), Jeruza Neyeloff.
Ela diz que, para que a situação não deteriore, é preciso atingir um platô, e não uma "menor subida", uma vez que a capacidade de ampliação da rede de leitos críticos está no limite.
— Depois de uma semana sem aumento no número de pacientes internados e com fila de pedidos controlada é que poderemos respirar um pouco mais aliviados. Até lá, é uma situação bastante dramática. Nos últimos dias, temos uma linha ascendente. Está aumentando menos do que antes? É possível, mas ainda é um franco aumento. Falar de estabilidade com aumento de 17,8% em relação à semana passada é fazer o desejo falar mais alto do que a realidade — afirma.
Há sinais de que o crescimento da epidemia nas últimas semanas perdeu, de fato, força, mas o médico epidemiologista e secretário-adjunto da Secretaria Municipal da Saúde (SMS), Natan Katz concorda que não há como falar em platô da curva — ou seja, que foi atingido o topo e não haverá mais subida por um tempo — na capital gaúcha.
Na primeira semana de julho, ele diz, o tempo médio para que o número de internados em UTIs dobrasse era de 16 dias. Na semana seguinte, aumentou para 21 dias e, na última semana, cresceu para 27 dias. Ele deve isso às medidas de restrição implementadas pela prefeitura.
O trem está indo para o precipício: a gente continua construindo trilhos com a abertura de leitos, mas o único jeito de segurar esse trem é freá-lo com a redução da mobilidade.
NATAN KATZ
Secretário-adjunto da Secretaria Municipal da Saúde (SMS)
— Está reduzindo a velocidade de crescimento das internações nas últimas três semanas, mas ainda não em velocidade confortável. Em algum momento, a tendência é estabilizar, o problema é que ninguém sabe quando. A gente precisa que a estabilização ocorra dentro da capacidade de atendimento do nosso sistema hospitalar. Estamos na iminência de um colapso, é um risco alto. O trem está indo para o precipício: a gente continua construindo trilhos com a abertura de leitos, mas o único jeito de segurar esse trem é freá-lo com a redução da mobilidade. As medidas que tomamos tiveram efeito, mas aquém do necessário — comenta o secretário-adjunto da Saúde.
A alta ocupação de leitos na capital não é novidade, mas preocupa porque ocorre apesar da criação de mais de 240 leitos desde março e porque o coronavírus eleva cada vez mais a demanda. Uma vez que o paciente é hospitalizado, a média de tempo de internação e o consumo de remédios é maior. Além disso, boa parte dos hospitais não consegue mais ampliar vagas e faltam profissionais e medicamentos.
O avanço da ocupação de leitos e o baixo índice de distanciamento social na cidade levam o prefeito Nelson Marchezan (PSDB) a cogitar a adoção de um lockdown nos próximos dias. Médicos e dirigentes hospitalares vêm afirmando nos últimos dias que, apesar da expansão de vagas, há falta de profissionais e de remédios para o combate à covid-19.
Com 84,5% de ocupação, a Região Metropolitana tem a pior situação de todas as macrorregiões do Rio Grande do Sul, segundo dados do governo estadual. A Região Missioneira tinha a maior folga, com 64,2% de leitos em uso.
Na terça-feira, o índice de isolamento em Porto Alegre foi de 43%, abaixo da meta de 55%.