Ao completar a marca de 500 mortes provocadas no Rio Grande do Sul nesta quarta-feira (24), o coronavírus confirma se tratar de um adversário rápido e perigoso para suas vítimas. Quem sucumbiu à pandemia no Estado teve, em média, 15 dias de luta contra a doença antes de acabar vencido pelo vírus. Um quarto dessas pessoas teve uma semana ou menos entre o início dos sintomas e o registro do óbito, conforme indica uma análise dos microdados disponibilizados pela Secretaria Estadual da Saúde (SES).
— Eu acreditava que esse prazo era de mais ou menos três semanas, mas, provavelmente, há casos mais graves, de pacientes mais idosos, que estão puxando a média para baixo. A letalidade real da covid deve ser de aproximadamente 0,5%, mas quando afeta pessoas mais debilitadas, muitas vezes não há o que se possa fazer — analisa o professor de Epidemiologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e consultor do Hospital de Clínicas Jair Ferreira.
Em geral, desde a primeira morte, anunciada em 25 de março, até agora, as estatísticas indicam que os mortos em razão da covid-19 no Estado foram principalmente homens, acima dos 60 anos e, em nove entre 10 casos, apresentavam algum tipo de comorbidade — as mais comuns são complicações cardíacas crônicas. Em seguida aparecem diabetes e outras doenças pulmonares (veja abaixo gráfico com informações completas).
Isso ajudaria a explicar por que, em muitas situações, os pacientes acabam tendo poucos dias de vida desde as manifestações iniciais da contaminação até o último suspiro em um hospital. O arquivo digital da secretaria indica, ainda, que pouquíssimos doentes não chegaram a ser atendidos em ambiente hospitalar: somente dois entre todos os 500 levados pela pandemia.
Uma análise mais detalhada dá outras pistas sobre a forma como o coronavírus afetou suas vítimas no Rio Grande do Sul ao longo dos últimos três meses. Entre os homens e mulheres mortos pela pandemia, mais de 80% sofreram com falta de ar, enquanto esse sintoma só foi mencionado por 17% daqueles que se recuperaram ou ainda estão enfrentando a doença.
Em sentido oposto, apenas 14% dos gaúchos que morreram acusaram dores na garganta, enquanto quem sobreviveu manifestou esse desconforto em 24% das ocorrências registradas pela SES.
— Uma possibilidade é que, nos casos mais graves, o vírus vá mais diretamente para as vias aéreas inferiores — sustenta Ferreira.
Porto Alegre, Passo Fundo e Bento Gonçalves foram os municípios com maior número absoluto de mortes até esta triste quarta-feira em que o Estado chegou à marca de 500 óbitos provocados pelo coronavírus.
Pesquisadores elevam projeções de mortes para o RS
A tendência de crescimento nas hospitalizações em UTIs e no número de mortos pela covid-19 no Rio Grande do Sul foi acompanhada por um aumento equivalente nas projeções que tentam estimar quantas vítimas a mais poderão ser registradas nas próximas semanas.
A análise mais preocupante é do Instituto de Métricas e Avaliação em Saúde (IHME) da Universidade de Washington (EUA), que no começo do mês previa 1.087 óbitos no Estado para o final de julho — mas, nesta quarta-feira, a organização atualizou os dados e revisou essa expectativa para 1.432 vidas perdidas até o final do próximo mês. No começo de outubro, poderia chegar a 6,5 mil.
Outra instituição que desenvolveu uma ferramenta capaz de projetar casos e óbitos, o Instituto de Informática da UFRGS aponta cenários para um período máximo de 30 dias. A ferramenta, desenvolvida com participação do professor e pós-doutor na área de computação João Comba, até a terça-feira calculava 1.067 mortos para 23 de julho. Já com os últimos dados disponíveis, nesta quarta essa conta subiu para 1.435.
— A cada dia as previsões são atualizadas com base nas últimas informações. O que temos visto, nos últimos dias, são essas projeções serem ajustadas sempre para números mais elevados. Não é o que queremos, mas é o que os dados estão indicando — afirma Comba.