Tema caro ao programa do governo Jair Bolsonaro, a liberação de plantio de maconha para fins medicinais foi barrada nesta terça-feira (3), durante reunião da diretoria colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Embora um pouco antes o órgão tenha permitido a venda de remédios à base de Cannabis em farmácias do país, a proibição do cultivo era a pauta mais importante para ministros como Osmar Terra, da Cidadania, e da Saúde, Luiz Henrique Mandetta.
A proposta acabou rejeitada por três votos a um. Diretor-presidente da Anvisa e relator do processo, William Dib acabou votando sozinho pela autorização depois que outro dirigente simpático à ideia, Renato Porto, acabou renunciando ao cargo na última sexta-feira (29). Ele e Dib terminam seus mandatos em dezembro, mas Porto decidiu se antecipar e ficou de fora da mais polêmica sessão da Anvisa em 2019.
Formulado após cinco anos de discussões internas e consultas públicas, o texto apresentado por Dib era repleto de restrições ao plantio. Ele previa supervisão da Polícia Federal e exigia rígido sistema de segurança ao local de produção, inclusive com controle sobre a matéria-prima e no descarte dos resíduos. Os cuidados não foram suficientes para convencer os colegas de diretoria.
Autor de um pedido de vista na sessão anterior em que o tema começou a ser debatido, em 15 de outubro, o diretor Antonio Barra orientou os votos divergentes. Alinhado à visão governista, Barra foi recebido por Bolsonaro no Palácio do Planalto em agosto, dias antes do fim das consultas públicas sobre o tema. Na ocasião, o porta-voz da Presidência, Otávio Rêgo Barros, disse que Bolsonaro "é favorável ao uso desse produto para fins medicinais, mas não admite que brechas da legislação sejam usadas para o plantio e consumo da maconha".
Na sessão desta terça-feira, em uma explanação que se estendeu por quase duas horas, Barra sustentou que o processo, com quase 3 mil páginas, dedicava menos de 1% de sua totalidade para cuidados com segurança. Ele vislumbrou "inequívoca fragilidade" na condução do estudo pela Anvisa, enxergando inclusive que o órgão teria exorbitado suas atribuições no decorrer do trabalho.
— Fica claro que órgãos protagonistas de segurança pública não foram adequadamente envolvidos nas discussões tratadas. As plantas são de capital interesse para organizações criminosas — salientou Barra, cujo voto foi acompanhado na íntegra por Alessandra Soares e Fernando Garcia Neto.
O julgamento desta terça-feira era uma das principais obsessões do ministro Osmar Terra. Com forte posicionamento antidrogas, o gaúcho envolveu-se mais de uma vez em debates públicos com a Anvisa por conta da possibilidade de liberação do cultivo de maconha. Em julho, ele chegou a cogitar o fechamento da agência caso houvesse permissão para a plantação de Cannabis.
Na semana passada, o ministro voltou ao tema, desta vez dizendo que William Dib "não entende nada" sobre uso medicinal da maconha e estava "querendo liberar a droga no Brasil".
Em uma rede social, o ministro Osmar Terra disse que o presidente da Anvisa foi "derrotado" e que a decisão da diretoria representa uma vitória: "Decisão só referenda o que já é feito, como venda do Canabidiol em farmácia, separado, como remédio controlado. O que sempre defendemos", afirmou.