Entre os destaques dos investimentos na rede privada de saúde em Porto Alegre e Canoas, está um modelo inovador de empreendimento. Em parceria com o Hospital Moinhos de Vento (HMV), a incorporadora Melnick Even assina o conceito de Hub da saúde, ecossistema que abrange, orbitando no entorno de uma unidade base do HMV, torres com consultórios, apartamentos residenciais e facilidades como hotel, laboratórios, escritórios, lojas e supermercado. Quatro Hubs já estão garantidos no acordo entre a construtora e o hospital, e o primeiro, chamado Maxplaza, em Canoas, deverá ser entregue na metade do ano.
Um dos principais hospitais privados do Estado, o HMV deve inaugurar em breve uma nova emergência pediátrica, que ganhará o nome de Elone Schneider Vontobel.
A instituição deu uma guinada a partir de 2007, quando enfrentava uma grave crise econômica e de governança. Cogitou-se até a venda de patrimônio para a quitação de dívidas, como relembra o atual superintendente executivo, Mohamed Parrini, que assumiu como CEO àquela época.
Desfizeram-se operações bancárias danosas à instituição e foi elaborado um programa de investimentos a partir de financiamentos de longo prazo solicitados a bancos internacionais e ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que possibilitaram apostas em tecnologia e estruturas para atrair de volta os clientes perdidos. Com tradição em maternidade, a instituição era fechada, sem atendimento de emergência. Projetou-se uma ampla expansão, que incluiu a ocupação do prédio da Rua Tiradentes, um esqueleto quase vazio, onde antes só funcionava a oncologia — de 13 andares, nove estavam desocupados. Um pronto-atendimento pequeno deu lugar a uma emergência, e o número de salas do centro cirúrgico passou de 12 para 17. Em 2018, disponibilizou-se uma centena de novos leitos, atingindo-se o total de 500.
O HMV é uma entidade privada (que cobra pelos serviços oferecidos via planos de saúde), filantrópica e sem fins lucrativos. Não paga impostos, mas não está isenta das contribuições de Programa Integração Social (PIS), Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Na prática, é autossustentável — todos os recursos que recebe voltam para ela própria, para seus funcionários e para a sociedade. Há hospitais que revertem seus ganhos ao público via atendimentos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), caso do Hospital Mãe de Deus (HMD).
O HMV optou por investir em projetos em educação, pesquisa clínica, saúde pública e gestão, em decisões tomadas em conjunto com o Ministério da Saúde e os governos estadual e municipal. Um dos exemplos mais recentes e notáveis é o Hospital da Restinga, que recebeu cerca de R$ 400 milhões.
Um ponto marcante da história recente da entidade foi a assinatura de um acordo de afiliação com a Johns Hopkins Medicine International, braço internacional da Johns Hopkins Medicine, iniciativa que congrega o corpo médico e científico da Faculdade de Medicina da Universidade Johns Hopkins, em Baltimore, no estado de Maryland, e o Sistema de Saúde Johns Hopkins, incluindo o hospital de mesmo nome.
— Se a gente quisesse ser igual ou melhor do que os hospitais de São Paulo, precisávamos dar um salto além — justifica Parrini.
Formação acadêmica
Com essa conexão, há um intercâmbio de ideias e informações para aprimorar aspectos arquitetônicos, de fluxo interno e de pesquisa científica, além da capacitação de profissionais. Videoconferências entre o Brasil e os Estados Unidos são realizadas para discutir casos. Paralelamente, o HMV veio se preparando para se lançar no mundo acadêmico, com a Faculdade de Ciências da Saúde Moinhos de Vento, que neste semestre disponibiliza 50 vagas para a sua primeira turma de Ensino Superior, no curso de Enfermagem. Outras graduações e programas de mestrado e doutorado também estão no horizonte.
Em dezembro, a instituição colocou em operação um moderno software para o atendimento a pacientes que sofrem acidente vascular cerebral (AVC) do tipo isquêmico. O e-STROKE Suite aponta, nas imagens de tomografia, onde ocorreu o entupimento de vaso sanguíneo e as áreas que ainda podem ou não ser salvas, conforme o tempo decorrido desde o início da manifestação dos sintomas. Em imagens coloridas, o especialista pode decidir, com mais rapidez, como será a intervenção, tendo a chance de evitar sequelas e até a morte. Porto Alegre é a primeira cidade da América Latina a adquirir essa tecnologia. Nos R$ 70 milhões de investimento previstos para este ano, constam, ainda, a aquisição de um novo acelerador linear Truebeam para aplicação mais precisa de radioterapia e novas emergência cardiológica para pacientes graves e UTI de cardiologia e neurologia, entre outras iniciativas.
Está prevista para o final de abril a inauguração de uma nova emergência pediátrica, que recebeu R$ 12 milhões da família Vontobel, fundadora do grupo Vonpar. A Emergência Pediátrica Elone Schneider Vontobel, com área total de 500 metros quadrados e 20 leitos para pacientes em observação — atualmente são seis —, apostará na telemedicina, sistema que permitirá conectar o atendimento do doente em estado grave diretamente com a equipe da UTI, agilizando os processos.
Apenas nesta década, outras duas famílias tradicionais da sociedade gaúcha repassaram somas vultosas ao HMV para a implementação de melhorias, batizando os espaços com seus nomes. Em 2011, inaugurou-se a Maternidade Helda Gerdau Johannpeter (doação de R$ 25 milhões, em valores corrigidos), e, em 2016, o Centro de Oncologia Lydia Wong Ling (a família pediu confidencialidade, e divulgou-se apenas que os Ling contribuíram com parte significativa dos R$ 30 milhões totais da obra).
Setor da construção aposta em ecossistema que envolve serviços de saúde
Além de torres com consultórios, Hub da saúde tem laboratórios, supermercados, lojas e outras conveniências.
Juliano Melnick, sócio-diretor da Melnick Even, lembra que construtoras passaram por um boom imobiliário até 2013, desenvolvendo produtos tradicionais que tinham saída rápida. Com a crise que se instaurou nos anos de 2014 e 2015, o setor, travado, precisou se reinventar para conseguir voltar a ser atrativo para investidores e clientes. Condomínios com a conveniência de pequenos comércios e serviços no mesmo espaço já não eram mais novidade, e os empresários acabaram por direcionar o olhar para a área médica. Em parceria com a Melnick Even, o HMV aposta em um projeto de descentralização para o futuro breve.
Torres de salas comerciais simples não costumam ser adaptadas em acordo com a Resolução RDC 50/2002 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que dispõe sobre as normas técnicas de estabelecimentos assistenciais de saúde, como a que determina o tamanho dos elevadores, que precisam ser grandes o suficiente para transportar macas.
O conceito de Hub da saúde vai além de torres com consultórios. Trata-se de um ecossistema que deverá ter uma unidade base do Moinhos de Vento para atendimentos de baixa complexidade, como exames preventivos e procedimentos ambulatoriais, além de apartamentos residenciais e facilidades como hotel, consultórios, laboratórios, escritórios, lojas e supermercado. O primeiro complexo a ser inaugurado se chamará Maxplaza, em Canoas, às margens da BR-116, com valor geral de vendas (VGV, que é a cifra alcançada quando todas as unidades são comercializadas) de mais de R$ 300 milhões, previsto para ser entregue na metade deste ano.
Sucesso em um "mercado adormecido"
Até agora, está acertada a sociedade entre a incorporadora e o hospital para outras três unidades: no Pontal do Estaleiro, na Avenida Aparício Borges e na Avenida Grécia. Um sistema único interconectará todas elas, permitindo que um doente possa ser atendido primeiro fora da sede e depois transportado até lá se sua situação se agravar. Ou, ainda, que um especialista tenha endereços em complexos diferentes, mas interligados.
— Lançamos o Maxplaza no meio da crise. As pessoas diziam que ou éramos gênio ou loucos. Foi um sucesso estrondoso. Era um mercado adormecido — conta Melnick, que observa que empreendimentos dessa natureza já começam a despontar em cidades do Interior.
— As pessoas compraram a ideia do conceito, o de que não é só um centro médico isolado. Foi uma saída importante para driblar a crise, com certeza. Esses empreendimentos nos ajudaram a bater nossas metas de lançamentos e vendas e estão mudando esses bairros. É uma relação de ganha-ganha para todos.
Somados, os quatro empreendimentos têm um VGV superior a R$ 1 bilhão, valor que terá sido, ao final, negociado em uma janela de tempo de cerca de cinco anos.
— É a saúde que está movimentando isso. Esses empreendimentos só existem porque estão ancorados nos serviços de saúde. Se existissem isolados, talvez não tivéssemos sucesso — avalia o empresário.