Um novo temporal voltou a testar a capacidade de Porto Alegre de absorver e escoar volume de água atípico da chuva. Em um intervalo de poucas horas, a Capital repetiu cenas da enchente de maio, que ainda atormentam parte da população, como ruas alagadas, bueiros jorrando água para fora e vias costuradas pelo aguaceiro.
A situação foi mais crítica em pontos do 4º Distrito, do Centro Histórico e dos bairros Cidade Baixa e Menino Deus.
O Departamento Municipal de Águas e Esgotos (Dmae) afirma que os transtornos foram causados, principalmente, pelo grande volume de chuva em um período curto de tempo e pela falta de luz em pontos do sistema de drenagem da cidade.
Volume de chuva
O Dmae atribui os alagamentos a dois pontos principais. O primeiro é o volume de chuva em um curto período de tempo. O diretor-geral do Dmae, Maurício Loss, informou, em entrevista à Rádio Gaúcha, que 40 milímetros dos dos 49 milímetros de chuva registrados na passagem da instabilidade foram registrados entre 22h e 23h de domingo (1º).
Falta de luz em casas de bombas
O segundo ponto citado pelo gestor é o problema de falta de luz em algumas casas de bombas. Sem energia via rede elétrica, as Estações de Bombeamento de Águas Pluviais (Ebaps) operam via geradores, o que limita o poder de vazão dos complexos, segundo Loss:
— Tivemos queda de energia, principalmente no 4º Distrito. Todas as estações de bombeamento do 4º Distrito ficaram sem energia, operando apenas por geradores, que operam de forma limitada. Nós não temos como disponibilizar geradores para todos os bombeamentos, então, operaram de maneira limitada, em torno de 50% de sua operação. E pelo grande volume de chuva, acabaram não dando vazão o suficiente.
Quais casas de bombas registraram falta de luz?
Segundo o Dmae, pelo menos cinco casas de bombas tiveram fornecimento interrompido durante o temporal em Porto Alegre. A falta de luz ocorreu entre 22h e 1h30min. Nesse período, as unidades de bombeamento funcionaram por meio de geradores. Desde 1h30min, o serviço funciona de forma normal diante do restabelecimento da energia elétrica.
Solução para geradores
O professor do Departamento de Hidromecânica e Hidrologia do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Fernando Dornelles afirma que uma solução para esse problema seria montar um sistema com linha de energia exclusiva, dedicada apenas às casas de bombas:
— Creio que alimentar todas as bombas com geradores é algo difícil. Há bombas de grande potência, onde talvez fosse necessário um gerador ainda mais forte.
O melhor para esse problema seria ter uma linha de fornecimento de energia independente, dedicada exclusivamente para as casas de bombas. É um assunto que vem há anos sendo discutido, porém parece que nunca avançou.
FERNANDO DORNELLES
Professor do Departamento de Hidromecânica e Hidrologia do IPH da UFRGS
Questionado em entrevista ao Gaúcha + sobre essa questão de linhas exclusivas, o diretor-geral do Dmae afirmou que essa ação é estudada pela prefeitura, mas representa um custo elevado:
— Isso é estudado, mas também é algo muito caro, porque seria por custo do Dmae. E assim como alguns hospitais, alguns equipamentos, nós teríamos que pegar do Centro de Distribuição de Energia e custear toda uma linha. E normalmente não se usa inclusive o mesmo poste. Teria que ser um posteamento novo também e toda uma linha exclusiva até aquela casa de bombas.
Sobre eventual uso de geradores mais potentes para melhor operação emergencial nas Ebaps, Loss afirmou que os equipamentos usados atualmente conseguem tocar duas bombas (cerca de 50% da operação). Para atender integralmente as 23 casas de bombas da cidade seriam necessários mais geradores, o que aumentaria o custo, que não conseguiria ser absorvido pelo departamento. Além disso, algumas das casas de bombas não têm espaço para receber diversos geradores, segundo o órgão.
— Nesse atual contrato que nós temos, os 26 geradores custam para o Dmae R$ 1,7 milhão por mês. Apenas 26 geradores. Um gerador de 750 KVA, por exemplo, pode tocar até duas bombas. Nós temos casas de bombas com quatro, cinco bombas. A gente pode estar falando, para as 23 casas de bombas, em torno de 50, 60 geradores. Inevitavelmente, a gente chegaria a um certo ponto que o Dmae não conseguiria mais absorver isso. O Dmae não quer passar para o usuário essa conta.
Loss afirmou que a prefeitura está trabalhando com um novo contrato que prevê 20 geradores fixos e 18 sob demanda. Portanto, um contrato de 38 geradores que pode ser aditado, inclusive, para chegar a 45, segundo Loss. O diretor também reforçou a necessidade de um sistema de energia elétrica mais eficiente na cidade para evitar a falta de luz nos locais.
Obstrução de redes
O professor do IPH avalia que a chuva de fato foi intensa e talvez tenha superado a capacidade de escoamento. Além disso, destaca que o cenário da noite de domingo indica pontos da rede ainda obstruídos:
— Há indícios de que ainda temos redes obstruídas, o que faz com que a água não chegue às casas de bombas. Além disso, há relato de interrupção de energia nas estações de bombeamento que atendem a região do 4º Distrito. Ainda há problemas com extravasamento de condutos forçados através das tampas de acesso que devem ser perfeitamente estanques e competentes para resistir aos esforços quando o condutor entrar em carga.
O diretor-geral do Dmae afirma que a prefeitura segue com a limpeza das redes atingidas.
Estamos atuando com mais de 30 caminhões de hidrojato por toda a cidade, passamos por mais de 70% já da área atingida, da mancha de inundação que tivemos em maio, mas claro, também estamos falando de um grande volume de chuva num curto espaço de tempo e que a rede não é dimensionada para toda essa chuva nesse espaço.
MAURÍCIO LOSS
Diretor-geral do Dmae
O diretor do Dmae estima que algumas obras de melhoria de emergência no sistema de drenagem da cidade podem levar de dois a três anos. No entanto, intervenções maiores e mais estruturais devem levar mais tempo.
*Colaboraram Kathlyn Moreira e Gabriel Jacobsen