Porto Alegre amplia nesta semana o espaço para contribuições e questionamentos sobre a revisão do seu plano diretor. Um ciclo de três dias de palestras e debates, que se inicia nesta terça-feira (7) e prossegue até quinta (9), dá continuidade ao processo que foi começado em 2019, mas acabou interrompido no ano seguinte por decorrência das restrições de convívio impostas pela pandemia.
Denominada Conferência de Avaliação do Plano Diretor, a atividade ocorrerá no Salão de Atos da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), reunindo especialistas de diversas áreas relacionadas ao desenvolvimento e à sustentabilidade da cidade. Nos três dias, as atividades acontecerão das 9h às 18h e a participação requer inscrição pelo site do evento.
A revisão do plano diretor está atrasada na Capital. De acordo com o Estatuto das Cidades, dispositivo instituído em 2001 para regulamentar o capítulo da Constituição Federal que trata sobre a política urbana, as atualizações de planos diretores devem acontecer a cada 10 anos. O plano vigente é de 1999 e está instituído pela Lei Complementar 434. Ele recebeu atualizações pela Lei Complementar 646/2010, que incluiu a normatização para áreas de interesse desportivo e recreativo no capítulo das áreas de interesse cultural na cidade. O dispositivo reconhece e estabelece critérios sobre campos de futebol de várzea, sete ou salão, quadras de vôlei ou basquete e áreas de recreação diversas.
A Lei Complementar de 2010 também instituiu as Áreas de Animação na cidade, estabelecendo regramentos para locais como Mercado Público, Largo Glênio Peres, Praça XV, Viaduto Otávio Rocha, Cais Mauá, Praça da Alfândega e adjacências e Corredor Cultural da Rua dos Andradas, no Centro; além de áreas na Cidade Baixa, na Zona Sul e no bairro Moinhos de Vento.
O movimento que chega à conferência desta semana foi iniciado em 2020 pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus), mas restou descontinuado em decorrência da pandemia. Conforme o titular da Pasta, secretário Germano Bremm, são esperados indicativos da vontade da comunidade sobre a nova formatação da norma urbanística.
— No primeiro dia, palestrantes darão um conjunto de visões de base técnica. No dia seguinte, haverá discussões em mesas temáticas formadas por participantes e ouvintes das palestras. No terceiro dia, ocorrem moções indicativas sobre cada tema para serem apreciadas e votadas pelo grupo — pontua Bremm.
Após a conferência, o processo entra na etapa de sistematização das propostas em um projeto de lei complementar que precisa ser enviado pelo Executivo para apreciação e votação na Câmara de Vereadores. Para a nova regra ser aprovada são necessários 19 votos, ou seja: maioria absoluta do plenário formado por 36 legisladores.
Quando o PLC ganhar forma, antes da remessa ao Legislativo, o texto precisa ser submetido a pelo menos uma audiência pública. Segundo o secretário, a Prefeitura trabalha com a previsão de realizar rodadas de discussão por temática para, por fim, encaminhar a proposta ao Legislativo, o que deverá ocorrer até outubro.
Uma das possíveis novidades será a previsão para ampliação da possibilidade da adoção de programas de desenvolvimento específicos para bairros ou áreas da cidade. No ano passado, foram instituídos programas para o Centro Histórico e para o Quarto Distrito. Neles, o Executivo adotou medidas de incentivo à ocupação, inclusive com isenção de IPTU, de áreas antes degradadas nos bairros como Floresta, São Geraldo e Navegantes.
— No caso do Centro Histórico, normatizamos processos como o da concessão da Orla para parceiros da iniciativa privada. A ideia é que o novo Plano Diretor contenha a previsão de que a Administração possa instituir programas para quaisquer áreas da cidade, obviamente respeitando as diretrizes e as características de cada localidade — confirma o secretário Germano Bremm.
IAB-RS defende modelo equilibrado para mudanças
Um dos temas que pode causar controvérsias durante os debates é a definição de padrões de edificação na cidade. Para a presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil - Departamento do Rio Grande do Sul (IAB-RS), Clarice Oliveira, o atual modelo, no qual os parâmetros estão descritos no texto do Plano Diretor, precisa ser preservado.
— Desregulamentar este aspecto, permitindo que as regulamentações sejam feitas por decreto do Executivo, pode ser um equívoco — aponta Clarice.
Clarice afirma que a constituição de grandes fundos de investimento cada vez mais vultosos para financiar projetos imobiliários acaba exercendo uma pressão desproporcional sobre as decisões e a retirada dos parâmetros do texto da lei traria desequilíbrio nas relações econômicas de ocupação dos espaços urbanos na Capital.
— Uma dose de flexibilidade pode ser saudável, pois a cidade cresce de forma muito dinâmica. Contudo, institutos básicos conceituais devem ser preservados. Um modelo muito liberal colide com o propósito de um plano diretor, que é estabelecer uma mediação do poder público sobre o desenvolvimento - define a presidente do IAB-RS.
Clarice destaca outros pontos de atenção prioritária em sua visão, tais como os problemas de mobilidade e do transporte coletivo, o abastecimento de água para todos, a habitação de interesse social.
— Quando olhamos para Porto Alegre, vemos que as periferias estão muito desassistidas — conclui.
O secretário Germano Bremm contrapõe os argumentos e sustenta que a dinâmica urbana exige a redução de dispositivos restritivos.
— Esta discussão é uma das mais importantes que traremos no processo. A definição rigorosa de padrões gera amarras que a tornam ultrapassada. Atualmente existem outras tecnologias para analisar os impactos dos projetos de construção — avalia.
Bremm exemplifica, citando a expansão territorial para a Zona Sul ocorrida nos anos recentes e determinada por restrições sobre a verticalidade de projetos.
— Se vamos preservar estas características desta região mais afastada, a cidade poderá crescer para alto nas áreas já urbanizadas e dotadas de infraestrutura. Hoje temos um espaço desocupado até a Orla. Há cidades banhadas em que as construções avançam até próximo de sua orla. São escolhas que a cidade precisa fazer — argumenta.
Confira a programação da conferência
Terça, 7 de março
- 9h – Solenidade de abertura
- 9h20min - Palestra sobre o plano diretor e dinâmica: Patrícia Tschoepke, diretora de Planejamento Urbano da Smamus e Vaneska Henrique, coordenadora de Planejamento Urbano da secretaria
- 10h30min - Eixo temático 1: desenvolvimento social e cultural. Palestrantes: Simone Somensi, secretária-adjunta de Habitação e Regularização Fundiária em Porto Alegre e Karla Moroso, arquiteta e urbanista, especialização no direito à cidade e à moradia
- 11h20min - Eixo temático 2: ambiente natural. Palestrantes: Inez Pavlick, engenheira agrônoma, coordenadora do Grupo de Patrimônio Ambiental do 2º PDDUA e Francisco Milanez, biólogo e ex-presidente da Agapan
- 12h10min - Eixo temático 3: patrimônio cultural. Palestrantes: Flávio Kiefer, arquiteto e professor da PUCRS e André Huyer, arquiteto e urbanista, especialista em patrimônio cultural em centros urbanos
- 13h - Intervalo
- 14h30min - Eixo temático 4: mobilidade e transporte. Palestrantes: Júlio Celso Borello Vargas Arquiteto e urbanista, professor da UFRGS e Luiz Afonso dos Santos Senna, engenheiro civil, professor da UFRGS e conselheiro-presidente na Agergs
- 15h20min - Eixo temático 5: desempenho, estrutura e infraestrutura urbana. Palestrantes: Alice Rauber Gonçalves, arquiteta e urbanista, integrou a equipe responsável pela elaboração do plano diretor do Parque Tecnológico de Itaipu e Rodrigo Córdova Petersen, arquiteto e urbanista
- 16h10min - Eixo temático 6: desenvolvimento econômico. Palestrantes: Pedro Valério, CEO do Instituto Caldeira e Fabian Scholze Domingues, filósofo e economista, professor da UFRGS
- 17h - Eixo temático 7: Gestão da cidade. Palestrantes: Annelise Monteiro Steigleder, promotora de Justiça no MP e Clarice Misoczky de Oliveira, presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil/RS
- 17h50min - Encerramento
Quarta, 8 de março
- 9h - Introdução da dinâmica
- 9h30min - Trabalho nos subgrupos: os participantes serão divididos nos subgrupos correspondentes do eixo e farão rodadas de 20 minutos de diálogo. Após cada rodada, os participantes trocam de subgrupo de forma que todos debatam todos os assuntos.
- 12h - Intervalo
- 13h30min - Discussões: debate entre todos os participantes, incentivando o compartilhamento de descobertas e buscando ações conjuntas.
- 16h - Finalizar documento: consolidação do documento com os resultados para deliberação no terceiro dia de conferência
- 18h - Encerramento
Quinta, 9 de março
- 9h - Apresentação e votação eixo temático 1
- 10h - Apresentação e votação eixo temático 2
- 11h - Apresentação e votação eixo temático 3
- 12h - Intervalo
- 13h30min - Apresentação e votação eixo temático 4
- 14h30min - Apresentação e votação eixo temático 5
- 15h30min - Apresentação e votação eixo temático 6
- 16h30min - Apresentação e votação eixo temático 7