O Largo dos Açorianos está novamente vandalizado com pichações. Localizado no limite entre o Centro Histórico e a Cidade Baixa, o espaço de 19,2 mil metros quadrados, que foi entregue revitalizado há três anos, é um dos principais cartões-postais de Porto Alegre. Trata-se de um lugar de lazer e de passeio das pessoas, especialmente aos finais de semana e feriados.
— Isso é coisa dos baderneiros estragando o que foi renovado recentemente. Acho que as pichações ocorrem durante a madrugada — afirma o profissional autônomo Éderson Machado de Souza, 39 anos, que é frequentador do local.
Nesta segunda-feira (26), em torno das 11h30min, Souza estava aproveitando o sol perto do lago, na companhia da esposa Kelly Cristina, 40, da sobrinha Jéssica e da cadelinha Preta. Enquanto jogava pedaços de pão para os peixes, ele pensava no que poderia ser feito para conter atos de vandalismo:
— Tem que ter vigilância 24 horas.
As pichações aparecem nas alças de acesso do Viaduto dos Açorianos, situado na Avenida Borges de Medeiros, e no pilar de sustentação da elevada, em frente às pistas da Avenida Loureiro da Silva. Além disso, há pichações em outro trecho do viaduto voltado para a direção do lago existente no largo e em pontos como bancos de pedra e perto do espelho d’água. Nem a histórica Ponte de Pedra foi poupada. Em sua amurada, é possível ver o começo de uma pichação em preto, que parece não ter sido concluída.
— Deveria haver um espaço nessas grandes estruturas para o pessoal poder se expressar. Aqui sempre tem pichação — atesta o entregador Eduardo Strevenski, 18, que fazia uma pausa no trabalho sentado perto do lago.
Em 19 de agosto, GZH mostrou que o Largo dos Açorianos, após sua revitalização, ao contrário de outros locais públicos de lazer da Capital, conseguia oferecer uma área limpa, com manutenção frequente e sem pichações. Pouco mais de um mês depois, o local foi alvo dos pichadores.
— Acho um absurdo, não tem fiscalização. Precisa ter mais câmeras e guardas municipais fiscalizando — reflete a professora Tânia Lupinacci, 66, que passeava com o cão Dudi perto da placa com informações históricas sobre a Ponte de Pedra.
Outras pessoas que circulam com frequência pelo largo avaliam o problema da pichação e reconhecem que é mais profundo do que parece. O sociólogo Davi Eskenazi, 30, que levava o pet Snoopy para o passeio matinal, compartilha o que pensa sobre esses atos:
— Não adianta apenas a segurança pública estar mais presente. Precisamos ter mais educação em comunidades que não se sentem incluídas. É necessária uma reeducação para que essas pessoas percebam que as praças também integram a vida delas.
O diretor de cena Vinícius Gonçalves, 25, que passeava com o cachorrinho Koa, também vê algo mais profundo que um simples ato de vandalismo contra o patrimônio público.
— Isso aí é a galera colocando a voz dela desabafando. É uma forma de expressão e revolta. É preciso política pública, saúde e educação melhores — enumera.
Por sua vez, o Monumento aos Açorianos, que foi restaurado em 2016, está tomado por pichações há muito tempo. As caixas em concreto que protegem a iluminação no solo foram alvos de pichadores. A área amurada que lembra uma plataforma não tem nem mais espaço para pichações.
— Mais câmeras de segurança não vão impedir as pichações. Talvez ajude ter mais guardas municipais para cuidar do patrimônio — opina a estudante de saúde coletiva da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Kinberlyn Pereira Rodrigues, 25, que passava perto do monumento nesta segunda.
Segundo ela, espaços disponíveis para os jovens se expressarem seriam importantes.
— Como fizeram no Viaduto da Conceição — cita.
O que diz a prefeitura:
O comandante da Guarda Municipal, Marcelo Nascimento, explica que ações são realizadas no Largo dos Açorianos e nos parques da cidade que possuem monumentos.
— Há a impossibilidade de mantermos guardas fixos 24 horas por dia nesses lugares. Mas frisamos que a participação das pessoas através das denúncias é importante — diz, pontuando que o policiamento foi intensificado na região.
Conforme o comandante relata, será solicitado agora para a prefeitura efetuar a limpeza nos próximos dias.
— Já efetuamos até a prisão de pichadores nesse local. Quando flagramos um pichador, não é apenas a questão criminal que a gente encaminha, mas também a punição administrativa através da multa — esclarece Nascimento.
As duas câmeras de videomonitoramento instaladas nos arredores do Largo dos Açorianos não estão em operação neste momento.
— Vamos reforçar o policiamento — conclui.
A prefeitura informou, por meio da Secretaria Municipal de Serviços Urbanos (SMSUrb), que "o viaduto foi entregue no ano passado pela Secretaria Municipal de Obras e Infraestrutura (Smoi), totalmente pintado e revitalizado. Não é um viaduto que estava sem manutenção".
Confira, abaixo, trecho da nota da SMSUrb enviada a GZH:
"A manutenção dos viadutos de Porto Alegre envolve diversas frentes da Prefeitura de Porto Alegre e é uma pauta que já está sendo trabalhada em pontos diferentes da Capital. No caso do Viaduto dos Açorianos, a obra foi entregue no ano passado pela Prefeitura de Porto Alegre, por meio da Secretaria Municipal de Obras e Infraestrutura (Smoi). A remoção das pichações será realizada pela SMSUrb de acordo com tempo e recursos disponíveis. Após essa etapa aplica-se tinta e verniz antipichação. Neste momento, a SMSUrb trabalha na recuperação de outros quatro viadutos/estruturas: José Loureiro da Silva (Santa Casa), Imperatriz Leopoldina (Brooklyn), Jayme Caetano Braun e Ponte do Arroio da Pintada (hoje foi feita vistoria para reparos que iniciarão nos próximos dias). Além disso, ressalta-se que a administração municipal, por meio da Secretaria Municipal de Serviços Urbanos (SMSUrb) e da Secretaria Municipal de Parcerias (SMP), tem realizado a revitalização destes espaços para que se tornem mais atrativos para as pessoas. O processo ocorre da seguinte forma: a SMSUrb revitaliza (pintura, reparos estruturais, limpeza, remoção de pichação, ajardinamento, reparos em passeios, etc.) e a SMP disponibiliza o espaço para adoção."
O que diz a OAB
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que adotou o local em conjunto com a Caixa de Assistência dos Advogados, é responsável pela manutenção do Largo dos Açorianos. Desde que assumiu o compromisso de adotar a área, a grama está sempre aparada, a água passa por manutenção regular e não é comum encontrar lixo espalhado pelo local.
Procurada para responder sobre o que faria em relação às pichações recentes, a entidade respondeu que a prefeitura e os órgãos de segurança deveriam ser procurados para um posicionamento oficial e que "a OAB/RS tomou conhecimento do caso e vai dar a manutenção devida".
História
A Ponte de Pedra, que fica no largo e foi tombada pelo município em 1979, tem expressiva relevância histórica. Em 1846, o então Conde de Caxias, que era o presidente de São Pedro do Rio Grande do Sul e ficaria conhecido como Duque de Caxias, decidiu mandar construir uma travessia de pedra para substituir outra, de madeira, que existia no local desde 1825. A ponte ajudava na conexão da cidade com a margem esquerda do Riachinho (atual Arroio Dilúvio), que passava por ali antes de sofrer processo de canalização.
No outro lado da via, o Monumento aos Açorianos é outra referência importante da cidade. A obra é uma homenagem à chegada dos 60 casais açorianos à Capital, antigo Porto dos Casais, em 1752. Foi inaugurada em 1974 e fica na Praça dos Açorianos, destacando-se em meio ao trânsito intenso de veículos.