Uma segunda peça contendo uma suástica desenhada em sua superfície apareceu em uma propriedade localizada na zona rural de Maçambará, município situado na Fronteira Oeste do RS, distante quase 478 quilômetros de Porto Alegre. O objeto está bastante danificado e possui semelhanças com o latão pertencente ao acervo do Museu Alcir Philippsen, de Santo Cristo, na região noroeste, e que está sendo pesquisado pelo professor Edison Hüttner, do Programa de Pós-Graduação em História da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
— Me criei vendo essa lata. Meu pai me contava a história dela, mas eu era pequeno e não dava bola — recorda o engenheiro agrônomo Mário Carlos da Costa Mello Júnior, 38 anos, proprietário do objeto incompleto, bastante enferrujado e com marcas da ação do tempo.
Conforme relata o morador de Caxias do Sul, na Serra, a peça tem uma história bastante curiosa. Chegou à família dele, que vive até hoje na zona rural de Maçambará (emancipada de Itaqui em 1997), por volta de 1949.
— Meu pai (Mário Carlos da Costa Mello, de 73 anos) me dizia que era uma lata em que o meu avô (Ademar de Oliveira Mello) guardava comida dentro — compartilha.
Porém, o caminho percorrido pelo latão até parar no interior gaúcho é mais complexo e envolve até aventuras ilegais em outro país.
— O meu avô ia na Argentina e contrabandeava farinha e banha para levar até Itaqui. Em uma dessas vezes, trouxe o latão do país vizinho com os produtos dentro — narra o engenheiro agrônomo, repetindo a história que o pai contava para ele.
Dessa maneira, a peça era usada como “mula”, armazenando produtos alimentícios do território argentino e viajando, sem passar pela alfândega, até chegar aos familiares em solo gaúcho. O contrabando também era distribuído nas regiões de São Borja e de Santiago. Entretanto, com o passar das décadas, o latão foi perdendo partes e se deteriorando. Foi quando o atual proprietário decidiu guardá-lo no forro da casa na zona rural, onde o objeto permaneceu longe do olhar das pessoas e esquecido por 20 anos.
— Quando vi a matéria no site da Zero Hora da lata de Santo Cristo com a suástica, me lembrei da nossa, guardada no forro — diz.
Então, o destino entrou em cena para o tonel voltar a ficar em evidência novamente. Os pais haviam tirado o objeto do forro da casa, há cerca de dois anos, e o deixado em uma espécie de lixão com coisas sem uso no lado externo da propriedade. O filho, que não sabia disso até ler a reportagem de GZH, pediu para a família buscá-lo e voltar a guardá-lo dentro de casa. Por sorte, a peça foi encontrada e ainda resistia.
— Isso é uma relíquia — reconhece, salientando que não afasta a possibilidade de a lata ser cedida para ser estudada e até doada para algum museu.
O professor Edison Hüttner comemora o aparecimento do segundo latão:
— É muito importante que essas coisas estejam aparecendo. O momento é de contar e resgatar a história desses tambores — reflete.
Latão de Santo Cristo passa por investigação
Um objeto em latão com uma suástica semelhante ao símbolo nazista, pertencente ao acervo do Museu Alcir Philippsen, de Santo Cristo, está sendo pesquisado. Professor de história, Hüttner, acostumado a investigar e a identificar objetos antigos, conduz os trabalhos em Porto Alegre. O objetivo é identificar se a peça, que segue guardada em Santo Cristo, é nazista, serviu de algum modo aos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) ou se apenas pertencia a uma empresa argentina de combustíveis, que, antes de Adolf Hitler incorporar a suástica à ideologia nazista, reproduzia o símbolo em latões semelhantes.
A peça em latão de Santo Cristo possui 62 centímetros de altura e 32 centímetros de largura, lembrando um tambor de leite antigo. Trata-se da primeira a ser estudada no Brasil, até agora. O artefato fica escondido dos olhos do público e não está exposto no museu, em função da possibilidade de ter alguma relação com o nazismo, o que a pesquisa pretende confirmar ou descartar.
Uma hipótese levantada durante a pesquisa do professor em Porto Alegre é que esses tonéis tenham alguma ligação com o abastecimento de navios na Segunda Guerra Mundial, quando alguns tambores de lata parecidos foram encontrados boiando na costa argentina. Entretanto, a suástica nazista usada pelos alemães possuía uma pequena inclinação e o símbolo apontava para outras direções, o que não se percebe no desenho gravado nos objetos de Santo Cristo e de Maçambará.
Enquanto o resultado da pesquisa não sai, várias possibilidades para o uso do latão no passado são cogitadas. A mais curiosa delas é que o objeto possa ter servido para o abastecimento de embarcações alemãs durante o conflito mundial e ter participado até de episódios relevantes da história, como o que envolve o afundamento do navio alemão Almirante Graf Spee, fato ocorrido em 19 de dezembro de 1939, no porto de Montevidéu, no Uruguai. O resultado oficial da pesquisa será divulgado nos próximos dias.