No começo da Avenida Professor Oscar Pereira, a vizinhança é composta por gente que já partiu desta para uma melhor. Ali fica a maior concentração de cemitérios da Capital, com vista privilegiada da cidade.
O primeiro a se estabelecer no “alto da Azenha” foi o Cemitério da Santa Casa, em 1850. Com o esgotamento das covas onde hoje há a Cúria Metropolitana, no Centro Histórico, foi escolhido um terreno à época fora dos limites da cidade para os sepultamentos. O general Duque de Caxias foi quem ordenou a construção, e a tradicional instituição de saúde ficou responsável por sua administração.
A região da Azenha era rural, praticamente desabitada há 171 anos, lembra a historiadora do Centro Histórico Cultural da Santa Casa, Gabriela Portela Moreira. Naquela época, passou-se a acreditar que exalações produzidas por corpos de pessoas mortas poderiam ser vetores de doenças, por isso, escolhiam lugares distantes.
O Cemitério da Irmandade do Arcanjo São Miguel e Almas foi o primeiro a se desvincular da Santa Casa, em 1908, e é considerado um exemplo em galerias de grande escala. Pela proximidade a eles e pela questão geográfica, pela altura e afastamento, surgiriam outros ao lado, como o Cemitério União Israelita, o Crematório São José, o João XXIII e o arborizado Luterano.
Além de servir para o descanso eterno, os cemitérios acabam fazendo vezes de museu ao ar livre. Ali no da Santa Casa, entre as 34 mil unidades para sepultamento espalhadas por 10 hectares, ocorriam visitas guiadas, oficinas de fotografia e de desenho e caminhadas culturais antes da pandemia de covid-19.
O pórtico de entrada tem colunas de estilo romano e a inscrição “Revertere ad locum tuum”, do latim, “retorna ao teu lugar”. Em frente a ele, Gabriela destaca o espaço como detentor de um patrimônio único de arte funerária. Há esculturas em bronze, mármore e granito, demonstrando poder e riqueza.
Uma das sepulturas mais notáveis guarda o corpo do político Maurício Cardoso, que foi interventor federal no Rio Grande do Sul durante o Estado Novo e ministro da Justiça. De 1940, tem a estátua gigante de uma figura feminina representando a justiça virtuosa, com um livro na mão e cactos aos pés.
Enterrar as personalidades gaúchas com pompa era tão importante que se realizavam concursos públicos para a confecção dos monumentos funerários, e quem ganhou nesse caso foi um artista bem conhecido do porto-alegrense, conta Gabriela:
— Foi Antônio Caringi quem fez, o mesmo autor da Estátua do Laçador.
Também estão enterrados ali políticos como Júlio de Castilhos, Borges de Medeiros e artistas como Iberê Camargo. Mas provavelmente o túmulo mais visitado no Cemitério da Santa Casa é do cantor Teixeirinha, que morreu em 1985. Sobre ele, há uma estátua do ícone da música gaúcha segurando seu violão.