Depois de um começo de ano promissor, com vitórias em série na Câmara Municipal, o segundo semestre apresenta um cenário político turbulento para a gestão de Nelson Marchezan na prefeitura de Porto Alegre.
Marchezan perdeu a maioria no plenário após o rompimento com o PP, e duas decisões poderão retirar até R$ 105 milhões do orçamento livre em seu último ano de mandato. Desse valor, R$ 37 milhões já foram reservados a emendas dos parlamentares, e uma eventual reversão das mudanças no IPTU pode tirar R$ 68 milhões das receitas estimadas. Com isso, a Secretaria Municipal da Fazenda já estuda uma versão do plano de gastos para o ano que vem com cortes em investimentos.
— Temos até 20 de agosto para encaminhar a Lei de Diretrizes Orçamentárias. Nos próximos dias, vamos levar ao prefeito diferentes cenários e decidir o que terá de ser cortado caso se confirme a perda dos R$ 68 milhões do IPTU, além do valor já destinado ao orçamento impositivo — afirma o secretário municipal da Fazenda, Leonardo Busatto.
Em 2018, a prefeitura investiu R$ 46 milhões, mas, excluídos recursos provenientes da Câmara e do Dmae, aplicou apenas R$ 3 milhões próprios. Os R$ 105 milhões que podem ser retirados do caixa em 2020 representam ainda o dobro do que o Tesouro destinará à Saúde da Família neste ano.
No primeiro semestre, o Executivo aprovou projetos importantes como mudanças na carreira do funcionalismo, concessão de praças e parques à iniciativa privada e a atualização do IPTU. Os contratempos se intensificaram em 1º de julho, quando a Câmara aprovou em primeiro turno o orçamento impositivo. A medida, confirmada em segundo turno na semana passada, obriga a prefeitura a executar emendas dos vereadores ao orçamento anual até 0,65% da receita corrente líquida.
Além disso, uma das vitórias mais importantes de toda a gestão — a atualização dos valores do IPTU — ficou sob risco. A presidente da Câmara, Monica Leal (PP), ainda não decidiu sobre um requerimento do vereador Adeli Sell (PT), com base no regimento interno, de submeter o tema novamente à votação por não ter obtido diferença superior a três votos. Se a medida não for sancionada até 27 de setembro, as mudanças não entrarão em vigor em 2020.
— Esse recurso do IPTU seria destinado a investimentos e ampliação de serviços como vagas em creches, segurança, saúde da família. Vamos ver o que precisaria ser cortado — afirma Busatto, que também teme dificuldades para pagar salários em dia.
Os argumentos não convencem Adeli Sell, da oposição:
— Isso é jogar a população contra os vereadores, é uma canalhice. A culpa é do prefeito, que não soube dialogar.
A situação é mais delicada porque o governo, que chegou a ter na base aliada pelo menos 19 votos — o que garantia maioria —, perdeu de vez o apoio do PP nos últimos dias. O partido conta com quatro representantes, e sua retirada deixa o Executivo dependente do apoio de nomes independentes para aprovar medidas. O rompimento foi formalizado após Marchezan declarar, quinta-feira passada (8), que "o PP era oposição, se virar independente vai ser melhor".
O líder do governo na Câmara, Mauro Pinheiro (Rede), explica que o partido já não vinha seguindo orientações do Executivo.
— Raras vezes o PP nos deu quatro votos. No IPTU, foi apenas um — contemporiza Pinheiro.
MUDANÇA DE CENÁRIO
Primeiro semestre
- 26 de março - Após mais de 10 horas de discussão, o projeto que restringe gratificações e avanços recebidos pelo servidor público municipal é aprovado pela Câmara por 24 votos a favor e 12 contrários.
- 10 de abril - A Câmara aprova o projeto de concessão de parques e praças de Porto Alegre. A proposta do Executivo permite que a iniciativa privada assuma a gestão e conservação de uma área verde.
- 30 de abril - Vereadores aprovam, por 22 votos a 14, o projeto que atualiza a planta genérica de valores do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) na Capital. A medida reforçaria o Caixa do município em R$ 68 milhões em 2020.
Segundo semestre
- 1º de julho - A Câmara aprova em primeiro turno projeto que obriga a prefeitura de Porto Alegre a executar emendas dos parlamentares ao orçamento anual do município até o limite de 0,65% da receita corrente líquida — reduzindo a margem de decisão do Executivo sobre o orçamento. A votação é confirmada dia 5 de agosto.
- 8 de agosto - Líder do governo, Mauro Pinheiro (Rede) bate boca com a presidente da Casa, Mônica Leal (PP), pela demora em decidir sobre requerimento que pode levar projeto do IPTU a nova votação. Demora pode impedir que regras entrem em vigor em 2020.
- 8 de agosto - A cúpula do PP, que soma quatro votos na Câmara, confirma que o partido rompeu com o prefeito Nelson Marchezan e passa a se considerar independente em relação às propostas do Executivo.